Falta de bom senso ou motivação pessoal?


Pergunto: não é sensato discutir e repensar a forma como as diferentes forças de auxílio e de reação a catástrofes devem organizar-se e coordenar-se?


Quando, no ano passado e já este ano, fomos assolados pelo flagelo dos incêndios, multiplicaram-se os elogios à bravura, destreza e compromisso dos nobres soldados da paz. Sobretudo às corporações de bombeiros voluntários que, quase sempre mal equipadas mas moralmente fortes e destemidas, se lançam para a linha da frente no combate aos incêndios, evitando males maiores.

No meio de toda a bravura e no calor da emoção, os rescaldos acabam por ser atenuados, mas parece-me evidente que, sem querer imputar culpas, há falhas nas respostas às calamidades.

É natural que assim seja. Nunca vamos conseguir ser totalmente eficazes e eficientes no combate e resposta aos diversos cenários de catástrofe que podemos encontrar. A questão é: devemos ponderar, analisar e discutir formas de diminuir os impactos e melhorar a nossa capacidade de reação?

A resposta parece-me simples e única: sim, devemos!

Felizmente, o nosso país tem sido poupado a grandes catástrofes, sobretudo quando comparado com outros locais do planeta. Contudo, as alterações climáticas e recentes impactos da fúria da natureza registados no nosso país (já para não falar do sempre iminente risco sísmico) exigem, pelo menos, um diálogo sério e ponderado sobre como devemos preparar-nos.

Se há coisa de que no nosso país não podemos orgulhar-nos muito é da capacidade de coordenação e organização. Safamo-nos quase sempre muito bem, mas a planificação e capacidade de organização (assim ao estilo nórdico) não é claramente o nosso forte. Razão, aliás, para até termos uma palavra singular no nosso léxico: desenrascar.

Pois no tema do momento, a proposta do governo de reforma da proteção civil, e porque o assunto é sensível, parece-me que a intenção do governo é precisamente afastar o uso da expressão desenrascar.

Pergunto: não é sensato discutir e repensar a forma como as diferentes forças de auxílio e de reação a catástrofes devem organizar-se e coordenar-se?

Num país tão pequeno, não ganhamos escala em ter uma cadeia de comando clara e organizada? Faz sentido retalhar a autoridade e pôr em causa processos de coordenação?

Não equacionar esta hipótese só pode ter duas explicações: ou é falta de bom senso ou esconde motivações pessoais.

Uma solução, qualquer que ela seja, parte de uma proposta e ganha com a discussão e o contributo do maior número de intervenientes.

Fazer birra e extremar posições não só é uma atitude infantil como, no caso concreto, coloca em risco a vida de todos os portugueses.

Sem fazer juízo de valores nem de razão sobre as reivindicações ou críticas dos bombeiros voluntários, que certamente podem contribuir para melhorar a proposta em cima da mesa (são, aliás, eles que, por norma, dão em primeiro lugar o corpo à luta), parece-me que a atitude de Jaime Marta Soares, o presidente da Liga dos Bombeiros, não acrescenta nada. Nem à proposta, nem ao interesse dos bombeiros, nem às populações.

O tom birrento e desmedido com que saltou para a dianteira da luta contra a proposta do governo é, por si só, uma aberração e totalmente incompreensível.

Talvez seja por falta da emoção, ou saudosismo das luzes da ribalta do tempo de convulsão no Sporting Clube de Portugal e dos episódios que protagonizou, mas, ainda assim, é injustificável.

O problema é que, à data da crise do Sporting, o impacto das suas ações ficava restringido ao universo leonino. Hoje, a sua marca pode ter consequências na vida de todos nós. E isso, para mim, é inaceitável. Está na altura de ganhar algum juízo.

Faço um apelo a Marta Soares para que aproveite a assembleia-geral do Sporting no próximo sábado, liberte a testosterona acumulada e repense, de forma séria, o contributo que um homem com a sua experiência pode dar, para termos uma proposta que proteja o interesse de todos os portugueses.

 

Escreve à quinta-feira