Quando há oito anos o país parou com milhares nas ruas a gritar por mais e melhores oportunidades a esperança era a de que tudo mudasse. Para melhor. A Geração à Rasca pedia emprego estável, melhores salários e mais educação. Nem tudo foi conseguido e nem as alterações legislativas acabaram com o problema, mas há indicadores que mostram que hoje as coisas estão melhores.
O desemprego entre os jovens que naquele ano afetava um em cada três – e dois anos depois estava ainda pior, com uma taxa de 38,1% – fixou-se em dos 20,3% no ano passado. E mesmo a taxa dos que entre os 15 e os 35 anos não trabalham nem estudam atingiu em 2018 o patamar mínimo desde 1998 – 9,9%. No ano em que centenas de milhares de pessoas encheram as ruas de norte a sul dando um significado à expressão Geração à Rasca a taxa era superior a 14%, tendo mais tarde vindo a subir: 17,1% em 2013.
O movimento que se organizou nas redes sociais e veio em força para as ruas da capital, da invicta e de muitas outras cidades a 12 de março de 2011. Considerada a maior manifestação apartidária desde o 25 de Abril – ainda que os número não tenham sido confirmados oficialmente, há quem fale em mais de 300 mil pessoas –, a verdade é que aos protestos se juntaram diversos políticos de esquerda e da extrema direita.
Em Lisboa os protestos que acalmaram só perto das 18h contaram com a participação dos Homens da Luta, sendo que a voz de Ana Bacalhau também se tornou um símbolo destas ações: Braga, Funchal, Coimbra, Ponta Delgada, Castelo Branco, Viseu e até Barcelona viram os jovens portugueses dar um grito de revolta. A revolta por serem quinhentoseuristas – naquele ano o salário mínimo era de 485 euros, menos 115 do que atualmente.
A grande qualificação e a não correspondência com as condições de trabalho foram o mote, num país que na altura tinha 13,2% de pessoas com ensino superior, população que em 2017 já tinha subido para 18,1%.
Os problemas dos jovens acompanhavam o de um país que tinha uma taxa de desemprego de 12,7% – quase o dobro dos 6,7% registados no primeiro mês deste ano.
Olhar os dados isoladamente pode dar até a sensação de que o Portugal de hoje já é para os jovens. Mas não é isso que acontece, segundo o estudo “Juventude(s): Do Local ao Nacional. Que intervenção?”, do Observatório Permanente da Juventude – Instituto de Ciências Sociais e Humanas.
O inquérito foi feito aos municípios entre o fim de 2017 e o início de 2018 e mostra que três quartos dos municípios que responderam (251) elencaram o desemprego como o principal problema. De seguida surgem problemas com o emprego precário e com o acesso à habitação.
No que toca à habitação, o problema não é exclusivo do interior, bem pelo contrário, com a especulação imobiliária que Lisboa e Porto enfrentam são cada vez mais os jovens que não conseguem tornar-se independentes dos pais nestes grandes centros urbanos.
E mais do que as dificuldades no acesso à habitação ou ao mercado de trabalho, salienta-se no mesmo estudo a ausência de planos municipais de juventude – 90% das câmaras não tem qualquer plano.
Mas então como defende hoje a lei estes jovens da precariedade? Mais do que em 2011? “Aos jovens, que têm associado a si uma precariedade ou vínculos mais instáveis, acho que defende mais, julgo que foram dados passos na tentativa de reconhecimento de que quando há um contrato de trabalho ele tem de ser assegurado”, explica ao i Luís Gonçalves da Silva, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
Segundo o docente, “a geração à rasca vai continuar aflita enquanto não for feita uma aposta na qualificação, ou seja, não existir um projeto nacional e duradouro, de várias gerações”: “Este é um problema transversal mas que se manifesta muito nos jovens. Diz-se que esta é a geração mais qualificada, mas isso não significa que seja a mais preparada. Precisamos de uma qualificação que os prepare para o mundo real, não mantendo a ideia de que a licenciatura é a abertura de uma porta com futuro”.
Sem tal projeto “continuaremos com paliativos”, adianta.
E se por um lado, Luís Gonçalves da Silva acredita que “é possível sempre melhorar a legislação”, por outro afirma que “antes deveria fazer-se um estudo sobre quais os entraves dos jovens no acesso ao mercado de trabalho e à manutenção nesse mercado. Um estudo transversal a todo o país”.
O professor de direito acredita que o 12 de março de 2011 “foi um grito de alerta importante”, mas que “acabou por ser um epifenómeno porque não teve continuidade nem estabilidade”: “Estamos a falar de problemas estruturais da nossa sociedade e precisamos de mais gritos de alerta dos nossos jovens, muitos têm vontade e não têm oportunidade,”.
A concluir lembra ainda que essa falta de oportunidade tem uma perversidade pouco debatida: “São milhões do erário público que são deitados fora quando não aproveitamos o investimento no conhecimento humano. Essa é, por exemplo, uma conta que está por fazer”.