Em queda. Fase negra de Ronaldo pode custar-lhe largos milhões

Em queda. Fase negra de Ronaldo pode custar-lhe largos milhões


Ser uma estrela à escala planetária trouxe-lhe o título de “herói nacional”. Mas o que levou muitos anos a construir pode levar muito pouco tempo a desaparecer


A acusação de violação que recai sobre Cristiano Ronaldo já fez mossa e as consequências podem ir muito mais longe do que se pensa. Ao conseguir transformar-se num ícone global, com uma popularidade sem paralelo no mundo do desporto, o futebolista português conseguiu fazer com que os rendimentos mais modestos fossem garantidos dentro das quatro linhas porque fora delas é que o craque conseguiu marcar verdadeiramente golo. Faturar 138 milhões em quatro anos parece impossível para muitos. Mas esta foi a soma conquistada recentemente pelo jogador apenas com contratos de imagem. Cristiano Ronaldo é há vários anos dos craques mais requisitados para campanhas publicitárias e o sucesso sempre se refletiu na sua conta bancária. O jogador ainda não tinha feito 30 anos e era já um fenómeno de popularidade quase sem precedentes, com mais de cem milhões de fãs nas redes sociais, e protagonista de uma autêntica disputa feita entre as principais marcas e agências publicitárias do mundo. 

Um estudo realizado pelo Gabinete de Estudos de Marketing para Desporto, do IPAM, mostrava, no ano passado, que o valor da marca Cristiano Ronaldo cresceu 77,5 milhões de euros desde 2011, atingindo um valor potencial de 102 milhões de euros. A métrica científica desenvolvida pelo IPAM, demonstrou ainda que Cristiano Ronaldo conseguiu alcançar o lugar de futebolista com maior notoriedade, nacional e internacional, atingindo 94 pontos numa escala de 0 a 100. 

No entanto, Daniel Sá, presidente executivo do IPAM – Instituto Português de Administração de Marketing, que “mede” a importância do futebolista há vários anos, diz que  a “marca CR7 está em risco de cair para metade”. E pior: de acordo com o especialista, quanto mais tempo demorar o processo, mais a marca desvalorizará. 

Uma eventual condenação judicial no caso de violação por que é acusado pode valer a Cristiano Ronaldo uma “queda abrupta” de 60 milhões de euros no valor da sua marca. E, mesmo que não exista sequer condenação, o risco de perdas continua a existir. Só o facto de se ficar a conhecer da acusação fez com que as ações da Juventus caíssem quase 10%. 

Segundo a agência de notícias francesa France Press, o título, que subiu desde a chegada do atacante português a Turim, em julho, fechou esta sexta-feira a perder 9,92%, para 1,19 euros, num mercado que registou uma queda de 1,29%. Aliás, pode mesmo dizer-se que, em apenas três dias, a Juventus já perdeu cerca de 300 milhões de euros, uma desvalorização de 21% em bolsa. Esta segunda-feira, as ações voltaram a cair, desta vez 2,92%, para os 1,165 euros. Ainda assim, importa referir que, apesar dos resultados menos positivos, a Juventus mantém uma valorização de mais 60% este ano devido à entrada de Cristiano Ronaldo.

Apesar de a maioria dos patrocinadores estar a optar por uma posição cautelosa, já muita tinta correu neste campo. A gigante Nike, por exemplo, afirmou estar “extremamente preocupada” com a acusação que é imputada a Cristiano Ronaldo e a EA Sports, detentora do jogo FIFA19, inicialmente decidiu retirar a imagem do jogador do seu site, mas recuou e voltou a publicá-la. Também a Jeep, um dos patrocinadores da Juventus, decidiu agir com algum cuidado. A marca realizou uma sessão fotográfica com alguns jogadores, mas CR7, ao contrário do que seria de esperar, não participou.

A verdade é que, fazendo as contas, Cristiano Ronaldo está associado a 18 marcas internacionais, a nível publicitário. Só o contrato vitalício que assinou com a Nike vale quase mil milhões de euros. E é também por isto que os danos reputacionais e a imagem já beliscada estão a preocupar tanto o jogador como os patrocinadores, que se mostram assustados. 

Além de todas estas contas que se fazem e refazem nos últimos tempos, existem também consequências a nível mental para o jogador. Ao i, Jorge Silvério, psicólogo desportivo, explica que “é o maior desafio de sempre. Até porque ele também tem família e essa é uma preocupação acrescida. Além disso, ele sabe que tem de manter um bom desempenho em campo. É muita pressão e não é fácil ter noção, porque estamos a falar de uma escala mundial”.

Quando o escândalo é inimigo da publicidade Doping, crimes, escândalos sexuais, acidentes ou até doenças. Basta um pequeno deslize para que os reis das campanhas publicitárias passem a bobos de uma corte feita de opinião pública. Quando são os patrocínios a financiar uma vida de luxo, a credibilidade vale mais do que se pensa. “Falem bem ou falem mal, mas falem de mim”: esta parece ser uma regra para muitos. Mas é uma regra que pode fazer perder muito dinheiro. No mundo da publicidade há um inimigo chamado escândalo e não falta quem possa contar uma história triste na primeira pessoa.

Um dos casos recentes foi protagonizado por Kevin Spacey. Em poucas horas, o ator passou de uma das figuras mais respeitadas do mundo do cinema, teatro e televisão a protagonista de acusações de assédio sexual. A Netflix, que contava com o ator, suspendeu logo os seus serviços. Também a empresa de publicidade CAA se apressou a dizer que tinha dispensado o ator. Mas existem outros escândalos que mostram como é fácil perder milhões de euros em muito pouco tempo. Tiger Woods é um bom exemplo. Tudo começou quando um tabloide revelou uma das relações extraconjugais de Tiger Woods. A partir daí, os casos de infidelidade sucederam-se em catadupa: foram várias as mulheres a admitir terem tido relacionamentos com o golfista enquanto este era casado com a modelo sueca Elin Nordegren. A Gillette suspendeu os anúncios televisivos em que o golfista assumia o papel principal e foram várias as marcas que optaram igualmente por cortar o vínculo profissional. A empresa de telecomunicações AT&T e a consultora Accenture são apenas dois exemplos. A verdade é que de nada valeu a Woods estar no auge da carreira e ser apontado como um dos melhores golfistas de todos os tempos. A vida pessoal fez dele protagonista de um escândalo sexual e as marcas não hesitaram no momento de lhe virar as costas.

E não é preciso ir tão longe para perceber as consequências de uma imagem beliscada para os patrocinadores. Outro caso paradigmático é o de Lance Armstrong. A Nike foi a primeira a romper com o ciclista, mas rapidamente se seguiram outras. Acabaram por ser mais sete. Depois de ter sido divulgado que o ciclista consumiu substâncias ilegais durante grande parte da sua carreira, perdeu milhões de euros em patrocínios. A Nike deixou até de financiar a Fundação Livestrong, criada pelo ciclista.

Recorde-se que entretanto foi divulgado o acordo assinado em 2010 entre o Cristiano Ronaldo e a alegada vítima de violação. O acordo data de 12 de janeiro de 2010, sete meses após os acontecimentos e previa o silêncio de Kathryn Mayorga em troca de 375 mil dólares.