E a ópera chega a Moçambique

E a ópera chega a Moçambique


“Mwango e Mwanga”, uma adaptação de “Bastien Und Bastienne” estreia hoje em Maputo. A primeira ópera moçambicana junta professores e alunos da Escola de Comunicação e Artes, e a participação da soprano Estela Mendonça


De todos os países de língua oficial portuguesa, Moçambique é aquele de que menos se conhece a cultura. 

Há doze anos, Vítor Gonçalves deixou a direção do Festival de Teatro de Almada que fundara em 1983 com Joaquim Benite para se dedicar à docência em Moçambique. Um dos frutos desse trabalho de formação é colhido hoje na estreia de “Mwango e Mwanga”, ou seja “meu e minha” em português, uma adaptação de “Bastien Und Bastienne”, de Mozart. “É a primeira ópera que se faz em Moçambique”, confirma desde Maputo onde o espetáculo sobe pela primeira vez ao palco no Centro Cultural da Universidade Eduardo Mondlane, onde o curso é lecionado há uma década, numa sala com capacidade para mil pessoas.

“Esta ópera nasce de um trabalho que tem vindo a ser realizado de formação de cantores, atores e músicos na Escola de Comunicação e Artes (ECA). Este curso funciona há dez anos. A faculdade solicita a partilha públicas dessas práticas artísticas”, refere Vítor Gonçalves. O espetáculo baixa a cortina sobre o ano académico e pretende mostrar as capacidades dos estudantes. 

Aos alunos, o elenco soma “docentes”, e “colaborações externas”, como a da soprano Stela Mendonça “habituada aos grandes palcos de Paris, Roma e Viena”, na direção vocal. Os protagonistas são Horácio Guiamba (Mwango), Joana Balango (Mwanga), Dadivo José (Nyanga) e Josefina Massango (Senhora da Palhota Grande). Venâncio Calisto encena e Vítor Gonçalves coordena a partir de uma tradução de Yvette Centeno. Ao todo, são quinze músicos e atores de um total de 40 pessoas envolvidas na produção.

“A ópera foi adaptada ao contexto de uma história maconde (tribo que vive entre o sudeste da Tanzânia e o nordeste de Moçambique)”, descreve. “Mwango e Mwanga” passa-se no Cabo Delgado, província a 2700 quilómetros de Maputo. “Na obra original de Mozart, uma senhora rica quer seduzir o moço oferecendo-lhe uma vida melhor. Há depois um feiticeiro que quer ficar com a rapariga (namorada do rapaz) mas acaba por juntá-los”. “O que fizemos foi trazer a tradição de Moçambique para uma linguagem moderna”, refere. Na prática, isso traduziu-se numa “adaptação onomástica e geográfica”, o que implicou traduzir “Bastien und Bastienne” para “Mwango e Mwanga” e a cena que se passa originalmente numa aldeia europeia passou a decorrer numa aldeia de Cabo Delgado, de onde provêm os nomes Mwango e Mwanga”. O espetáculo da ECA tem 50 minutos. Os intérpretes cantam em alemão, mas os diálogos são em português. 

De Maputo a Cabo Delgado. “é como a distância de Lisboa a Berlim”, compara Vítor Gonçalves, reconhecendo em Moçambique “um país muito vasto” com “muitas limitações”. Por isso, “não foi possível fazer esta ópera como se estivesse em Viena. É necessário adaptá-la ao contexto local”, assume. Para viabilizar o espetáculo, e à falta de apoios estatais como em Portugal, foi necessário “o apoio de uma empresa privada”. 

“Mwango e Mwanga” estreia-se hoje e voltará ao Centro Cultural da Universidade Eduardo Mondlane em fevereiro de 2019.