2019: um ano do povo


Este ano é um ano de eleições. Os portugueses têm, assim, uma palavra a dizer sobre o futuro. E devem ter consciência de que abster-se é legitimar quem chegar à frente, mesmo que só conquiste uma pequena parcela do universo eleitoral


2019 tem três eleições agendadas em Portugal. Quer isto dizer que, ao contrário de 2018, os portugueses poderão não ficar praticamente na condição de seres passivos como sucedeu em 2018, sofrendo uma austeridade disfarçada e uma economia que definhou ao longo dos meses, baixando para níveis preocupantes. Só mesmo em algumas áreas do Estado é que houve reposições, enquanto na parte privada há mais emprego, mas mal pago.

2019 pode agravar a tendência negativa, precisamente por se tratar de um ano em que haverá eleições europeias, regionais na Madeira e, sobretudo, legislativas que são as mais decisivas e importantes de todas, ultrapassando até as presidenciais. Por mais que Costa negue, isso torna possível ainda mais conflitualidade social, cedências excessivas, varrer problemas para debaixo do tapete ou empurrar com a barriga questões complicadas, como a degradação evidente dos serviços prestados pelo Estado, sem equilíbrio de contrapartida com os enormes impostos diretos e indiretos que todos pagam. Precisamente por isso, cada português deveria ponderar bem antes de votar, seja lá em quem for.

2019 é internacionalmente mais um ano em que acontecerão coisas inimagináveis, seja na vida económica, política ou nos acontecimentos muitas vezes dramáticos produzidos pela natureza. Mas há, entretanto, problemas que estão calendarizados. É o caso do Brexit que, nesta altura, tem tudo para correr mal, se houver uma saída desordenada. Uma cisão dessas pode afetar a Europa toda e, nomeadamente, os países atlânticos, como é o caso de Portugal, um parceiro histórico do Reino Unido, que, apesar disso, nos desconsiderou bastas vezes.

Em suma, é um ano que tem para os portugueses uma vantagem e um acrescento de responsabilidade. Todos os que têm capacidade eleitoral podem decidir o futuro coletivo. No naipe de ofertas políticas haverá espaço para praticamente as diversas ideologias, da extrema direita à extrema esquerda, passando por partidos de protesto, faltando para já movimentos verdadeiramente populistas. No entanto, verifica-se uma tendência para os cidadãos escolherem a abstenção. Quem fica em casa alega desânimo e o descrédito da classe política, manchada por episódios negativos de toda a espécie. É verdade e é triste, embora a generalização não seja justa. E isso não justifica o alheamento que é uma forma de legitimar o poder de quem ganha. Abster-se é votar no vencedor, é ajudar a manter o que está mal, é apoiar as soluções de que não se gosta, é pactuar com os erros, é desistir de combater, é negar a democracia e é dar espaço a que tudo fique na mesma ou até pior. Quanto maior for a mobilização dos eleitores, mais responsabilizáveis serão os políticos de quem dependem muito mais coisas do que se possa pensar. A política está em todo lado e intervém sistematicamente mesmo nas coisas mais pequenas do nosso quotidiano. É bom não esquecer esse importante “pormaior”.

Embora já não haja tempo de alterar o nosso sistema eleitoral para incentivar à participação cívica, um dia terá de se olhar de frente para o problema do método de escolha dos políticos. Até ver, a maior legitimidade popular tem estado no Presidente da República eleito pessoalmente e nas autarquias. Já os deputados, na prática, ninguém sabe quem escolhe e como aparecem depois de jogos meramente partidários, escolhidos em grupos minúsculos. A solução de círculos uninominais seria porventura mais transparente e responsabilizadora, mas os países onde existe também não deixam de ter problemas. Noutro contexto, e deixando de parte a hipótese do voto obrigatório, seria interessante que se estudasse a viabilidade política da soma dos votos brancos ter repercussão no número de deputados, deixando cadeiras vazias permanentemente e dando uma imagem mais real do país. Claro que isso iria trazer novas complicações, mas daria um retrato mais fiel ao parlamento. No meio disto, uma coisa é certa: o modelo político que temos precisa de ser repensado e melhorado. Já não há tempo para o fazer em 2019, mas era importante que o assunto fosse pelo menos discutido em público.

2. O presidente Marcelo voltou a lançar dúvidas sobre a hipótese de se recandidatar. Fala no desgaste, no cansaço e na solidão para justificar a hipótese de não concorrer novamente. Dois mandatos implicam ficar dez anos em Belém, o que ao ritmo diabólico de Marcelo é digno de um super-homem. A questão do desgaste e do cansaço presidencial é recorrente. Por isso, há quem defenda a ideia de um mandato de sete anos não renovável. Lá está mais uma questão a discutir no nosso modelo político. Com Marcelo nunca se sabe o que esperar. As suas declarações mais recentes somam-se a outras no mesmo sentido pelo que não se pode falar na criação de um tabu. Mas uma coisa é certa: ficar ou não só depende dele, por muito que haja pressões para que se mantenha e quem espreite uma oportunidade motivada por uma retirada. Se ele quiser, fica, e com uma percentagem de votos porventura nunca vista numa democracia.

 

Jornalista