Ricardo Lorenzo Rodríguez nasceu em Montevideu, Uruguai, mas cedo emigrou para a Argentina. Foi jornalista da Editorial Atlántida e escrevia sob o pseudónimo de Borocotó, uma onomatopeia que foi buscar ao ritmo do candombe, de origem africana e muito difundido na América do Sul. No dia 21 de setembro de 1941 estava em Avellaneda para reportar para “El Gráfico” o encontro entre o Independiente e o River Plate. Nesse dia, o treinador Renato Cesarini resolveu fazer alterações profundas na equipa do River. Cesarini era um dândi, fora um jogador criativo, internacional tanto pela Argentina como pela Itália, e gostava de se exibir como filósofo: “O mais parecido com a vida? Um campo de futebol: nele, todos são personagens.”
Mas a vida não lhe corria a contento. Responsável pela equipa desde 1939, estava a contas com uma sublevação dos jogadores por via do castigo imposto pela direção ao astro José Manuel Moreno, que passava por uma fase complicada da carreira. Foi apresentando alguns elementos mais novos, mas os resultados não apareciam. Pelo caminho ia descobrindo estrelas incandescentes: Juan Carlos Muñoz e Ángel Labruna. E apostava em colocar Adolfo Pedernera como avançado-centro. La Máquina estava quase a pôr-se em marcha. Faltava ainda Loustau, que iria surgir no ano seguinte.
“Quantos homens há no mundo capazes de ver um jogador, encontrar-lhe defeitos e corrigi-los? Só eu!” A modéstia não fazia, definitivamente, parte das virtudes de Cesarini. Seja como for, sobreviveu ao tormento de Avellaneda. E Borocotó destacou: “Jugaram como una máquina!” O nome ficou. E tornou-se mais do que uma questão de resultados: “Desde entonces, el juego quedó emparentado con la belleza. River se erigió en defensor de ese estilo.”
O River Plate passou a ser, em todo o lado, La Máquina. Di Stéfano, que chegaria ao clube três anos mais tarde, não teve dúvidas em considerá-lo a melhor equipa de sempre. Já ninguém se recordava que um dos seus fundadores, Pedro Martínez, encontrara o nome numas enormes caixas de madeira carregadas de garrafas de uísque escocês no porto de Buenos Aires: River Plate Whisky.
Compromisso Em 1945, Cesarini já tinha partido. É com José María Minella no comando que o River Plate conquista o campeonato a uma jornada do fim, num jogo frente ao Chacarita. Equipa impressionante. Só do meio-campo para a frente contava com os infatigáveis Alberto Gallo, Nestor Rossi e Juan Carlos Muñoz, o faminto Ángel Labruna, rei do golo, o vertiginoso Felix Loustau (El Chaplin), a flecha Alfredo Di Stéfano, o cérebro Adolfo Pedernera e Luis Deambrossi, pau para toda a obra.
Curiosamente, todos eles estavam demasiado comprometidos com o seu elegante futebol ofensivo para terem como primeira preocupação o resultado. A teia de passes e repasses, de fintas e contrafintas ia-se desenrolando na direção da baliza contrária e teria sempre como compensação o golo, mas mostrava-se frágil em termos defensivos. Além disso, os golos também não jorravam como água das fontes porque o arrebique era mais apreciado do que a conclusão fácil. Não tardou que La Máquina fosse cada vez menos máquina de destroçar adversários e passasse a máquina de costura, cerzindo bordados.
As vitórias por diferenças curtas eram a nova realidade. A supremacia estilista era impressionante mas, após o triunfo no campeonato argentino de 1945, o River Plate deixou-se bater, no ano seguinte pelo San Lorenzo de Almagro. Ganharam o apodo de Los Caballeros de la Angustia por causa do sofrimento que provocavam nos hinchas, encantados com o seu refinamento técnico mas ansiosos por vitórias que não lhes pusessem à prova o coração.