“Moçambique é muito vulnerável às alterações climáticas”

“Moçambique é muito vulnerável às alterações climáticas”


O número de ciclones muito intensos na força dos ventos e precipitação está a aumentar. Topografia de Moçambique é desfavorável.


A população da Beira, a segunda maior cidade moçambicana, foi a mais recente vítima de um fenómeno climático que os cientistas têm registado nos últimos anos: a cada vez maior intensidade dos ciclones, destruindo tudo por onde passam. O ciclone Idai foi o mais intenso da última década e as Nações Unidas já classificaram o rasto de destruição em Moçambique, Malawi e Zimbabué como o pior desastre natural de sempre a atingir o hemisfério sul.

“Está-se a observar uma maior percentagem de ciclones tropicais muito intensos em termos de velocidade do vento e da quantidade de precipitação, os ciclones de categoria cinco [o nível mais elevado]”, explica ao i Filipe Duarte Santos, presidente do Conselho do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável e professor na Universidade de Lisboa.

Ainda que seja difícil atribuir um fenómeno específico às alterações climáticas, a verdade é que tudo indica para que assim seja, pois à medida que as temperaturas do oceano aumentam, também aumenta a intensidade das tempestades tropicais. “É um fenómeno global e tem a ver essencialmente com a temperatura média do oceano à superfície ter aumentado”, continua o especialista, referindo que os “ciclones obtêm a sua energia através da temperatura do oceano”. Os Estados Unidos, ainda que bem melhor preparados em termos de recursos e capacidade de adaptação, e as Filipinas são outros dois Estados que têm sofrido com estas tempestades.

“A situação de um país desenvolvido, como é o caso dos EUA, e a de um menos desenvolvido, como Moçambique, é bem diferente”, afirma Duarte Santos, pois um tem capacidade financeira e estruturas capazes de adaptarem as suas linhas costeiras e infraestruturas e o outro nem tanto assim. Além disso, a topografia também não ajuda no caso de Moçambique. “Moçambique é um país muito vulnerável às alterações climáticas por ter uma costa baixa e, portanto, facilmente inundável”, explica o professor universitário, referindo que “a zona do Zambeze e Limpolpo são facilmente inundáveis”. Além disso, continua, “os eventos de precipitação muito intensa em intervalos de tempo curtos também se estão a tornar mais prováveis”. 

Em 2015, as regiões centro e norte de Moçambique foram flageladas por cheias que causaram mais de 150 mortos, com pelo menos 150 mil pessoas a serem afetadas. Cortes de eletricidade, mais de oito mil casas destruídas e outras 11 mil parcialmente destruídas foi o balanço de um fenómeno climático que apanhou tudo e todos de surpresa. Hospitais, escolas, estradas e pontes também ficaram danificados, dificultando a resposta dos serviços de emergência e a comunicação no país. 

“As chuvas torrenciais devastaram tudo o que havia nos campos agrícolas das populações em Mocuba. Muitas culturas que estavam em fase de plantação ficaram totalmente destruídas por causa das cheias”, disse na altura uma fonte dos serviços de agricultura moçambicanos ao site alemão Deutsche Welle. Em consequência, a lei da oferta e da procura entrou em força na vida dos moçambicanos: os preços dos bens básicos subiram significativamente. Por exemplo, um quilo que feijão manteiga subiu dos 30 meticais (77 cêntimos) para os 48 meticais (1,24 euros).

Moçambique não é só vítima de cheias. “Também temos problemas como a seca na parte sul do país”, referiu Duarte Santos. Um fenómeno que agrava ainda mais o risco de insegurança alimentar no país.