Comissão de Direitos Humanos fala em cenário de guerra no Norte de Moçambique

Comissão de Direitos Humanos fala em cenário de guerra no Norte de Moçambique


Pelo menos 150 pessoas foram mortas e milhares deslocadas desde 2017, devido a ataques de milícias locais. O presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos de Moçambique pede que seja decretado estado de emergência


O presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos de Moçambique (CNDH), Luís Bitone, pediu hoje a declaração do estado de emergência em Cabo Delgado, no norte de Moçambique. “Dada a gravidade da situação”, Bitone considera que isso tornaria mais fácil “alocar mais recursos humanos e financeiros” para a região, onde ataques de milícias locais terão já matado pelo menos 150 pessoas e forçado à deslocação de milhares desde 2017. O presidente da CNDH acrescentou, em entrevista à Lusa, que “os acontecimentos no terreno sugerem números acima dos que nos são apresentados”. 

Além da preocupação com os ataques, Bitone alertou também para a “situação precária” dos deslocados e dos prisioneiros, entre os quais estão mulheres e crianças. Só em Pemba, capital da província de Cabo Delgado, haverá cerca de 200 pessoas detidas sob acusação de pertencerem a grupos armados. O presidente da CNDH diz que os campos, para “além de estarem cheios, há fome”, e revela: “Temos relatos que dão conta de que algumas pessoas morreram, não pelo fogo do inimigo, mas pelo fogo das próprias forças moçambicanas. É um contexto de guerra”. Bitone sugere a declaração do estado de emergência porque sem este “qualquer limitação de direitos vai ser sempre condenada”.

O ministro da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos de Moçambique, António Juliasse, negou este domingo que as Forças de Defesa e Segurança de Moçambique estejam a cometer abusos dos direitos humanos, declarando à Lusa: “Respeitamos quem assim o afirma [que ocorrem abusos], mas nunca chegámos a ter provas em relação a essas acusações”. Juliasse afirma que “se existir um caso concreto, será cuidado em fórum próprio e em tempo oportuno”. 

Recorde-se que os ataques em questão são atribuídos à organização Ahlu Sunnah Wa-Jammá (adeptos da tradição profética e da congregação). Este grupo nasceu como uma organização religiosa – num país onde cerca de 20% da população é muçulmana – na isolada região rural do Norte de Moçambique. A partir do final de 2015, o grupo começou a incorporar células militares e a preparar-se para a luta armada. São apelidados de Al-Shabab (“a juventude”) pelos habitantes locais – tal como o movimento extremista da Somália, mas aparentemente sem qualquer ligação entre eles.