As notícias sobre o estado da mobilidade no mundo vão surgindo e em países como o Reino Unido, Índia e Noruega, ou cidades como Paris, Oxford, Madrid e Singapura, só para citar alguns casos, as barreiras ou mesmo proibição de circulação de automóveis a combustão parecem ter data marcada. Um novo paradigma da mobilidade está a surgir. Quais as razões para estas novas tendências?
Por um lado, uma necessidade comandada pelas evidentes alterações climáticas e pelo seu impacto na qualidade de vida das populações. Por outro, a crescente sensibilização das populações para as questões de natureza ambiental.
Nos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável), documento assinado na esteira do Acordo de Paris (dezembro de 2015), é clara a preocupação quanto ao desenvolvimento de políticas de mobilidade mais limpas e amigáveis para o meio ambiente. Não deixa de ser curioso que se trata de um documento surgido após reconhecimento do falhanço dos objetivos do milénio, fixados pela ONU em 2000, reforçando os ODS o enfoque das questões ambientais para o nível da responsabilidade social dos cidadãos.
Percebe-se que a indústria do automóvel não pode ficar indiferente às pressões exercidas. De facto, ela tem reagido adaptando-se às novas tendências, exigências e dinâmicas sociais que a este respeito se consolidam. Para aqueles que julgam que estas novas tendências são conduzidas pelos interesses da indústria automóvel em explorar novas oportunidades de negócio, sempre se poderá dizer que o grande negócio daquela indústria seria, certamente, continuar no mesmo registo de sempre, sem a necessidade de mudanças estruturais e de paradigma.
A adaptação da indústria automóvel ao novo contexto são já hoje evidentes. Quando se analisam os planos estratégicos das grandes construtoras, há duas apostas que são comuns a todas elas e que importa aqui referir: a mobilidade elétrica e a mobilidade partilhada (deixo aqui de fora a mobilidade autónoma).
A conversão mais acelerada da indústria automóvel à mobilidade elétrica surge depois de ter vindo a público a manipulação das emissões por parte dos principais construtores europeus. Na verdade, ela é vista como forma de reganhar a confiança dos consumidores. Já a mobilidade partilhada surge como resposta à dificuldade em acomodar a enorme massa de veículos resultantes de movimentos pendulares crescentes. Trata-se de uma forma de mobilidade em crescimento, facilitada pelo facto de a grande maioria da juventude atribuir mais importância ao valor de uso que ao valor de posse do automóvel. Para os mais novos o automóvel parece ter deixado de ser sinónimo de estatuto.
Para aferir as vantagens da mobilidade partilhada, refira-se que os seus custos comparam com os custos do automóvel individual, cuja aquisição é feita para que permaneça, em média, 90% do dia estacionado. Para as cidades, os veículos de partilha são naturalmente benéficos, especialmente se estiverem associados à mobilidade elétrica/limpa. Por outro lado, sendo veículos em constante circulação, libertarão espaço de estacionamento para fruição pública que, noutras circunstância, estaria permanentemente ocupado.
O futuro da mobilidade passará também pelo desenvolvimento de plataformas em que todas as modalidades de transporte estarão representadas: transportes públicos e respetiva bilhética; transportes privados de passageiros; veículos partilhados; scooters e bicicletas partilhadas, entre outros modos inovadores.
No limite fala-se na existência de serviços de mobilidade com disponibilidade permanente, mediante um pagamento mensal. Pagaríamos a mobilidade como pagamos hoje a eletricidade ou a água que consumimos, com outros a providenciarem os meios para que possamos mover–nos no território.
Da multimodalidade oferecida fará parte o transporte público. Mas o transporte público será sempre mais um modo de transporte entre os outros e que concorrerá, na prática, de acordo com as condições objetivas (conforto, velocidade comercial).
*Presidente da EMEL