Verdes são os montes…


Fruto das inegáveis alterações climáticas, nos países do norte estão a registar-se improváveis altas temperaturas – e as consequências estão à vista


No fim da semana passada estourou a notícia de alegado desvio de fundos para a reconstrução das casas ardidas em Pedrógão Grande. Entretanto, a Procuradoria-Geral da República confirmou a existência de inquérito dirigido pelo Ministério Público. E a justiceira líder do CDS veio exigir um rápido esclarecimento do governo, em linha com o que vem sendo a recorrente mal-intencionada invocação da tragédia de 2017 que, aliás, tem ocupado muitas mentes, tortuosas, e tem feito correr muita tinta.

Obviamente, e sem quaisquer hesitações ou encobrimentos, a suspeição tem de ser elidida, a bem da seriedade do processo. E pelo respeito que é devido a quem sofreu o pungente drama dos fogos e do seu cortejo de desgraças. Sem hipocrisia.

Estranhamente, ou talvez não, notícias sobre os incêndios que têm ocorrido no norte da Europa – Portugal interveio na disponibilização de meios para combate aos fogos na Suécia, no âmbito do Mecanismo Europeu de Proteção Civil – são por demais escassas. Fruto das inegáveis alterações climáticas, nos países do norte estão a registar-se improváveis altas temperaturas – e as consequências estão à vista –, enquanto, no sul, o verão anda a fazer fitas, ora quente de sufocar, ora com trejeitos outonais e frio.

Dos incêndios, se Portugal tem triste história, a Espanha tem enfrentado flagelo semelhante, independentemente das políticas florestais que por lá possam ter sido mais responsáveis. Lá como cá, há nichos ambientais de cartaz: o Parque Nacional da Peneda-Gerês, associado ao verde Minho; a “Espanha Verde”, associando sítios ecológicos da Galiza, Astúrias, Cantábria e País Basco.

Assim, a proposta é atravessar os montes Cantábricos, saindo de Santillana del Mar, vila medieval, e apenas pedonal, na costa do mar Cantábrico, embora ligeiramente interior – dizem os espanhóis que é a das três mentiras: “Ni es santa, ni llana, ni tiene mar.” Verdade, mas é linda! Começando a subir as ruelas empedradas até ao belo edifício românico da Colegiada de Santa Juliana, o olhar detém-se, embasbacado, nas casas avarandadas, nos palácios, nos espetaculares brasões, nos pormenores das janelas, das portas, e até das aldrabas! Tudo está refinadamente cuidado! A juntar, um autêntico esparrame de flores nas fachadas – gerânios e petúnias berrantemente coloridos –, pois tudo serve para “envasar”: vasos, floreiras, potes, bidões, cestos… Apesar dos vagares a que somos forçados, o périplo dura uma hora, se tanto. Santillana del Mar é uma pequena e fabulosa joia preciosa.

A cordilheira Cantábrica, paralela ao mar, pode dizer-se que corre desde os Picos da Europa até às faldas dos Pirenéus. Zona de grande altitude e elevado grau de humidade, desdobra-se em territórios de incrível diversidade orográfica, geológica, faunística e florística. Percorrendo a mítica N-623, a paisagem envolvente é arrebatadora. Sob a vigilância de cumes nevados – lençóis de neve, reluzindo ao sol, espalhados ao acaso –, as montanhas sucedem-se em explosões de verde, como que totalmente alcatifadas de musgo tenro – da cor verde das feteiras, tão vulgares no Minho –, semelhantes a dunas gigantes de pastagens, em vez de areia. É abundante o gado que enxameia as encostas. São imponentes as aves que cruzam os céus. E aqui não há peladas dos incêndios.

 

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