A presidente da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) garantiu que mais de 85% da produção de eletricidade em Portugal “tem algum tipo de subsídio”, considerando haver “uma alocação ineficiente de recursos” com uma “sobrecompensação paga pelos consumidores”, revelou ontem na comissão parlamentar de inquérito às rendas excessivas da energia. Face a este cenário, Maria Cristina Portugal garante que “é muito difícil dizer que já chegámos verdadeiramente a um mercado liberalizado ao nível da produção de eletricidade”.
A responsável trouxe algumas das conclusões preliminares de um estudo que a está a ser feito pelo regulador por sua iniciativa – e que espera “libertar muito em breve”, não se querendo comprometer com timing, mas seguramente durante este verão – “para determinar os custos nivelados de produção de energia elétrica por segmentos representativos de produtores (tecnologias, regime remuneratório) e/ou a sua rentabilidade (TIR), considerando os apoios aos produtores”.
“Os resultados preliminares são que os atuais instrumentos (mercado e administrativos) discriminam algumas tecnologias, discriminam entre oferta e a procura, sobrecompensam algumas tecnologias e subcompensam outras tecnologias. Há uma alocação ineficiente de recursos com uma sobrecompensação paga pelos consumidores”, adiantou aos deputados.
A responsável apontou ainda o dedo à atuação política ao lembrar que, em alguns assuntos, a ERSE foi fazendo sistematicamente alertas e “há um timing de reação que não foi sempre aquele que devia ter sido”, disse.
Custos para os portugueses A presidente da ERSE voltou a lembrar o impacto que os contratos de custos de manutenção do equilíbrio contratual (CMEC) têm para os contribuintes são na ordem dos 510 milhões de euros desde 2007 – um número que já tinha sido avançado pelo regulador em setembro, mas, no parlamento, Maria Cristina Portugal garante que esta quantia surge da “aplicação cega e acrítica daquilo que é a determinação legal de umas fórmulas matemáticas que talvez não tenham sido totalmente percebidas na altura em que foram aplicadas”.
Na altura, a elétrica portuguesa disse que “não encontrava qualquer fundamento para a alegada sobrecompensação de 510 milhões de euros referida no relatório da ERSE”, acrescentando ainda que dispunha “de estudos elaborados por entidades independentes, com reputação internacional, que demonstram que o regime dos CMEC se traduziu numa redução material dos custos a suportar pelos consumidores, face ao que suportariam em regime CAE”.
Estas conclusões chegaram a levar a EDP a reclamar o acesso integral ao estudo para “contribuir para esclarecimento do diferencial” – um pedido que chegou a ser recusado pelo regulador mas que foi aceite pelo tribunal.
Em causa estavam 16 centrais híbridas da EDP que vão permanecer no regime dos CMEC, que termina em 2027, além da central de Sines, cujo contrato terminou a 31 de dezembro de 2017, mas que pesava 11% do valor total a pagar.
Estas alterações resultaram de uma imposição da Comissão Europeia, em 2004, durante o governo de Durão Barroso – era Carlos Tavares, que veio posteriormente a ocupar a presidência da CMVM e está a atualmente a presidir à Caixa Económica Montepio Geral, o ministro da Economia -, mas foram postas em marcha em 2007, pelo ex-ministro da Economia Manuel Pinho, durante o governo de José Sócrates. O despacho 15290/2007 foi assinado no dia 15 de junho de 2007, ou seja, precisamente no mesmo dia em que a EDP e a REN assinaram os acordos de cessação dos CAE para que o novo sistema de compensação (CMEC) entrasse em vigor no dia 1 de julho desse mesmo ano.
Este timing é posto em causa pelo parecer do Núcleo de Assessoria Técnica (NAT) da Procuradoria-Geral da República, assinado por Sérgio Machado, tal como o i já avançou. “Suspeita–se aqui a coincidência da data da celebração das adendas e da sua aprovação ministerial, o que indicia a participação direta ou muito próxima do ministro no processo administrativo em causa”, pode ler-se no documento da investigação.