Sentado no café do Hotel Sheraton, em Lisboa, Rubem Vasconcelos, presidente da Patrimóvel, não esconde as esperanças de que, no futuro, o governo de Jair Bolsonaro venha a incentivar o mercado imobiliário brasileiro. Mas enquanto o desejo não passa a realidade, o empresário não deixa de olhar para o outro lado do Atlântico, para Portugal, à procura de novas oportunidades de negócio. “No momento, em Lisboa e no resto do país, o mercado é muito fértil e ainda teremos tempo para surfar esse maravilhoso tempo que o mercado imobiliário está a viver”, garantiu.
Como está o mercado imobiliário brasileiro?
Com a mudança de governo, esperamos uma nova janela no mercado imobiliário, que se prepara para um novo movimento. Não digo que haverá um boom imobiliário, como aconteceu na geração passada, mas acho que vamos ter novamente um grande momento no mercado imobiliário brasileiro, por causa da nova conjuntura nacional.
Está otimista com este governo?
Passámos por um momento muito difícil e acho que nasceu uma nova esperança, nasceu um novo tempo. Estamos muito esperançosos com o novo governo. Vamos começar um novo ciclo político, económico e imobiliário, que é uma indústria muito importante para o país. Sempre que o mercado imobiliário vai bem, o país vai bem.
Que políticas devem ser promovidas pelo governo para incentivar o boom imobiliário?
Uma política no sentido de economia, mas não gostaria de falar de política por ser um mediador de imóveis. A política não combina muito com os nossos negócios. Traz-nos a noção económica que está a montar uma nova perspetiva e, em termos de mercado imobiliário, estamos muito esperançosos que a partir de 2019 haja uma consolidação e vá nascer um novo mercado imobiliário brasileiro.
De que forma se fez sentir a crise no mercado imobiliário brasileiro?
O mercado imobiliário precisa de esperança e é património. O brasileiro tem uma coisa muito engraçada: foi colonizado pelos portugueses, então tem em si o património como um bem muito forte. Parece que o brasileiro que não é proprietário não tem uma costela, parece que tem defeito. O brasileiro sonha com a casa própria e nós tivemos sempre muitas dificuldades em tê-las – por causa das taxas de juro, problemas conjunturais… – e agora começamos a ter essa oportunidade. Só agora o mercado começa a abrir, as taxas começam a facilitar, a inflação começa a ficar mais controlada e está a nascer um novo Brasil.
Uma economia alavancada no setor imobiliário pode criar bolhas especulativas…
A bolha especulativa é quando se começa a vender e a financiar 110% do imóvel. Se se mantiver… A crise tem uma coisa muito boa: amadurece-te. Uma geração não pode passar por uma crise, chegar à próxima crise e cometer os mesmos erros. Se o fizer é porque ficou burra. Tem de se viver e amadurecer com a crise. Deve-se conter o financiamento com uma margem de segurança. Não se pode começar a vender a 110%, pois aí sim, começa-se a financiar mais do que vale o imóvel. Sabemos o que aconteceu no passado, não podemos repetir no futuro.
De que forma se pode expandir o mercado imobiliário quando a pobreza atinge níveis elevados?
Gerando oportunidades, controlando a inflação, tendo uma economia estável ou diminuindo as taxas de juro, porque aí dá-se mais oportunidades à população. É assim que tem de se fazer, não tem máscara. Porque o mercado imobiliário não pode ser social, não se pode dar casas de graça. Não é assim a vida.
A habitação não é um direito?
É um direito, sim, mas não para se dar de graça. Tem de se facilitar [o acesso] à habitação, tem de se dar oportunidades, mas não acho que o governo tem de dar habitação de graça para todas as pessoas.
A Patrimóvel foi afetada com a crise?
Foi muito afetada. Todo o Brasil foi afetado. A Patrimóvel foi uma empresa que entre 2003 e 2014 vendeu cerca de cem mil imóveis. Vendia na ordem dos 9500 a 10 mil imóveis por ano. Este ano vai fechar com 450 milhões de reais de lucro (101 milhões de euros), perdendo 85% do faturamento.
Como afeta essa perda as perspetivas de crescimento da empresa?
É começar de novo. Só temos um caminho: fortalecer e começar outra vez. É pegar em toda a experiência, toda a maturidade que adquirimos, todo o capital que se poupou e começar outra vez.
Foi a classe rica do Brasil que votou em Bolsonaro?
Não foi só a classe rica que votou em Bolsonaro, foi uma parcela muito grande da população. Tínhamos perdido a esperança. O governo deteriorou-se, não conseguíamos viver mais na situação em que se vivia. Foi o Bolsonaro, mas poderia ter sido o João [Amoedo, do partido NOVO]. O que se queria era uma grande mudança – e foi feita.
Os brasileiros terão interesse em comprar casa noutros países, como Portugal?
Portugal é muito curioso. Vejo intercâmbio entre Portugal e Brasil por causa da nossa língua e das nossas origens. Hoje, Portugal está no auge e o Brasil está em baixo; amanhã, o Brasil estará no auge e Portugal em baixo. Acho que podemos fazer uma grande interação entre mercados imobiliários, entre países, entre bancas. No Brasil, toda a gente está à procura de oportunidades e Portugal é a princesinha da Europa. É por isso que estou a montar uma imobiliária brasileira em Portugal, quer dizer, não brasileira, uma imobiliária portuguesa, pensando na ida e na vinda.
