Álvaro Beleza. “O setor privado da saúde é às vezes parasita do sistema público”

Álvaro Beleza. “O setor privado da saúde é às vezes parasita do sistema público”


Um dos homens do antigo segurismo acredita que a nova lei de bases da saúde honrará o legado de Arnaut e João Semedo


Álvaro Beleza, diretor do Serviço de Imuno-Hematologia do Hospital de Santa Maria, define-se como um “socialista liberal” e é habitualmente associado à ala direita do PS. Mas, curiosamente, em matérias de saúde, educação e segurança social acredita que os acordos só se devem fazer com a esquerda. Defende a lei de bases da saúde proposta por António Arnaut e João Semedo, que está na comissão especializada do parlamento à espera que chegue o projeto do governo, cujo desenho foi entregue a Maria de Belém. João Semedo, o dirigente do Bloco de Esquerda falecido esta semana, e António Arnaut, o histórico socialista que criou o Serviço Nacional de Saúde e morreu há dois meses, queriam salvar o SNS. Álvaro Beleza conta como Arnaut lhe telefonou antes do congresso do PS a pedir-lhe que interviesse “porque o João estava muito mal e não queria morrer sem ver a lei de bases da saúde aprovada”. António Arnaut morreria no dia seguinte. Quem salva a herança dos dois? 

O médico João Semedo morreu esta semana; António Arnaut, fundador do Serviço Nacional de Saúde, há dois meses. A última causa dos dois era “salvar o SNS”. Escreveram uma lei de bases que foi apresentada pelo Bloco de Esquerda. Ainda é possível salvar o SNS?

Claro que é. O SNS está vivo. Tem algumas doenças, mas claro que é possível e vai ser salvo. O SNS tem alguns problemas estruturais que vêm desde o seu nascimento e teve durante o período da troika um desinvestimento brutal. Este governo conseguiu voltar a dar meios financeiros ao nível de 2012. O financiamento da saúde é agora já ligeiramente superior ao que tínhamos antes da troika. 

Nós precisamos de um Serviço Nacional de Saúde para o séc. xxi, adaptado aos novos desafios. Mas acredito que é perfeitamente possível salvar o SNS.

O seu amigo António Arnaut disse, numa entrevista ao i em conjunto com João Semedo, a propósito da lei de bases que apresentaram, que “quando o Serviço Nacional de Saúde faz as pessoas esperarem meses por uma consulta, exame ou cirurgia às vezes urgente deixa de ser um Serviço Nacional de Saúde”. Mas essa é a situação em que estamos. 

Eu dedico a minha primeira hora de trabalho, todos os dias, há anos, a ajudar pessoas, a encaixá-las no sistema, porque existem em muitos locais e muitas áreas da medicina listas de espera. É evidente que isso é uma preocupação.

E como se resolve o problema das listas de espera?

O meu amigo António Arnaut, quando esteve a fazer o documento com João Semedo, teve a gentileza de mo mandar antes de ser apresentado para eu dar a minha opinião. O livro que eles publicaram manifesta uma preocupação que eu sempre tive. Em Portugal temos no sistema de saúde três setores fundamentais – o setor público, o privado e o setor social. E o setor social e o privado deverão ser complementares do sistema público e ajudarem naquilo que o sistema público não pode, não quer ou até não deve fazer. O que acontece é que, infelizmente, temos um sistema bastante pantanoso em que o sistema privado por vezes é concorrencial e não complementar. E às vezes é parasita do sistema público. Nos últimos anos acentuou-se um esvaziamento do setor público à custa do privado. Tem havido um aumento gradual do sistema privado. Há 30 anos, quando eu comecei a trabalhar, o público representava em Portugal cerca de 80% do sistema de saúde. No princípio do séc. xxi já estava em 65%-35%. Penso que neste momento já andará nos 60-40. E, a continuar esta tendência, numa década, o serviço público será ultrapassado pelo privado. 

O SNS está a ser capturado pelos privados?

