Um relatório da comissão de inquérito do Senado francês concluiu que o Palácio do Eliseu reteve informação sobre o caso Benalla, acusando a presidência ainda de passar informações falsas aos senadores. Para os senadores, Alexandre Benalla, o antigo guarda-costas do presidente francês, Emmanuel Macron, poderá ter colocado em causa a segurança do chefe de Estado e os interesses nacionais franceses.
Benalla foi demitido depois de ser filmado a agredir um manifestante e descobriu-se, posteriormente, que tinha ligações ao oligarca russo Iskander Makhmudov e a uma empresa de segurança privada francesa, usando o passaporte diplomático para as suas viagens de conselheiro privado de segurança.
“Não há qualquer dúvida de que uma relação indireta entre um oligarca russo e um conselheiro próximo do presidente, que está diretamente envolvido na segurança presidencial, iria comprometer a segurança do chefe de Estado e, além disso, os interesses da nação”, lê-se no relatório de 120 páginas que sumariza uma investigação de sete meses. “Estas relações de negócio poderiam ter feito dos senhores Benalla e Crase [funcionário do partido República em Marcha de Macron, próximo do antigo guarda-costas] os elos mais fracos na segurança do chefe de Estado, colocando-o sob o controlo de interesses estrangeiros”, continuou.
A comissão de inquérito recomenda que Benalla seja acusado de ter cometido perjúrio durante a investigação. O antigo guarda-costas terá mentido aos senadores na audiência da comissão de inquérito, nomeadamente sobre as suas ligações ao oligarca Iskander Makhmudov e uma empresa de segurança privada francesa, revelada pelo site Mediapart.
Caso Benalla vá a julgamento, pode enfrentar uma pena de prisão até cinco anos e uma multa de até 75 mil euros.
O antigo guarda-costas não é o único a estar sob a mira dos senadores. O mesmo relatório recomenda ao senado que notifique o Ministério Público sobre as respostas evasivas de homens próximos de Macron: o chefe de gabinete, Patrick Strzoda, e o principal conselheiro, Alexis Kohler.
“Os esforços de elementos de topo da Presidência da República para apresentar as suas [de Benalla] missões como limitadas a tarefas organizativas permanecem, no entanto, pouco credíveis”, afirma o documento, revelando que os próximos de Macron foram “contraditados por elementos factuais recolhidos durante o trabalho da comissão”.
A presidência recusou-se a comentar o relatório, garantindo, no entanto, que irá contrapor “vários elementos falsos” presentes no documento. Mais tarde, uma fonte do Eliseu garantiu que a resposta não foi dada de imediato por “respeito à separação de poderes”.
Benallagate
Tudo começou quando Benalla foi filmado, o ano passado, a agredir manifestantes no 1.º de Maio, em Paris, e, desde aí, o caso não tem parado de ganhar cada vez maiores contornos políticos, fragilizando a presidência de Macron. O Palácio do Eliseu tomou conhecimento das agressões no dia seguinte a terem acontecido, tendo suspendido Benalla por 15 dias – na verdade, destacando-o para trabalho de secretária – e, mais tarde, chegou, inclusive, a receber um apartamento num edifício próximo do Eliseu. Sabendo que tinha sido filmado, Benalla ter-se-á concertado com altos mandos da polícia para impedir que o vídeo viesse a público.
Benalla não era um segurança qualquer, beneficiando das grandes regalias dadas aos mais próximos do chefe de Estado: casa, salário de dez mil euros, carro oficial e autorização para entrar no hemiciclo. Também andava armado quando acompanhava Macron, ainda que não tivesse autorização para tal.
O Eliseu foi acusado de encobrir as agressões de Benalla e, pelo meio, o então ministro do Interior, Gérard Collomb, apresentou a demissão e três altas figuras da polícia francesa foram demitidas e presentes a um juiz pelo encobrimento.
Surgiu ainda a hipótese de Macron ter violado a lei ao não denunciar as agressões de Benalla à polícia, algo que poderia levar ao seu afastamento do cargo – daí o nome Benallagate, em referência ao Watergate. Foi neste contexto que a comissão de inquérito do Senado foi criada, num choque entre os poderes executivo e legislativo.
O Eliseu pressionou afirmando que os senadores corriam o risco de colocar a presidência em causa e os senadores. “Se o executivo pudesse deixar o parlamento, neste caso o Senado, fazer o seu trabalho, tudo estaria bem na República”, disse na altura o senador socialista Jean-Pierre Sueur.