O Brasil vivia uma crise política no rescaldo do impeachment à antiga presidente Dilma Rousseff quando recebeu os Jogos Olímpicos de 2016. Todos os dias protestos invadiam as ruas, fosse contra a organização dos Jogos ou contra o presidente Michel Temer. Em relação aos Jogos, as críticas focavam-se no investimento brutal em infraestruturas, como estádios e a própria cidade olímpica, enquanto o governo avançava com medidas de austeridade, cortando nos orçamentos para a educação e a saúde públicas. E daí foi um passo até surgirem críticas de exclusão social.
“Essa festa não foi feita para o povo, os eventos estão longe de onde vive a população pobre. Estou protestando pela precariedade de nossas escolas públicas e por nossos salários, que recebemos em prestações”, disse o prof. Guilherme Moreira Dias, de 38 anos, à AFP numa manifestação no Rio de Janeiro. “Estão fazendo as Olimpíadas em um momento que as pessoas estão passando muito mal. A Olimpíada é uma fachada, um show. Não representa a realidade do Brasil. Querem mostrar tudo lindo e perfeito”, denunciou Ricardo Parente, psicólogo de 59 anos, na mesma manifestação.
Receber os Jogos Olímpicos sempre foi um dos grandes objetivos da política externa brasileira sob os governos do antigo chefe de Estado Lula da Silva. Em 2007, nos Jogos Pan-Americanos, realizados no Rio de Janeiro, Lula afirmou que gostava de ver o Brasil receber tanto os Jogos como o Mundial de Futebol. E a verdade é que acabou por recebê-los nove anos depois. “Estamos começando uma nova era. As Olimpíadas somente aconteceram em países desenvolvidos. Com a realização do Pan no Brasil, queremos provar que podemos fazer igual ou até melhor que estes países ricos. No desporto, não podemos ficar a dever nada a ninguém”, disse o antigo presidente na abertura dos Jogos Pan-Americanos, o primeiro teste para novos passos.
Os Jogos Olímpicos do Rio duraram várias semanas e terminaram. Vitórias foram alcançadas e medalhas ganhas mas, apenas dois anos depois, muitas das infraestruturas estão abandonadas e a austeridade não dá sinais de abrandar no país. A cidade olímpica foi considerada “inabitável”; o Estádio do Maracanã, onde se realizou o torneio de futebol, continua sem qualquer uso e foi vandalizado; as piscinas olímpicas estão sem água e sem manutenção; e a baía de Guanabara continua poluída, ao contrário do prometido pela candidatura brasileira, que previa reduzir a poluição até 80%.
E se os Jogos poderiam ter deixado como legado instalações e equipamentos, a verdade é que assim não foi. Há exceções, como o Velódromo do Parque Olímpico da Barra, que serve para treino de atletas, mas a maioria está deserta. “Há a acusação de que não estão a ser devidamente utilizadas e capitalizadas. Na verdade, são infraestruturas de uma dimensão tão grande que, obviamente, não podem ter um uso diário”, disse Paulo Wanderley Teixeira, presidente do Comité Olímpico do Brasil, em entrevista à Lusa, quando questionado sobre as instalações desaproveitadas. “A utilização e manutenção destas infraestruturas não é responsabilidade do comité olímpico, mas sim do governo federal, do governo do estado do Rio de Janeiro e do governo da prefeitura do Rio de Janeiro”, concluiu.