A saúde é um setor que movimenta muito dinheiro, e bem. Por exemplo, a indústria farmacêutica privada é fundamental para o desenvolvimento da medicina e sem ela não seriam possíveis os avanços que têm sido feitos. Este é um setor em que o privado tem um papel absolutamente fundamental e não tem de ser o Estado a meter-se. Agora, tal como António Arnaut e João Semedo, defendo há muito tempo que devia haver separação de águas entre público e privado. 

É o que está na lei que o Bloco apresentou…

É. E essa é a parte fundamental do projeto-lei, o separar águas. Quando tive responsabilidades no Partido Socialista, o PS sempre defendeu isso. 

Separar águas é decidir que os médicos só trabalham para o público ou só trabalham para o privado…

A questão é esta: não conheço nenhum setor de atividade de qualquer país em que as pessoas de manhã trabalhem na Microsoft e à tarde trabalhem numa outra empresa de informática. Isso não é possível. Os funcionários da Mercedes só trabalham na Mercedes, não fazem depois ali umas horinhas na Porsche ou na Volkswagen. Aqui no meu vizinho privado Hospital da Luz, a maioria dos médicos que lá trabalham não trabalham noutro sítio. Tem de haver dedicação plena à instituição.

Os médicos que trabalham para o Serviço Nacional de Saúde deviam fazê-lo em regime de exclusividade?

Sim. Acho que não se deve mexer nos médicos que já têm atividade privada. É começar pelos mais novos. Qualquer pessoa contratada pelo Serviço Nacional de Saúde deveria trabalhar só em dedicação exclusiva – e deviam ser bem pagos por isso. Fala-se muito nas horas: a reforma da saúde passa por um equilíbrio de vários fatores. Tem de se pagar às pessoas pelas horas que trabalham, mas também por aquilo que fazem, pela complexidade daquilo que fazem, pelo número de doentes que veem, pela dedicação que têm. Temos de ter um serviço público de saúde gerido de modos modernos e isso só é possível apostando nas pessoas que trabalham na função pública. E o que estou a dizer para a saúde devia valer para tudo. Não é possível nem aconselhável fazer isto de um dia para o outro. Agora, é possível começar com os novos. E os novos contratos deviam ter essa condição e não têm, pelo contrário. Os jovens médicos não têm a perspetiva de ter exclusividade. Assim é impossível. Como são mal pagos, vão trabalhar em dois ou três sítios. Isso passa-se com médicos, com enfermeiros…

Mas dentro da classe médica a ideia de exclusividade não é popular…

Não é nada popular. É uma das razões por que eu perdi as eleições [para bastonário da Ordem dos Médicos] há dois anos. (risos)

Mas um governo apoiado pela esquerda não devia ter começado a pensar nisso? 

Eu sempre defendi, quando tinha responsabilidades no PS e, agora, no mandato de António Costa, que o Partido Socialista devia fazer entendimentos com o Partido Comunista e o Bloco de Esquerda em duas áreas em que é fácil o entendimento à esquerda: na saúde e na educação. Europa, política externa e NATO, é impossível. Na economia, também é difícil. Mas para garantir serviços públicos de saúde e educação de qualidade para todos, com igual qualidade para todos, é possível o entendimento. 

E isso significa tirar também a educação dos privados?

Não. Significa estabelecer qual é o lugar para cada um e não se misturarem. Exemplos: a saúde tem três pilares fundamentais – cuidados primários, hospitalares e continuados. Este terceiro pilar é cada vez mais importante porque vivemos cada vez mais anos e precisamos de mais apoio médico e de enfermagem. Por exemplo, a área dos cuidados continuados podia ser para o setor social e para o setor privado. As Misericórdias têm experiência nessa área. Mas agora as Misericórdias estão também na área dos hospitais? Pronto, entraram, é a vida. Mas há aqui uma certa confusão. Os melhores hospitais do país, onde existem os melhores cuidados de saúde de cirurgia cardíaca, oncologia, neurocirurgia, são hospitais públicos. Estamos a falar de hospitais centrais e universitários. Para que todos sejamos bem atendidos no futuro – estou a falar a 50 anos – é bom preservar o SNS público, nomeadamente na área hospitalar e nos cuidados primários. 

