Trumpices e o Bairro da Jamaica


Numa jogada natural e, até acredito, honesta e sincera, Santana Lopes foi visitar o Bairro da Jamaica e expor o que outros não se preocuparam em assinalar: as condições desumanas em que vive aquela população


Estava lançado para enviar a minha crónica sobre a sequela do Bairro da Jamaica quando sou surpreendido com as notícias de hoje sobre a vaga de frio nos EUA.

Vamos por partes. Embora o assessor do Bloco Mamadou Ba considere tudo isto uma novela mexicana, a qual se recusa a alimentar, a verdade é que a saga Bairro da Jamaica está longe de terminar. Depois das baboseiras e irresponsáveis posições que o Bloco emitiu sobre o tema, o mesmo Bloco parece agora querer fazer esquecer o que aconteceu.

Não é possível! Podem querer fechar o dossiê da violência policial e do racismo, mas falta ainda ouvir a posição daquele partido sobre as condições desumanas em que vivem os habitantes daquele bairro.

Um partido que se vangloria de estar sempre na vanguarda da defesa dos direitos e da dignidade dos mais desfavorecidos (e bem) deveria, em vez de vociferar barbaridades e acusações infundadas, tomar uma posição sobre as condições em vivem aquelas pessoas.

Até à data, nada! Ou, pelo menos, não dei conta. Honra seja feita a Santana Lopes. Com a sua experiência e apurado faro político, apontou ao tema que é verdadeiramente importante. Numa jogada natural e, até acredito, honesta e sincera, foi visitar o Bairro da Jamaica e expor o que outros não se preocuparam em assinalar: as condições desumanas em que vive aquela população.

Aproveitamento político, oportunismo e populismo – poderão dizer. Honestamente, pouco me importa. Choca-me que em Portugal continuem a existir pessoas a viver naquelas condições. Se é motivo de revolta, como adiantou? Não sei, mas a mim revolta-me esta clivagem que, infelizmente, parece estar a acentuar-se no nosso país.

Por isso, acho inacreditável que depois de tanta indignação sobre um incidente cujas reais causas desconhecemos, o assessor do Bloco queira terminar a novela sem uma única palavra sobre o problema essencial de todo este episódio.

Deu jeito para alimentar alguns minutos de antena e vozear algumas barbaridades e agora… alto e para o baile que isto é tudo uma novela. Haja mais responsabilidade, senhor assessor.

Entretanto, como acima referi, deparo-me com as notícias sobre a vaga de frio nos EUA, que roça os -51 graus Celsius. Nem consigo conceber tal sensação térmica, mas se for idêntica a entrar numa câmara frigorífica… cruzes, canhoto!

Aparentemente, é um fenómeno que não incomoda o presidente dos EUA e que até dá para brincar. Ao seu estilo habitual, tweetou: “In the beautiful Midwest, windchill temperatures are reaching minus 60 degrees, the coldest ever recorded. In coming days, expected to get even colder. People can’t last outside even for minutes. What the hell is going on with Global Warming? Please come back fast, we need you!”

Honestamente, isto faz algum sentido? Confesso que não sou fã de Trump, mas mesmo o mais fanático apoiante não se incomoda com estas declarações?

O que habitará a cabeça deste senhor para escrever estas coisas? O desdém e a falta de respeito que tem por todos os cidadãos do planeta é arrepiante. É inqualificável a forma como desvaloriza os sinais de debilidade do planeta. Não há ninguém que lhe explique que o fenómeno do aquecimento global está intimamente ligado ao efeito de estufa e que a sua falha implica esta loucura de oscilações climáticas?

Há pessoas que, efetivamente, não acrescentam nada nas nossas vidas e apenas produzem ruído. O problema é que esse ruído tem impacto no nosso quotidiano. Sejam irresponsáveis assessores, deputados ou presidentes de grandes nações.

A fechar, as declarações do ministro do Ambiente, que em duas frases conseguiu colocar em polvorosa metade da população deste país, e em profundo nervosismo grande parte do setor automóvel – não havia necessidade.

 

Escreve à quinta-feira