“A ofensiva alargada e constante contra os direitos humanos, iniciada depois da chegada do presidente Xi Jinping ao poder, há cinco anos, não mostrou sinais de diminuição em 2017”, escreveu a Human Rights Watch no seu último relatório sobre a China.
O que mudou, quase 30 anos depois do massacre na Praça Tiananmen (1989), foi a preocupação do mundo com os direitos humanos e a quase hegemonia da diplomacia económica em relação à diplomacia política nas relações dos governos com a China.
“O futuro próximo dos direitos humanos parece sombrio, especialmente porque é esperado que Xi Jinping permaneça no poder até 2022”, acrescenta o relatório da organização norte-americana. E mais sombrio ainda porque o presidente Xi conseguiu mudar a Constituição e pode, se bem o entender, entronizar-se como líder chinês para sempre.
Estrita censura online, campos de reeducação para a minoria muçulmana uigure – a quem se negam os direitos a manter a sua cultura e que vivem sob forte vigilância na região dita autónoma de Xinjiang –, ativistas dos direitos humanos torturados e obrigados a confissões forçadas que são depois transmitidas pela televisão.
Mesmo em Hong Kong, que gozou desde a transição da soberania britânica, em 1997, uma abertura democrática relativa, a folha de violações dos direitos humanos tem aumentado nos últimos anos, com a consolidação do poder de Xi. Quatro deputados pró-democracia perderam os seus mandatos por ordem do tribunal em julho de 2017 e três importantes líderes estudantis foram presos logo a seguir, em agosto.
O prémio Nobel da Paz Liu Xiaobo só deixou a prisão no ano passado para morrer no hospital, sob rigoroso controlo de segurança. A viúva só conseguiu deixar o país em julho deste ano, depois de oito anos de prisão domiciliária sem qualquer julgamento nem culpa formada.
As autoridades reservam-se o direito de impedir as pessoas de deixar o país arbitrariamente e desde junho que impedem a mulher, o filho e a filha de Liu Changming de sair do país. Liu é um antigo funcionário que conseguiu fugir do país e é procurado pelas autoridades por alegada fraude bancária. As autoridades esperam que, impedindo a família de sair da China, consigam obrigar o homem que perseguem há anos a ceder à chantagem e entregar-se.
A consolidação do poder de Xi também coincidiu com o eclipsar do dalai lama do espaço mediático internacional. O exilado líder espiritual do Tibete, país que a China ocupou ilegalmente nos anos 1950, costumava ser visita habitual dos países ocidentais, recebido com honras de chefe de Estado e muita atenção da imprensa, mas já não é assim. E não é por falta de razões, tendo em conta que a repressão chinesa da população tibetana tem vindo a aumentar, como refere a Organização das Nações e Povos Não Representados (UNPO). Liau Xiaobo escreveu em 2008 que “a democratização de toda a China é condição necessária para uma solução, seja ela qual for, para a questão do Tibete”. Como a democratização está longe e se afastou ainda mais com Xi no poder, e sem pressão internacional sobre Pequim, a solução para o Tibete desapareceu do horizonte.
“As reformas só avançaram pela metade, economicamente, mas não politicamente”, diz Wei Jingsheng, o mais famoso dos dissidentes chineses, que vive exilado nos EUA desde 1997.
O homem que em 1978 escreveu numa parede de Pequim um apelo à liberdade que mudou consciências disse, em conversa com a Swissinfo, que a China de Xi Jinping é uma “mistura de ditadura de partido único e capitalismo: quando oprime as pessoas, é mais feroz que em qualquer outro lugar do mundo; quando explora as pessoas, é pior que o capitalismo original dos países ocidentais na altura do marxismo”.
“Com Xi Jinping, a China retrocede ainda mais” em matéria de direitos humanos, refere Wei, que ultimamente tem limitado muito as suas viagens para lá de Washington por razões de segurança: “As autoridades norte-americanas e europeias estão preocupadas com a minha segurança.”
A influência cada vez maior da China permite que as suas violações de direitos humanos sejam caladas internacionalmente.
O ano passado, a Grécia bloqueou um consenso na União Europeia e levou a que, pela primeira vez, o bloco não tenha feito qualquer declaração no Conselho de Direitos Humanos da ONU contra a violação dos direitos humanos na China.