Bloco faz queixa da Câmara do Porto por despejos em bairros sociais

Bloco faz queixa da Câmara do Porto por despejos em bairros sociais


Bloco diz que despejos estão a ser feitos com a justificação de “ofensa aos bons costumes”


O Bloco de Esquerda anunciou que irá participar à Procuradoria-Geral da República (PGR) o facto de o regulamento da habitação social da Câmara do Porto permitir despejos devido a ofensas “à lei, aos bons costumes e ordem pública”. É o caso, por exemplo, de tráfico de droga.

Na base da queixa a fazer à Procuradoria está, segundo o Bloco de Esquerda, “pelo menos uma inconstitucionalidade, que é o princípio da não discriminação”, acrescentando ainda que “há outras situações gritantes que serão colocadas à consideração da procuradora-geral da República, mas estamos certos que irá confirmar as situações que se verificam contra a lei e contra a Constituição, uma vez que são colocados em causa os direitos humanos das pessoas carecidas”.

A revelação partiu da deputada Maria Manuel Rola, após uma visita ao Bairro de Francos, na freguesia de Ramalde, no Porto, onde ontem à tarde ouviu as queixas de moradores que estão na iminência de serem despejados “porque alguém do seu agregado familiar foi condenado ou é apenas suspeito de tráfico de droga”.

De acordo com a deputada bloquista, “temos conhecimento de pelo menos 20 ações de despejo, metade das quais já foram executadas, em vários bairros camarários do Porto, como é o caso de Francos, mas não só”. O mesmo acontece em bairros em redor, onde é usado o mesmo argumento: “Por terem pessoas no agregado familiar que são alvo de processos em tribunal e que a câmara administrativamente coloca na rua.”

“São processos em que as pessoas, às vezes, nem são titulares do contrato de arrendamento, mas desde que tenham uma relação com a habitação acabam por ser consideradas como situações ilícitas, mesmo quando as provas policiais são pouco sólidas”, disse a deputada, referindo “casos nos bairros do Lagarteiro, do Cerco, de Lordelo e de Aldoar, entre outros”.

 

“O meu filho já pagou pelo que fez”

Fernanda, de seu nome real, é um dos rostos (escondidos) entre os alvos dos despejos por parte da Câmara Municipal do Porto, dado que o filho, agora com 29 anos, foi condenado a uma pena suspensa de dois anos e meio pelo crime de tráfico de droga, naquele bairro.

“O meu filho já pagou pelo que fez”, disse Fernanda ao i. E deixou uma garantia: “Ele está a agora a trabalhar, ganha o salário mínimo e nunca mais teve problemas de droga nem com nada.” 

A moradora diz ainda que o filho “tem um menino de três anitos”. “Não é tirando-nos a casa que se vai resolver os problemas, pelo contrário. Parece que querem transformá-lo num sem-abrigo, empurrando-o de novo para a má vida, assim como eu, que estou à espera de ser operada.” 

Fernanda vai mais longe e diz mesmo que não se importava de trocar o seu T4 por um T1. “O que não posso é ficar sem casa, pois não temos para onde ir. Só vivo de 170 euros do RSI e as rendas de habitação na cidade do Porto não dão para pessoas como nós, que não temos posses financeiras para pagar rendas de 300 euros. Eu pago 11 euros.”

Fernanda diz, no entanto, que como precisa da sua casa, tem esperança de conseguir mantê–la. “Tenho sempre esperança de ficar com a minha casa, pois não tenho para onde ir. Também não vou pôr o meu filho na rua porque ele também precisa de casa, como toda a gente, está a trabalhar e, aliás, tem um filho para sustentar.”

 

Câmara confirma despejos

A Câmara Municipal do Porto, questionada ontem pelo i, confirmou a existência de oito processos de despejo em curso no Bairro de Francos, em Ramalde, referindo que seis são devido a tráfico de droga e os outros dois a irregularidades na utilização das habitações. “Confirma-se que há seis processos de despejo com fundamento na utilização contrária à Lei (tráfico de droga), decididos após sentença judicial”, informou a autarquia portuense.

Segundo a autarquia, “estes despejos foram alvo de recurso, mas o processo foi ganho pela Câmara Municipal do Porto” no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto. E afirma que existem ainda dois processos de despejo em curso: “Um por não utilização da habitação e um outro por ocupação abusiva da habitação”, revelou também ao i a Câmara do Porto. “O Bairro de Francos é constituído por 522 fogos distribuídos por 15 blocos onde residem 1130 pessoas”, esclareceu ainda uma fonte da presidência da autarquia.