A terceira cimeira intercoreana ainda não tem data acertada. A proposta feita pela Coreia do Sul esta semana é a de que possa acontecer entre 18 e 20 de setembro em Pyongyang. Mesmo assim, nem Kim Jong-un nem Moon Jae-in acederam ao convite do homólogo russo, Vladimir Putin, para estarem presentes no Eastern Economic Forum que ontem começou e amanhã termina em Vladivostoque, no leste da Rússia.
Para Moscovo, o fórum que iria garantir um papel importante da Rússia na atual conjuntura política do Extremo Oriente perde fulgor, tendo em conta a ausência dos protagonistas da negociação diplomática de maior importância da região. Putin parecia estar a contar mover as suas pedras e ganhar algum protagonismo, aproveitando a deterioração da relação entre a Coreia do Norte e os Estados Unidos nas últimas semanas, tendo em conta a falta de avanços depois da cimeira Trump-Kim de junho, em Singapura – o convite de Kim a Trump para uma nova cimeira veio desanuviar um pouco o clima, como se pode ver no texto a seguir.
O convite do presidente russo ao líder norte-coreano foi entregue em mão pelo ministro russo dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, na sua visita a Pyongyang no final de maio, e confirmado por Putin em junho. Kim nunca chegou a responder. “O convite está em aberto. Foi confirmado várias vezes”, disse recentemente o conselheiro do presidente russo Yuri Ushakov ao “Izvestia”.
No entanto, não estando Moon Jae-in, está o primeiro-ministro Lee Nak-yeon, que vai incumbido da tarefa de discutir com Putin o aprofundamento da relação entre os dois países, bem como uma cooperação mais intensa, nomeadamente na questão das negociações de paz para a península da Coreia.
Sem os dois líderes coreanos, a iniciativa de Putin perdeu parte da sua importância, pois não permite a Moscovo conseguir maior protagonismo no mais importante assunto diplomático da região. Seja como for, mesmo sem o tema Coreia em cima da mesa, a Rússia preparou o maior exercício militar do país dos últimos 40 anos para coincidir com o fórum de Vladivostoque (ver texto ao lado): envolve 300 mil militares, mil aviões, duas esquadras navais e forças aerotransportadas, a que se juntam ainda militares da Mongólia (o presidente Khaltmaa Battulga também estará no fórum) e da China – esta envia um contingente de 3200 soldados, 30 helicópteros e caças e mais de 900 peças de equipamento militar.
Xi Jinping, o presidente chinês, está presente em Vladivostoque, tal como o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, que ficou muito preocupado com a dimensão dos jogos de guerra entre russos, chineses e mongóis. O líder do governo nipónico marcou encontros bilaterais (com Xi e com Putin) marcados paralelamente à cimeira, que decorre nas instalações da Universidade Federal do Extremo Oriente, na ilha de Russky.
O Japão está interessado em discutir com a Rússia a questão da soberania dos seus Territórios do Norte, nome que dá às quatro ilhas russas das Curilas do Sul, e assinar um tratado de paz, como avançou o próprio primeiro-ministro japonês. Sinal da importância diplomática da iniciativa é o facto de Shinzo Abe manter a sua viagem à Rússia apesar do violento sismo que atingiu Hocaido.
Jogos de guerra para mostrar o atual poderio militar russo
Da Sibéria ao Mediterrâneo, a Rússia começou ontem a exibir todo o seu poderio militar com o maior exercício dos últimos 40 anos. Seria preciso recuar à União Soviética e à Guerra Fria para lembrar tamanha mostra de força bélica ordenada a partir de Moscovo (e, mesmo assim, este é duas vezes maior). Junto com os 300 mil russos envolvidos, há ainda mais de três mil soldados chineses (e também mongóis).
Vladimir Putin – que ontem se encontrou com o seu homólogo chinês, Xi Jinping, à margem do fórum de Vladivostoque – tinha agendado passar pelo comando operacional destes jogos de guerra para observar mais de perto as suas forças em ação.
Moscovo quer estar preparada para “uma guerra em larga escala” e testar as suas forças, além de exibir a todo o mundo – numa altura em que o país foi sancionado pela sua ingerência nas eleições presidenciais norte-americanas de 2016 e pelo envenenamento do antigo espião britânico Sergei Skripal e da sua filha Yulia no Reino Unido – uma capacidade militar que não pode ser encarada de ânimo leve. A hipótese de um conflito com o Ocidente não é posta de lado no Kremlin, tendo em conta o grau de hostilidade para com o país no palco internacional desde a anexação do território ucraniano da Crimeia, em 2014.
Dmitri Peskov, porta-voz de Putin, afirmou que os exercícios militares se “justificam” tendo em conta “a atual situação internacional” e as atitudes “agressivas e hostis” por parte de certos países para com o governo russo.