Apesar de a greve cirúrgica ter começado no passado dia 31 de janeiro na maioria dos centros hospitalares, a paralisação no Centro Hospitalar da Universidade de Coimbra (CHUC) só teve início no dia 8 de fevereiro. E, ontem, o Sindicato Democrático dos Enfermeiros (Sindepor) denunciou a tentativa do CHUC identificar os enfermeiros que pretendem aderir à greve no dia de hoje. Por e-mail, todos os enfermeiros foram notificados para informarem se pretendem ou não fazer greve – com um prazo de 24 horas. O Sindepor já reagiu e garante que, da sua parte, vai agir “em termos jurídicos”, perante o que consideram ser uma situação inadmissível.
Ao i, Jorge Correia, da direção do Sindepor, explicou que a requisição civil decretada pelo governo apenas afeta quatro centros hospitalares – Centro Hospitalar e Universitário de S. João, Centro Hospitalar e Universitário do Porto, Centro Hospitalar de Entre o Douro e Vouga e Centro Hospitalar de Tondela-Viseu. “Há outros três hospitais que é o de Coimbra, Setúbal e Lisboa, em que isso não ocorre e nós não achamos que a requisição civil seja fundamentada, além de que os serviços mínimos estão a ser cumpridos em todo o lado”, diz Jorge Correia. A monitorização dos enfermeiros que pretendem fazer greve, por parte da direção do Centro Hospitalar da Universidade de Coimbra, é, para o sindicato, uma forma de “anular e boicotar o direito à greve”.
O que acontece no CHUC é o seguinte: “Os enfermeiros em greve, no dia, comparecem ao serviço e depois decide-se os que estão em greve e não greve e o que deriva da lei é que os não grevistas asseguram os serviços mínimos e quando estes não assegurarem estarão os grevistas”, esclarece Jorge Correia. Ou seja, neste caso, como não existe uma requisição civil – caso em que compete ao conselho de administração do hospital indicar os serviços mínimos e o número de elementos necessários – , o Sindepor apenas avisa o hospital do número de enfermeiros que vão fazer greve, garantindo, porém, o cumprimento dos serviços mínimos.
O CHUC faz uma leitura diferente em matéria de greve e todos os dias envia um e-mail com a descrição dos serviços que são necessários e quantos elementos de recursos humanos acham que são necessários para garantir os serviços mínimos. Segundo o membro da direção do Sindepor, os e-mails vão mais longe e indicam ainda que “no limite, podem ser escalados 100% dos enfermeiros”. “Se num dia normal não o são, como é que em tempo de greve há mais recursos humanos disponíveis do que em dias normais?”, questiona Jorge Correia.
Mas se, como dizem os sindicatos, os serviços mínimos estão a ser cumpridos, qual é então a razão para as sucessivas insistências da administração do CHUC? Para o Sindepor a resposta é simples: “Há a intenção de forçar a requisição civil [nos casos em que esta não foi acionada] alegando incumprimento de serviços mínimos”.
Em Coimbra, da primeira greve cirúrgica para a segunda – que decorre até dia 28 de fevereiro – “a diferença está no comportamento do Conselho de Administração”, refere Jorge Correia, que sublinha o facto de o trabalhador ser “soberano para decidir se mantém ou não a greve”. Nos dez centros hospitalares onde decorre a greve cirúrgica, o ministério indicou, no final da semana passada, que em nove dias foram canceladas 2657 cirurgias. Entre 31 de janeiro e 8 de fevereiro, 56% das cirurgias previstas ficaram por realizar.
Decisão do Tribunal em aberto A ação dos enfermeiros contra a requisição civil decretada pelo governo já foi entregue na passada segunda-feira no Supremo Tribunal Administrativo, mas tudo continua em aberto. O Sindepor pediu, com caráter urgente, a nulidade da requisição civil que decorre nos quatro centros hospitalares, defendendo ainda o pagamento de dez mil euros diários, caso o executivo mantenha a decisão.
António Garcia Pereira, advogado que representa os enfermeiros, explicou ao i que o documento entrou na segunda-feira “mesmo em cima das quatro horas da tarde” e, posteriormente, “houve um despacho para correção formal no texto”. A correção foi feita e o documento foi novamente submetido na terça-feira. “Provavelmente, o processo só foi concluído [ontem]”, disse o advogado especialista em direito do trabalho, que explicou ainda que existem várias hipóteses e todas teoricamente possíveis. A juíza relatora pode decidir pela suspensão imediata da requisição civil, ou transformar a intimação numa providência cautelar.
Para os enfermeiros, a hipótese da intimação é muito mais vantajosa do que a providência cautelar, já que esta última “é muito mais alongada no tempo do que a intimação para a proteção dos direitos” dos enfermeiros em greve, refere o advogado. Caso a juíza opte pela intimação, tem ainda três hipóteses: “Ou manda aplicar o prazo geral dos sete dias, ou considera que deve reduzir o prazo, ou opta pela marcação de uma audiência oral”. Esta última hipótese – de audiência oral – levaria a uma reunião com o Conselho de Ministros e a Ministra da Saúde, Marta Temido.