Os sete deputados que integram o grupo de trabalho que vai rever as regras para a atribuição das ajudas de custo aos parlamentares têm dois meses para entregar ao presidente da Assembleia da República as propostas de alteração.
Ontem, durante a reunião da conferência de líderes parlamentares, o presidente da Assembleia da República voltou a avisar que até ao 25 de Abril quer ter na mão as propostas para as novas regras. O objetivo é que entrem em vigor ainda nesta legislatura.
Desta forma, Ferro Rodrigues tem o assunto encerrado antes da campanha eleitoral para as europeias, marcadas para 26 de maio. Além disso, o presidente do parlamento quer evitar que durante as comemorações do 25 de Abril se fale “da Assembleia da República por motivos negativos”. A confissão foi feita na semana passada, durante uma entrevista à RTP3.
O apelo, em jeito de pressão, de Ferro Rodrigues foi dirigido aos líderes das bancadas parlamentares, depois de Jorge Lacão, coordenador do grupo de trabalho que vai rever as regras, ter feito um ponto de situação dos trabalhos. Lacão, que também é vice-presidente do parlamento, foi genérico nas explicações, assegurando apenas que as medidas a aplicar serão sempre mais simplificadas e, tendo em conta as recomendações do Tribunal de Contas.
A proposta apresentada por Lacão no início de janeiro passava por fundir em apenas um subsídio os três que atualmente são pagos aos deputados para deslocações à sua residência ou em trabalho político. O vice-presidente do parlamento tinha aberto ainda a porta a que o subsídio passasse a ser pago como despesa de representação, o que é fiscalmente considerado como complemento remuneratório, sendo sujeito a tributação em sede de IRS.
A não tributação das ajudas de custo atualmente pagas aos deputados, que em alguns casos duplicam o seu salário com este subsídio, foi uma das principais criticas do Tribunal de Contas, que, através do relatório de auditoria às contas da AR de 2017, apontou várias irregularidades sobre este assunto.
De acordo com informações recolhidas pelo i, o vice-presidente da Assembleia da República sublinhou ainda que as propostas que estão em análise não terão impacto orçamental. Ou seja, não aumentarão a despesa anual do parlamento.
Exemplos estrangeiros Foi na sequência da auditoria, noticiada pelo i, que Ferro Rodrigues criou em dezembro um grupo de trabalho para avaliar e encontrar soluções para corrigir as irregularidades detetadas nos pagamentos das ajudas de custo para as viagens dos deputados.
Seis dias depois da decisão os sete deputados reuniram e pediram aos serviços legislação para analisarem o funcionamento de parlamentos de outros países, designadamente do caso inglês, francês, espanhol e até mesmo do Parlamento Europeu. O objetivo é fazer a uma avaliação comparada entre as regras aplicadas nos diferentes parlamentos para que se chegue a uma solução para as regras que serão aplicadas na Assembleia da República. O caso inglês, por exemplo, prevê o pagamento de verbas aos deputados mas exige a apresentação de faturas.
Alguns deputados chegaram a confidenciar ao i que era necessário fazer-se uma simplificação dos pagamentos a que têm direito, sobretudo porque os próprios nem sabem explicar algumas componentes da folha salarial que recebem. “É uma manta de siglas”, chegou a admitir ao i um deputado.
Regras em vigor As regras em vigor desde 2004 preveem o pagamento semanal de ajudas de custo, acrescidas ao salário, para as deslocações dos deputados, sem que lhes seja exigido um comprovativo da viagem. O valor das ajudas de custo flutua de acordo com a distância da morada de residência, indicada pelo deputado ao parlamento.
Por cada quilómetro de distância de Lisboa é pago aos deputados 0,36 cêntimos. Os deputados dos Açores e da Madeira recebem um valor fixo de 500 euros semanais para adquirirem bilhetes de avião. Mas os deputados das ilhas podem ainda deslocar-se aos CTT para reclamar a devolução de parte do valor das alegadas viagens, através do subsídio social de mobilidade.
Os parlamentares madeirenses pagam apenas 86 euros pela viagem de avião, caso o valor do bilhete fique abaixo dos 400 euros. Dentro deste plafond, todo o valor pago acima dos 86 euros é devolvido ao deputado. E o mesmo acontece com os deputados açorianos, com o Estado a reembolsar as despesas acima dos 134 euros, sem qualquer teto. Desta forma, pela mesma viagem, os deputados recebem dois subsídios.