Espanha. Sánchez ameaça catalães com eleições

Espanha. Sánchez ameaça catalães com eleições


O primeiro-ministro espanhol pondera convocar eleições antecipadas para 14 de abril, segundo a agência espanhola Efe


Espanha poderá vir a ter eleições legislativas antecipadas a 14 de abril, num momento em que a direita surge com a maioria absoluta nas sondagens, avançou a agência espanhola Efe. Confrontado com a possível retirada do apoio parlamentar dos independentistas catalães – ERC e PDeCat – ao seu governo minoritário, o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, está a ponderar dissolver o congresso e convocar eleições antecipadas. Se decidir avançar para essa data – simbólica por ser o dia em que a segunda República foi proclamada em 1931 –, o líder espanhol terá de avançar com a dissolução do órgão legislativo já na próxima semana, a 19 de fevereiro. A Constituição espanhola prevê um interregno de 54 dias entre a dissolução do parlamento e a realização do ato eleitoral.

O Palácio de Moncloa, sede do governo, já reagiu oficialmente dizendo que a notícia é “precipitada” e que o primeiro-ministro só tomará uma decisão depois de o Orçamento do Estado ser votado na generalidade pelo parlamento espanhol, esta quarta-feira. “Nenhum membro da direção do PSOE está a falar de 14 de abril para eleições gerais”, garantiu Adriana Lastra, porta-voz dos socialistas no parlamento, ao “El País”.

A revelação não oficial, explica o o jornal, pode ser uma tática para pressionar os independentistas a recuar e a apoiarem o orçamento. Pelo menos é essa a narrativa do Partido Popular, que, em comunicado, garantiu: “Não é uma mensagem para nós ou para o Ciudadanos, é uma mensagem para os independentistas”. Por agora, os populares não vão optar para começar os preparativos da campanha eleitoral antecipada, preferindo concentrar o seu discurso político “no sucesso retumbante” da manifestação de domingo na praça Colón. No entanto, os dirigentes do PP garantem que ficariam contentes se as eleições acontecessem “o mais rapidamente possível” e estão preparados para as disputar.

Recorde-se que as sondagens dão, na sua generalidade, a vitória com maioria absoluta à direita, juntando os votos do PP, Ciudadanos e Vox, que têm apontado baterias às pretensas concessões do governo socialista aos independentistas e que consideram uma “traição” aos ideais espanhóis. A luta contra o independentismo é uma das colas que une os três partidos de direita.

O governo socialista de Sánchez tem sido pressionado, tanto pela direita como pelos independentistas catalães, para encontrar uma solução para a crise política na Catalunha. A direita recusa liminarmente negociar com os independentistas. os segundos exigem um referendo de autodeterminação e Sánchez está isolado num meio termo: quer negociar mais transferência de competências, sem qualquer referendo.

A direita (Partido Popular e o Ciudadanos) e a extrema-direita (Vox) juntaram 45 mil pessoas no domingo, segundo os números oficiais, na Praça Colón, em Madrid, para exigirem a demissão de Sánchez, acusando-o de estar refém dos catalães e de trair Espanha ao aceitar a nomeação de um “relator” para as negociações com o governo catalão.

Ontem, e em reação à notícia da Efe, o líder do Ciudadanos, Albert Rivera, ameaçou Sánchez com uma manifestação em defesa da Constituição em Barcelona, capital da Catalunha, e garantiu que o líder socialista não tem outra escolha a “não ser convocar eleições”. “Ele já enganou todos os espanhóis após a moção de censura [ao governo de Rajoy], quando disse que iria convocar eleições rapidamente”, afirmou Rivera.

Os independentistas catalães rejeitaram a proposta do executivo espanhol sobre o processo – querem um “mediador” e não um “relator” – e ameaçaram retirar-lhe o apoio parlamentar, apresentando em alternativa emendas ao orçamento que o PSOE não está disposto a aceitar. Exigem uma consulta popular à independência da Catalunha, a célebre proposta de referendo vinculativo acordado com o governo espanhol e vinculativo com o governo – posição sempre recusada por Madrid.

Com palavras de desafio, o presidente da Generalitat, Quim Torra, garantiu que na sua perspetiva as negociações com o governo não foram rompidas e que está disponível para continuar à mesa das negociações, mas apenas se três condições forem aceites pelo executivo socialista: o direito de se falar em autodeterminação, que a figura de “mediador” seja aceite e que as “detenções arbitrárias” contra os líderes dos Comités de Defesa da República, criados pouco antes do referendo independentista para protegerem as urnas, terminem.

“Não podemos renunciar ao que somos, não negociaremos os orçamentos se no papel não houver direito à autodeterminação”, afirmou Torra em entrevista à Catalunya Ràdio.

Também os catalães do PDeCat vieram ontem a terreiro recusar qualquer pressão pela possibilidade de o governo cair por causa do orçamento. “O PDeCat não se sente pressionado pela possibilidade de Pedro Sánchez convocar eleições”, afirmou o presidente do partido, David Bonvehí, explicando que não vê credibilidade na ameaça socialista. E, num tom de desafio, disse que “se o PSOE realmente quiser o orçamento mudará de ideias, ainda estamos dentro do prazo, que é quarta-feira”. Bonvehí acrescentou ainda que o seu partido ainda se encontra à “mesa das negociações e do diálogo”.

Posição partilhada pela ERC, que também recusa quaisquer pressões para ceder no diálogo com o executivo. “Um não ao orçamento não tem de implicar uma convocatória de eleições”, afirmou a porta-voz da ERC, Marta Vilalta, referindo que se Sánchez avançar o fará por “acreditar que é o melhor para o PSOE e para a sua situação”. Os independentistas mantém uma frente unida contra o líder do executivo espanhol.

Desde a queda do governo popular de Mariano Rajoy, em 2018, que Sánchez governa com o apoio parlamentar do Unidos Podemos, nacionalistas bascos e independentistas catalães. Sem os últimos, o orçamento de 2019, negociado individualmente com cada força política, não será aprovado. É quase certo que PP e Ciudadanos votarão contra e com os catalães ainda indefinidos, tudo é possível. Neste sentido, Sánchez está nas mãos dos independentistas e sabe isso. Tudo numa semana em que o julgamento dos 12 líderes independentistas detidos em consequência do referendo e da declaração unilateral de independência finalmente começa.

O anúncio da data de 14 de abril para se realizarem as eleições antecipadas apanhou tudo e todos de surpresa, inclusive nas fileiras socialistas. Até agora, quando se equacionava a possibilidade de antecipar o sufrágio, falava-se na hipótese de um superdomingo, juntando as legislativas às eleições europeias, municipais e autonómicas já marcadas para 26 de maio. No entanto, os barões socialistas bateram-se para descartar essa eventualidade por temor que o tema independentista pudesse ter um impacto no resultado das legislativas.