Portugal-Polónia. Os homens dos nomes estranhos gostaram da tempestade

Portugal-Polónia. Os homens dos nomes estranhos gostaram da tempestade


A primeira vez que a seleção nacional enfrentou os polacos foi derrotada de uma forma tão límpida que não levantou argumentos. Nas Antas dizia-se adeus ao Mundial da Argentina logo no início da qualificação


A Polónia que hoje recebe Portugal em mais uma jornada da nova Liga das Nações teve o momento mais brilhante da sua história como seleção entre 1972 e 1986. Foram 14 anos de alegrias para adeptos que nunca tinham tido verdadeiras razões para festejos. Ao vencer o torneio de futebol dos Jogos Olímpicos de Munique em 1972 – recorde-se que, nesse tempo, os jogadores dos países de Leste não assumiam o estatuto de profissionais –, gente como Kaziemiers Deyna, Grzegorgz Lato, Robert Gadocha ou Antoni Szymanowski começaram a atrapalhar as línguas dos apaixonados pelo jogo na simples tentativa de os reproduzir em conversas de café. E valia a pena decorar esses nomes.

Na fase de apuramento para o Campeonato do Mundo de 1974, os polacos voltavam à ribalta, deixando pelo caminho a Inglaterra e qualificando-se pela primeira vez para um Mundial. Prova no qual fariam figura, batendo a Argentina (3-2), o Haiti (7-0) e a Itália (2-1), na fase inicial de grupos, a Suécia (1-0) e a Jugoslávia (2-1), na segunda fase de grupos, para serem afastados da final pela RFA (0-1). A vitória sobre o Brasil (1-0) garantiu-lhes um extraordinário terceiro lugar.

Foi precisamente essa equipa que surgiu no caminho de Portugal no dia 16 de outubro de 1976, no Estádio das Antas. Chovia que Deus a dava. Nunca até então portugueses e polacos tinham estado frente a frente. Quem arrostou a tempestade para ver Zmuda, Kasperczak, Deyna, Lato, Sazarmach e o jovem Boniek não deu o seu tempo por perdido. A superioridade foi tão avassaladora que se tornou incomodativa.

Portugal não podia queixar-se da qualidade técnica dos seus selecionados. Repare-se no onze que entrou em campo: Bento; Artur, Rui Rodrigues, Freitas e Pietra; Octávio, Alves e Toni; Nené, Manuel Fernandes e António Oliveira.

Mas os resultados, que miséria!

Desde 14 de novembro de 1973, duas vitórias oficiais apenas: ambas frente a Chipre.

José Maria Pedroto tinha no currículo trabalho excelente no comando de Vitória de Setúbal e Boavista. Mas a seleção seria sempre o seu ponto fraco. Muito fraco.

Houve quem afirmasse que se tinha atingido o ponto zero do futebol de seleções. Houve quem pedisse uma vassourada urgente. Uma guerra surda entre o selecionador e certos dirigentes federativos e alguns dos jogadores de maior nomeada, como Damas, Fraguito, Jordão, Baltasar, Humberto Coelho ou Chalana, minava drasticamente o ambiente. O resultado acabou por ser lisonjeador, tal a superioridade dos polacos.

O grupo Num grupo com apenas quatro equipas (as outras foram a Dinamarca e Chipre), perder em casa contra o adversário mais capaz reduzia as possibilidades lusitanas a meros grãos de areia escorrendo por entre dedos abertos. Ainda por cima quando a diferença registada ao longo dos 90 minutos dessa noite inundada das Antas demonstrava cabalmente que Portugal não tinha lugar entre as equipas que disputariam a fase final do Mundial da Argentina, dois anos mais tarde.

Dois remates apenas, muito levezinhos, por sinal, de Manuel Fernandes e Alves não incomodaram minimamente Kukla. Lato, com a sua classe extraordinária, resolveria o assunto com golos aos 48 e 76 minutos.

Bento estreava-se na baliza nacional, mas deixou-se tomar pelo nervosismo: irritou-se com Deyna, que tentou ultrapassá-lo com uma finta, depois de surgir isolado, foi atrás dele na tentativa de o agredir, contou com a complacência do árbitro francês, Michel Katabijan.

A defesa polaca – assente em Rzesny, Zmuda, Rudy e Kasperczak – passava momentos de tranquilidade por entre os pingos de chuva grossa. João Alves procurava servir os seus avançados, mas tanto Nené como Manuel Fernandes eram demasiado frágeis para a oposição que tinham pela frente. António Oliveira, com o seu estilo serpenteante (quantos jogadores tiveram a sua capacidade de utilizar indiferentemente o pé esquerdo e o pé direito?!!!), cansava-se numa inglória luta individual. A lentidão de Rui Rodrigues e de Freitas facilitava a tarefa do bigodudo Szarmach e do esforçado Terlecki que, aos 76 minutos, daria a Zbigniew Boniek lugar para a primeira internacionalização daquele que não tardaria a transformar-se na nova coqueluche dos polacos.

A derrota portuguesa foi tão límpida como os olhos de Elizabeth Taylor. Não houve quem pudesse, por mais patriótico que fosse, negar a superioridade de um opositor que dominou todos os capítulos do jogo, justificando o que fizera no anterior campeonato do Mundo e no torneio dos Jogos Olímpicos de Montreal, dois meses antes – finalista vencido frente à Hungria. Mais uma vez, Portugal ficava pelo caminho. E sem dar luta.