Mega-processos: acusar por atacado….

Mega-processos: acusar por atacado….


Brincando com coisas sérias, quase que diria que se me tivesse tocado a “sorte” de ficar com o processo Marquês, com 9 mil pastas e milhares de documentos que nunca tinha lido… acho que me reformava ou “metia baixa” (à portuguesa)


O senhor Musk, enquanto CEO da Tesla, depois de anos a espantar o mercado com novidades e avanços tecnológicos que teimam em não entrar na produção industrial de grande escala (sob a marca Tesla, pelo menos…), cometeu o erro de “animar” a bolsa norte-americana com uma notícia não confirmada que influenciou as cotações da empresa.

Fê-lo no dia 4 de agosto de 2018 e foi duramente punido logo no final de setembro do mesmo ano, ou seja, menos de dois meses depois.

Nenhum de nós sabe se foi punido pela “aldrabice” (uma, embora de peso) ou por centenas de outros “crimes laterais” tão comuns em Portugal, como “associação criminosa” (com quem tenha sido suspeito de lhe dar a ideia), “ganho económico em negócio” (que é algo que em português corrente, dificilmente se perceciona como um crime…), “branqueamento de capitais” (que nunca ninguém recupera), “corrupção” (embora entre nós não se tenha de provar que quando há quem corrompe tem de haver alguém corrompido), “uso indevido de computador alheio” (em minha casa existe esse crime todos os dias), “crime informático” (o que será? Cometido com o computador?), “falsificação de documento” (há sempre…), “fraude fiscal” (mesmo que, como entre nós, o fisco possa declarar que nada lhe é devido…), etc. etc..

Vem tudo isto a propósito dos mega-processos (em arguidos e crimes) a que a nossa justiça nos vem habituando:

– Processo Portucale – Factos públicos ocorridos em 2005 que incluíam um corte de sobreiros numa herdade do Grupo Espírito Santo levam a que, em 2010, sejam acusados de centenas de crimes, onze arguidos, entre os quais três dirigentes dos Serviços Florestais (que, como o Senhor Juiz de Instrução sabia e o Tribunal confirmou) cumpriram escrupulosamente ordens explícitas de três ministros do XVI Governo Constitucional que os tutelavam na matéria: Agricultura, Ambiente e Turismo (os quais foram seguramente ouvidos, mas nunca arguidos nem acusados!) e que nem por isso (esses três funcionários) deixaram de ser exonerados e publicamente enxovalhados pelo então ministro Jaime Silva. Dois anos mais tarde, após centenas de sessões do tribunal, todos os arguidos foram absolvidos…. O Ministério Público recorreu de imediato de todas as absolvições, exceto das três que diziam respeito aos ditos funcionários dos Serviços Florestais que foram considerados alheios a qualquer crime ou má prática (depois de andarem mais de dois anos nos títulos dos jornais, acusados de corruptos e gastando dinheiro e economias que nunca lhes foram nem serão ressarcidos). Nem um só jornalista ou meio de comunicação (ou o dito Dr. Silva) lhes pediu, até hoje, desculpa… que se saiba…

– Operação Marquês – iniciada (para o público) em 2014 com a “estranha” (e ainda não explicada) mediática prisão de um ex-primeiro-ministro que regressava a Portugal; quatro mil páginas, milhares de dossiers, 28 arguidos, quase 180 crimes e continuam a aparecer “novidades”;

 

– Operação Face Oculta – iniciado em 2009, teve 34 arguidos, todos condenados (a maior pena recaiu, claro, sobre o sucateiro que oferecia robalos e “luvas” a pessoas importantes para obter negócios…); O acórdão da sentença, lido em setembro de 2014, tem 2871 páginas e os recursos continuam;

– Falências e gestão fraudulenta de bancos – Processos, esses sim, estranhos e verdadeiramente “ocultos”, onde (ir)responsáveis pelo “desaparecimento” de muitos milhões de euros (concretos e de terceiros que os pouparam) são condenados (nenhum na cadeia, até agora) a penas bem inferiores à do sucateiro Godinho;

– Roubo das Armas em Tancos – Roubo e cenas rocambolescas que, até ver, tiveram o seu auge na acusação de militares que usaram um informador (como vemos nas séries de TV todos os dias…) para recuperarem as armas, com a respetiva hierarquia militar e política a “assobiar ao cochicho”, como costumava dizer aquele conhecido comentador da TVI do tempo do Presidente Cavaco;

– Ataque à Academia de Alcochete do Sporting, no passado mês de maio – Já se fala em milhares (!) de crimes imputáveis a três dezenas de energúmenos, sendo o antigo presidente do Sporting “brindado”, só para si, com “98 ilícitos criminais” entre os quais o de “autor moral de terrorismo”!

Não sendo especialista em direito, interrogo-me se estas acusações “por atacado” (como lhes chamo), não banalizam e “disfarçam” o crime (principal), não dificultam (ou às vezes impedem) a acusação (já vimos casos de sentenças que são dadas por “incompletas” por os juízes se terem esquecido de decidir sobre uma das – muitas – acusações formuladas) e prolongam indefinidamente o processo acusatório, criando condições para um número exponencial de possibilidades de recursos e de manobras dilatórias e, especialmente, dificultando o apuramento da verdade, colocando dúvidas sobre a eventual condenação e, tantas vezes, inviabilizando na prática o cumprimento das penas.

Brincando com coisas sérias, quase que diria que se me tivesse tocado a “sorte” de ficar com o processo Marquês, com 9 mil pastas e milhares de documentos que nunca tinha lido… acho que me reformava ou “metia baixa” (à portuguesa)… e depois… quem viesse atrás que fechasse a porta…

Numa visão muito cínica diria pois que à senhora procuradora geral da República não reconduzida (“eles” lá saberão porquê) e ao senhor juiz Carlos Alexandre (preterido pelo providencial sorteio eletrónico com as regras científicas e matemáticas que foram citadas) lhes saiu a “sorte grande”!!!

É que, muito provavelmente, vão ficar para a “estória” como tendo feito tudo para desmontarem grandes e perigosas (presumíveis) redes de corrupção e, se esses mega-processos não derem em nada (para além de umas inevitáveis condenações por fraudes fiscais), ficarão no imaginário coletivo e da maioria dos portugueses como sendo pessoas a quem não foi permitido terminarem o seu trabalho…

Veremos…