Mokuna. Quando os leões caçaram um leão na selva africana

Mokuna. Quando os leões caçaram um leão na selva africana


A curiosa viagem do Sporting a Léopoldville, no Congo Belga, e o que se seguiu no relacionamento entre os jogadores congoleses e a Europa. Léon Mokuna chegaria a Alvalade pouco tempo depois, com o nome artístico de Fura-Redes! Tinha-o na verdade feito ao marcar um penálti pelo Vita


Léon: dificilmente um nome viria tão a propósito. Em 1954 era um leão entre leões. Léon Mokuna Trouet Mutombo, nascido no dia 1 de novembro de 1928 em Léopoldville, primeiro jogador congolês a jogar na Europa, primeiro negro a vestir a camisola da seleção belga que, hoje em dia, curiosamente, está repleta de descendentes dessa estranha colónia que era propriedade de Leopoldo ii, rei dos Belgas.

Cerca de 70 mil pessoas entupiram o Estádio da Rainha Astrid para assistir ao encontro entre o Sporting e uma seleção de Léopoldville. E quando os da casa marcaram logo ao terceiro minuto, uma ovação explodiu por entre os espetadores congoleses. O campeão nacional não se deixaria enganar por um entusiasmo alheio que não equivalia à categoria dos portugueses. Gente como Carlos Gomes, Galaz, Juca, Martins, Travassos e Fernando Mendonça chegou e sobrou para dar a volta ao resultado: 3-1. Os jornais da época sublinharam: “A equipa de Léopoldville incluiu os quatro melhores jogadores locais de raça negra.” Nesse tempo, era ainda assunto para estranheza.

De regresso a Lisboa, ainda no aeroporto, Tavares da Silva, responsável leonino, apressou-se a esclarecer: “Não convidámos nenhum jogador ultramarino a ingressar no Sporting. Tudo o que se disser em contrário é mero boato.” Estávamos em meados de Agosto. Em dezembro, Mokuna desembarcava em Lisboa.

E vinha precedido de um episódio fundamental: num jogo pelo seu clube congolês, o Vita, apontou um penálti com tamanha violência que a bola furou as redes da baliza adversária. O povo, na bancada, gritou o seu nome: “Troué! Troué! Troué!” Deixaria de ser Trouet para ser Troué (buracos). Em Portugal chamaram-lhe Fura-Redes.

Não consta que, durante os dois anos e meio que permaneceu no Sporting, tenha alguma vez furado redes. Pouco jogou, na verdade, embora somasse alguns golos poderosos. Regressaria ao Congo em 1957, mas apenas por uns meses. Fazendo parte de uma seleção congolesa que se deslocou à Bélgica para disputar vários particulares, caiu no goto dos dirigentes do La Gantoise (hoje com o nome de Gent) e ficou cinco anos no clube. “Só queria era jogar”, diria mais tarde, “não fazia ideia do simbolismo de ser o primeiro africano de cor a participar no campeonato belga.” Em 1958 voltou a entrar para a História: foi chamado para a seleção da Bélgica. Dois jogos, somente, mas era inédito: nunca um jogador negro fizera parte dos diabos vermelhos.