O ex-presidente do Sporting e o líder da Juve Leo Nuno Mendes, conhecido como Mustafá, não começaram ontem a ser inquiridos pelo juiz de instrução criminal, contrariamente ao que estava agendado. A meio da tarde, os trabalhos foram interrompidos devido à greve dos funcionários judiciais, tendo os arguidos sido apenas identificados e tido acesso ao despacho de indiciação, ou seja, à descrição de todas as suspeitas que sobre ambos recaem.
Enquanto os dois suspeitos das agressões à academia de Alcochete, em 15 de maio, estiveram dentro do Tribunal do Barreiro, no exterior, dezenas de pessoas mostravam o seu apoio a Bruno de Carvalho, entoando cânticos como “Bruno, amigo, os leais estão contigo” e levantando cachecóis com a mensagem “Força Bruno”. Durante a manhã houve ainda tempo para insultarem os jornalistas que se encontravam no local e equipas adversárias do Sporting.
Os insultos – e uma investida sobre a barreira de segurança – levaram a que as autoridades identificassem algumas destas pessoas.
A carta-branca de Bruno de Carvalho Os investigadores acreditam que dois dias antes do ataque, após a derrota do Sporting na Madeira, Mustafá terá dito a Bruno Jacinto – funcionário que fazia a ponte com os adeptos e as claques e que foi detido há algumas semanas – que ia haver um ataque, dando a entender que já havia carta- -branca para isso. À chegada a Lisboa, Bruno Jacinto terá decidido falar com André Geraldes, antigo team manager do Sporting, sobre a informação que tinha tido.
Segundo o “CM”, outro dos detalhes que é visto pela investigação como suspeito é a alteração da hora do treino em Alcochete, no dia 15 de maio, das 10h para as 17h – altura em que aconteceu a invasão.
O Ministério Público quer ouvir mais testemunhas, sendo Jorge Jesus uma das principais, dado que não só estava no local onde tudo aconteceu como tinha acesso a outras informações privilegiadas do Sporting. Mas o treinador já informou que só pode regressar da Arábia Saudita em dezembro. Segundo o “Expresso”, a procuradora Cândida Vilar terá entretanto pedido ao juiz Carlos Delca para alargar os prazos da investigação, não só pela necessidade de ouvir Jesus, cujo testemunho é “absolutamente essencial”, mas também devido ao “estado atrasadíssimo das perícias”.
A relação suspeita com a Juve Leo Segundo foi ontem denunciado por Vítor Ferreira, antigo vice-presidente do conselho diretivo do Sporting e administrador da SAD do Sporting, na TVI24, Bruno Carvalho quis implementar um pagamento mensal de 15 mil euros à Juve Leo para a ter debaixo do seu controlo.
Tudo terá acontecido no primeiro mandato e Vítor Ferreira – que viria a demitir-se em 2015 – opôs-se à intenção do então presidente, defendendo que os pagamentos deveriam ser feitos apenas mediante a apresentação de faturas.
O ex-vice-presidente do conselho diretivo do Sporting deixou de ser consultado a partir desse momento sempre que o assunto era claques, dizendo agora que desconhece se a ideia inicial de Bruno de Carvalho foi ou não para a frente nesses termos.
“Conhecendo eu a pessoa que é o ex-presidente do Sporting, não acredito que uma claque tivesse iniciativa própria de fazer o que fez. Ele comandava tudo no clube, até a claque. Ele subsidiava a claque, que dependia dele. Não acredito que nenhum indivíduo da claque tivesse a ousadia de ter a iniciativa deste ato criminoso. Tinha de estar escudado em alguém com mais poder. E quem é que podia ser esse alguém? Estou a fazer uma conjetura normal, não estou a acusar ninguém, mas é a conclusão a que uma pessoa normal chega.”
Segundo foi ontem noticiado, por diversas vezes, enquanto presidente, Bruno de Carvalho não terá escondido o ascendente que tinha sobre a claque, chegando a afirmar que quem mandava na Juve Leo era ele.
O Ministério Público quer por isso que Bruno de Carvalho fique em prisão preventiva, cabendo agora ao juiz determinar qual a medida de coação adequada.
O regresso à cela de Alcochete Ontem, após ter havido acesso ao despacho de indiciação, foi determinado que o interrogatório teria de transitar para o dia de hoje, para os advogados terem tempo e porque os funcionários judiciais estavam em greve – hoje também, mas estão garantidos os serviços mínimos.
Numa nota enviada, o Tribunal do Barreiro esclareceu que “tendo em conta os inúmeros documentos cuja consulta os Ilustres Defensores dos arguidos solicitaram, não foi possível reiniciar a diligência na altura aprazada, 14h30 horas, tendo só pelas 15h45 horas sido possível entregar àqueles Defensores, para apreciação, as cópias dos documentos solicitadas”.
E o atraso levou a que os trabalhos continuassem na manhã de hoje: “Tendo em conta que os Ilustres Defensores dos arguidos ainda têm de analisar todos os documentos agora fornecidos e que a greve parcial dos senhores funcionários judiciais se reiniciará pelas 16h00 horas, e ainda que os dois funcionários deste Juízo de Instrução Criminal aderiram à mesma, voltaram a suspender-se os trabalhos que se retomarão, amanhã [hoje], pelas 10h00.”
O facto de os arguidos apenas terem sido identificados dentro do prazo de 48 horas que têm para se apresentar ao juiz foi ontem criticado por alguns especialistas, que acusam o tribunal de não estar a cumprir os prazos da lei. Outros advogados defendem, porém, que se não fosse assim, a defesa não teria tempo para estudar o processo.
Poucos minutos depois do comunicado do tribunal, Bruno de Carvalho e Mustafá abandonaram as instalações, debaixo de grandes medidas de segurança, tendo o primeiro sido transportado para a GNR de Alcochete e o segundo para a do Montijo.