Cada vez vejo menos televisão. Não por falta de tempo, mas por falta de pachorra para os conteúdos diários.
Tirando a RTP2 que, embora envolta em demasiado esoterismo para o meu gosto, mantém a sua personalidade de canal alternativo, os restantes canais nacionais oscilam, de forma frenética e esquizofrénica, entre quererem ser uma espécie de BBC e o canal Record.
Aos poucos, os jornais nacionais tornaram-se uma espécie de corrida mais louca do mundo, quase sem jornalismo de investigação, compensando com um rol de notícias sensacionalistas de faca e alguidar.
Na passada terça-feira rodava entre a RTP1, a SIC e a TVI e o tédio era total. Entre o inqualificável estilo de José Rodrigo dos Santos (curiosamente, o pivô preferido dos portugueses…) e os comentadores contratados da SIC e TVI, tudo espremido, o que retive foi a brilhante reportagem do cabrito Marcelo e a versão “agora não posso que tenho o bacalhau no forno” da líder do CDS.
No país europeu com mais greves por mês e mais esquemas na banca, a TVI dedica uma boa parte do seu noticiário à história de Marcelo, o novo cabrito do rebanho de António Rodrigues, um pacato agricultor de Oliveira do Hospital que teve o seu momento de fama (e amplo destaque, naturalmente, no “Correio da Manhã”) por ter batizado o cabrito filho de Vitória (cabra oferecida pelo Presidente Marcelo) com o nome do Presidente da República.
Quando pensava que não poderia piorar, lá vem a notícia bombástica da moção de censura do CDS ao governo. Da mesma e das justificações para a sua apresentação, pouco ou nada se percebeu. A líder do partido, apressadamente, despachou o assunto como quem tem de ir a correr para tirar o bacalhau do forno. Apenas ficámos a saber que o CDS, numa espécie de corrida para o Guinness Book, se tornou o partido da nossa democracia que mais moções de censura apresentou desde o 25 de Abril.
É no mínimo deprimente. Mas à falta de notícias sérias, se é para entreter, metam lá os Gato Fedorento ou contratem um humorista decente que nos faça passar o tempo.
A história de António Rodrigues (o padrinho de Marcelo o cabrito) é, por si só, pobre; agora, o folclore do CDS e o seu recorde de partido mais censurador da democracia portuguesa é preocupante. E é preocupante porque é também por isto que vemos aparecer movimentos populistas e extremistas.
Embora me situe muito à sua esquerda, sempre respeitei o CDS. Conheço muitos dos seus militantes e já tive oportunidade de trabalhar com alguns. Reconheço-lhes, ideologias à parte, rigor, seriedade e boa preparação técnica.
Acresce que cumpria uma função importante na democracia portuguesa mas, desde que Cristas assumiu as rédeas do partido, o CDS parece esfumar-se em faits divers que não acrescentam nada à vida política nacional.
Bons quadros como Filipe Lobo d’Ávila ou João Rebelo parecem eclipsados ou perdidos numa nuvem de fumo. Às tantas o bacalhau que está no forno queimou-se…