Neste 43.o aniversário do 25 de Novembro de 1975 que o país político (outra vez) vergonhosamente ignorou, tivemos oportunidade de conhecer algumas ideias dos órfãos ideológicos dos vencidos pelo contragolpe, que se manifestavam por Lisboa pela erradicação da violência contra as mulheres.
Com aquela pesporrência imbecil de quem acha que o direito a fazer ouvir as suas alarvidades ao vivo e/ou com difusão amplificada pelas redes sociais se deve em exclusivo ao golpe militar do 25 de Abril, os “palermos” de serviço ao revisionismo entretiveram-se a menoscabar o 25 de Novembro de 1975.
Um saudosista do PREC que nunca conheceu nem viveu em ditadura ou para lá da cortina de Leste e nascido por alturas da queda do Muro de Berlim, deputado da nação e militante de um partido que é apoiante, entre vários outros devaneios, de regimes autoritários e autocráticos onde a violência do Estado se exerce indistintamente contra homens e mulheres, e normalmente contra o seu povo, referiu na sua conta de Twitter que “a única coisa que vale a pena assinalar no 25 de Novembro é a luta pela erradicação da violência contra as mulheres”.
É fácil defender aberrações destas quando se nasceu em 1985, numa democracia liberal plural, onde homens houve que deram a vida para que houvesse a liberdade, hoje, de se dizer o que se quiser, inclusivamente parvoíces ingratas e alucinadas deste jaez.
A coerência, tal como a virgindade, quando se perde, já não volta, e neste caso muito específico é absolutamente extraordinário que Moisés Ferreira e a inefável Catarina – com o seu costumado ar de grande dramatismo – tenham saído à rua indignados com a violência contra as mulheres – que advogam ser o único importante desígnio deste dia – e, muito curiosamente, não deixem de ser ao mesmo tempo e também, sem qualquer engulho ou vergonha – provavelmente nem deram por isso –, os porta-estandartes dos interesses dos defensores da xaria com tudo o que isso implica, nomeadamente (muita) violência patriarcal e tóxica sobre as mulheres (dos outros) em vez delas, o que pode explicar muito dessa posição.
É, pois, do foro do delírio profundo que estes abencerragens abracem a causa do islão e, ao mesmo tempo, saiam à rua a vociferar contra a justiça e a favor dos direitos das mulheres, luta que dizem ser a única que interessa e a mais importante por oposição à outra com a mesma data, isto quando há 40 e tal anos se discutiu na rua a eliminação de todos os direitos dos homens e das mulheres, à mão do COPCON e dos seus mandados de detenção arbitrários e em branco, e toda aquela variedade sortida de atropelos aos direitos patrimoniais, políticos, religiosos, económicos servidos de chofre, de quem já caminha para uma ditadura de extrema-esquerda com os paraquedistas na rua para tomar de assalto o país e criar aqui uma nova república socialista (daquelas que estes aplaudem – mas só às vezes – de Cuba à Venezuela e outros locais exóticos onde se vivem dias de enorme felicidade e prosperidade, sobretudo para os Castros e Maduros da vida).
Faz parte da enorme ignorância que é própria de quem recebeu a liberdade já feita e consolidada esta visão romântica e branqueadora de que tudo no PREC eram liberdades revolucionárias e o eclodir de direitos sociais, políticos e outras liberdades infinitas dos amanhãs que iam cantar e que os malandros dos comandos (naturalmente fascistas) interromperam.
É o revisionismo no seu expoente mais doentio e perigoso.
E Moisés e Catarina têm, por isso, aquelas saudades desse futuro que acham que lhes foi abortado em 75 (ainda que a ideia de ter sido um aborto logo se lhes torne agridoce) e que lhes roubou a sua merecida Albânia à beira-mar plantada, e será por isso que porfiam, dia após dia e ano após ano, como é muito evidente, para transformar o país que os comandos salvaram em 75 na próxima Venezuela, onde aspiram a um paraíso dos “camarados” repleto de cada vez mais pobres clientelares e dependentes do Estado, mas livres de mudar de sexo e cheios de ideologia de género, enquanto os Che Guevaras de pacotilha, sanguinários como o seu ídolo, fazem os números dos Robles da vida agindo em diametral oposição aos princípios que advogam e são sustentados pelas negociatas à mesa do poder e pelo crescente e insuportável confisco fiscal.
Felizmente não o conseguiram então e aos comandos o devemos.
Já ao que fez Costa, cujo partido esqueceu os heróis da democracia, a seu tempo se terá de pedir contas por ter aberto de novo a caixa de Pandora dos insurrectos de 1975 que foram derrotados pelos democratas.
Que um bando de “idiotos” revisionistas da história e negacionistas do socialismo real, e já agora nascidos na democracia liberal que o 25 de Novembro de 1975 lhes permitiu, faça afirmações tão absolutamente imbecis é próprio do grau de fanatismo que nunca esconderam e está em linha com as narrativas que convertem confessos assassinos políticos em assaltantes gentis com armas de brincar e outras parvoíces do foro da vergonha alheia com que amiúde se saem.
Mas ao resto do país e dos moderados de 75 pedia-se muito mais. É impossível que tantos se calem, cúmplices no silêncio e confortáveis com os saneamentos políticos que o exército faz a quem invoca a memória dos heróis que permitiram que hoje tenhamos (por enquanto) uma democracia liberal e plural.
Os toques totalitários estão por todo o lado e a verdade é que a garantia da manutenção da liberdade é nunca esquecer o que custou ganhá-la nem tê-la nunca como certa.
Ser livre, por estes dias, é uma luta diária contra o pensamento único e as novas formas de fascismo de que os extremados são tão devotos.
Por isso, na semana em que tantos que tanto vos devem vos esquecem, o meu texto não pode deixar de ser o testemunho do meu sincero e penhorado reconhecimento aos vencedores do 25 de Novembro, por terem saído à rua contra a extrema-esquerda e a terem vencido.
Obrigado, por isso, pela Liberdade que garantiram.
Advogado na norma8advogados
pf@norma8.pt
Escreve à quinta-feira, sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990