Vinte e seis de maio, data das eleições dos representantes portugueses para o Parlamento Europeu e fim de corso de um extenso carnaval eleitoral. A efervescência eleitoral está aí, nas suas diversas nuances e máscaras. O quadro é relativamente simples e reconduz-se ao copo meio cheio ou meio vazio – em todo o caso, em resultado das opções políticas de quem sustenta a solução governativa.
As eleições são europeias, mas o PS resolveu nacionalizá-las ao escolher dois ex- -membros do governo que saíram diretamente do executivo para a candidatura. A opção, que implicará leituras dos resultados na avaliação do governo, colocou os resultados da governação no centro da campanha eleitoral. Conseguiu-se o que se conseguiu porque se observaram os compromissos internacionais e com a União Europeia, como defende o PS, ou conseguiram-se resultados apesar da Europa, como exalam os partidos que compõem o arco da sustentação (BE, PCP e PEV). O problema deste maniqueísmo é que havia margem de manobra, margem de escolha, e todos foram parte das opções concretizadas, das ações e das omissões. Bem podem o PCP ou o BE bradar aos céus e à terra que podíamos ir mais longe quando não há nenhum Estado-membro de dimensão e relevância semelhante à nossa que tenha seguido esse caminho de afrontamento, de rutura ou de diversão com coisas sérias. É como boa parte das opções políticas que enunciam, que defendem e que pretendem concretizar. Quando integradas, não encontram paralelo em nenhuma latitude ou longitude do nosso mundo. Podem existir no plano da utopia ou no plano virtual, mas a realidade, da desfaçatez com que procuram negar evidências da Coreia do Norte à Venezuela, transforma-os em cavaleiros políticos de uma teoria insustentável, sem nexo com nenhuma realidade sustentada.
Será por isso delicioso assistir a um desfile de proclamações nacionais sobre realidades mais ou menos virtuais, nuns casos por quem, estando a favor da construção europeia, não impulsiona uma concretização mais próxima das necessidades dos povos, das dinâmicas intracomunitárias e envolventes e da necessidade de este bloco se afirmar com maior coesão perante outros para sobreviver; noutros casos por quem, estando nas instituições europeias, persista em estar com um pé dentro e outro fora. Pode dizer-se que esta atitude está em linha com o comportamento político nacional: sustentam o governo, mas não são responsáveis pelas opções e pela totalidade dos resultados obtidos pelo governo que apoiam.
O estado da arte é, aliás, simétrico: à direita defendem o contrário do que defenderam ou fizeram no passado; à esquerda defendem coisas que podiam ter concretizado nos últimos anos, bastava terem tido outras opções político- -partidárias no momento maior da negociação do Orçamento do Estado.
O curioso é que por responsabilidades próprias, de ação e de omissão, os quadros de referência nacionais e europeus podem ser ainda mais difusos após as eleições europeias e legislativas deste ano.
As eleições para o Parlamento Europeu são tradicionalmente um ato eleitoral pouco participado, com um voto relaxado por parte dos cidadãos, que aproveitam a oportunidade para dar expressão a outras soluções de voto ou para avaliar a governação em causa, sem pensar muito nas consequências.
As eleições para o Parlamento Europeu são, desde o último ato eleitoral, um momento com extrapolações políticas nacionais sobre as amplitudes reais e as expetativas futuras. Algo que é reforçado com a presença de ex-membros do governo, com as descontinuações engendradas nas listas de candidatos e com o enfoque colocado no aproveitamento dos fundos comunitários.
Não é expetável que os carros alegóricos dos partidos sejam rigorosos sobre a importância da União Europeia para o salto de desenvolvimento que conseguimos ao longo da nossa participação no projeto europeu, que sejam verdadeiros no enunciado de resultados e de omissões ocorridos desde 2015 por via das opções políticas concretizadas, no quadro da Europa e apesar da Europa, ou que enunciem que caminhos reais se propõem percorrer para inverter o contexto europeu, instabilizado pelo Brexit, fustigado por novas dinâmicas globais, vergastado por populismo, nacionalismos e tantos outros “ismos” contrários ao acervo de valores dos fundadores do projeto europeu.
Com o ambiente nacional e internacional a degradar-se, a economia a abrandar e a atualidade a ser tomada por expressões sem coerência, sem sustentabilidade e sem sentido de futuro, as europeias serão um momento para avaliar o nível de vivência e mobilização dos partidos e dos movimentos envolvidos; convocar os cidadãos para a participação numas eleições que importam para o seu quotidiano; e sublinhar a importância da participação num projeto comum em que se ganha muito mais estando dentro do que estando fora.
Uma vez mais, estaremos entre as realidades, as que temos de confirmar além da indução da comunicação política e dos protagonistas, e as propostas virtuais sem pingo de nexo com alguma realidade provada ou comprovada. Será o confronto entre a vontade de transformar com os pés no chão e a insistente proclamação de ideias contrariadas pela ação dos próprios, como o comprovaram os impulsos imobiliários de protagonistas do Bloco de Esquerda e do PCP.
Será mais um momento de verdade. E já não será “poucochinho”.
NOTAS FINAIS
CONFETTI As greves, que são um direito constitucional, apresentam uma dimensão agridoce – porque implicam poupanças nos recursos financeiros ao dispor dos gestores dos serviços, mas acarretam consequências para as respostas e para os cidadãos. A proliferação de greves no início do ano acaba por ser uma outra expressão da vertigem de cativações do ministro das Finanças. Os grevistas perdem o salário, os gestores ficam com mais recursos.
MATRAFONAS As cativações, na sua dimensão e expressão pungente no funcionamento dos serviços públicos, não são sustentáveis nem são solução de futuro. São o contrário da proclamada viragem da página da austeridade e da aposta no SNS e na escola pública.
Escreve à quinta-feira