O seu mercado seriam os brasileiros que quisessem comprar casa em Portugal?
Não. Quero montar uma imobiliária portuguesa para vender a chineses, franceses e brasileiros. Mas não, não sou um oportunista. Não vim para aqui para ficar um ano. Vim para ficar uma vida, trazer os meus filhos; quero vir para trabalhar, quero vir para me tornar português.
Como vê o mercado imobiliário português?
É muito atrativo. O capital imobiliário europeu tem uma grande atração por Lisboa. No momento, em Lisboa e no resto do país, o mercado é muito fértil e ainda teremos tempo para surfar esse maravilhoso tempo que o mercado imobiliário está a viver.
E qual seria o seu nicho de mercado?
Tudo. No Brasil trabalho desde habitação para viver até ao mercado de luxo. Não vim cá para apressar o mundo, vim para começar e a minha grande expetativa é trazer capital para que possa colaborar com todos os promotores imobiliários da cidade. Queremos um pouco mais de velocidade. As aprovações são muito demoradas.
Em Portugal também há pessoas a perderem as suas casas ou a serem despejadas. Como vê esta crise da habitação?
Não tenho uma visão global sobre Portugal, mas tenho do mercado imobiliário de Lisboa. As influências que tive no meu mercado também as terei aqui. Sempre fui uma pessoa que procura soluções. Venho para olhar, para observar e ver o que posso incluir, o que posso melhorar. Estou muito motivado para vir a Portugal e vejo em Lisboa uma grande oportunidade e desafio profissional. Venho para tentar melhorar, não para ser igual aos outros.
A sua empresa entrou no livro do Guinness ao vender 1480 imóveis em apenas quatro horas. Como fez isso?
Por volta de 1980, tinha uma imobiliária em Belo Horizonte e um projeto de uma empresa chamada Gomes Almeida Fernandes. Era um produto chamado aparthotel, um tipo de hotel em condomínio que se vende a particulares. Era um produto novo que chegava ao Brasil e à cidade. Tínhamos 90 unidades e conseguimos 180 cheques. Deu-me a inspiração de não vender mais imóveis de maneira estática, mas em eventos e chamar todos [os interessados] para uma festa onde se faria a venda dos imóveis. Quem ia para não comprar nada via todas as pessoas a comprar e acabava por comprar um, quem ia para comprar um via todas as pessoas a comprar e comprava dois. Comecei a vender todos os prédios numa noite e a ficar famoso por vender em coquetéis.
Mas só as pessoas com mais possibilidades económicas podem comprar imóveis com essa facilidade…
Não. Havia crédito e não vendia só apartamentos de luxo. Não se constrói um imóvel de luxo com mil unidades, por isso era mais para a classe média. Era um imóvel que dava oportunidades e vivia-se um momento conjuntural importante em que o brasileiro desejava ser proprietário.
Quais são as perspetivas para os próximos anos da empresa em Portugal e no Brasil?
No Brasil, a desesperança é frustrante. As metas não são cumpridas. Passámos por um período sem metas por não serem alcançadas.
A sua empresa está sediada no Rio de Janeiro, onde existe intervenção militar… Como vê esse cenário?
Muito ruim para o Rio de Janeiro. É uma cidade que quando chegar ao seu apogeu, quando chegar ao seu melhor estado, será desejada por todos os brasileiros, pelo brasiliense, pelo paulista, pelo nordestino, pelo capixaba, pelo mineiro. É um lugar de praia, um lugar de lazer e é um balneário. Mas quando as pessoas têm medo, o carioca fica contaminado porque a esperança dele nasce com a chegada dos outros. Temos de controlar a segurança. A educação e a saúde são muito importantes, mas sem a segurança pública não vamos conseguir fazer saúde nem educação…
A intervenção militar no Rio de Janeiro resultou?
Não é que tenha resultado, mas gerou esperança. O Rio de Janeiro deixou-se deteriorar, as favelas abraçaram a cidade. Que resposta dá o governo quando as pessoas usam a força? Infelizmente, a força. A intervenção militar foi necessária, mas é preciso inteligência. É preciso que se recorra a uma força silenciosa. Sem ela, o Rio de Janeiro não vai renascer.
Em Portugal, já tem alguns negócios em mente?
Estamos a conversar com muitas pessoas, com alguns investidores que incentivam a criação deste fundo imobiliário. Acredito que brevemente vamos estar a contribuir muito para esta cidade. Sempre fui um profissional que só ganha a dar prazer ao consumidor. Quando percebi o mercado imobiliário brasileiro, que ele ia crescer, fiz algumas viagens a trabalho – fui 15 dias para Dubai, 15 dias para Miami, 15 dias para Espanha – só para visitar prédios. Conheço todos os hotéis, todos os empreendimentos imobiliários desses países, e para quê? Para me inspirar, para copiar. Não sou professor, não vim aqui para ensinar.