Se você, que é da ala direita do PS, defende a lei Arnaut-Semedo, porque é que a herança deles não poderá ser acolhida? 

Eu sou um socialista liberal. O PS vai apresentar uma proposta de lei e eu defenderei essa proposta, que ainda está a ser estudada por uma comissão liderada por Maria de Belém. 

Maria de Belém tem bastantes relações com os privados…

Sim, mas foi uma ótima ministra da Saúde, é uma das pessoas mais qualificadas e que melhor conhece o sistema e é uma mulher de esquerda. Confio na sua inteligência e penso que irá beber muitas das preocupações da lei Arnaut-Semedo. 

Acredita mesmo que a nova lei de bases da saúde terá grande inspiração de Arnaut e Semedo?

Acho que vai ter. O PS tem grande inspiração em António Arnaut, como é óbvio. E outra coisa não seria de esperar, está no nosso código genético. E até Rui Rio tem algumas declarações que se aproximam desta posição. Já chegou a dizer, e bem, que a saúde não é um negócio como os outros. A saúde não está feita para ter lucro, existe para tratar pessoas. Mesmo a atividade privada em saúde tem de ter uma ética diferente das outras. O problema é que em Portugal temos dois sistemas dentro do sistema. Uma parte da Europa tem um sistema bismarckiano – Holanda, Alemanha, França – de seguros de saúde e depois o Estado cobre quem não tem seguro. Inglaterra, Portugal e Espanha têm o serviço nacional de saúde, que é público e universal. Mas em Portugal coexistem os dois sistemas: 60% de Serviço Nacional de Saúde, pago pelos nossos impostos, e depois 40% de seguros de saúde – além de pagarmos todos impostos para ter o SNS, alguns ainda pagam para seguros de saúde, sejam públicos ou privados. Os funcionários públicos descontam para a ADSE, que é um seguro de saúde público, e outros têm seguros privados. Em Portugal, muitos cidadãos pagam duas vezes. Há uma duplicação e isto cria um sistema pantanoso. E, depois, grande parte ou a maioria dos médicos trabalham nos dois sistemas! Isto é confuso. Muito confuso. Pôr ordem nisto não é fácil.

O governo Sócrates, no passado, tentou acabar com as “caixas”. Mas parece que só acabou com a Caixa dos Jornalistas…

As caixas e a ADSE foram criadas pelo Salazar nos anos 60 porque não havia um Serviço Nacional de Saúde! Quando o Arnaut fez o decreto-lei do SNS, já no fim do mandato dele, a ideia a seguir era acabar com as caixas. Em Inglaterra não há caixas, não há ADSE’s, como é óbvio! Quando se cria um Serviço Nacional de Saúde universal e gratuito é para todos, todos são iguais. Todo o cidadão de uma República é igual em direitos e deveres e deve ter o direito de ser tratado da mesma maneira. Eu já disse isto dentro do PS: a escola pública é obra da i República e cumpre o princípio de que o filho do rico e o filho do pobre têm direito à mesma professora de Matemática, o que é um avanço civilizacional. E até vestiam a mesma farda, para não se distinguirem pela roupa. A escola pública dá igualdade de oportunidades para que exista o elevador social, para que todos tenham oportunidade de chegar ao topo. Depois do 25 de Abril, o governo PS com António Arnaut deu-nos o serviço nacional de saúde inglês, criado em Inglaterra depois da ii Guerra Mundial pelos trabalhistas. E, no SNS, o princípio é que o rico ou o pobre tenham direito ao mesmo tratamento na saúde. Quando se criou o SNS, a ideia era acabar com as caixas, que são sistemas privados ou públicos, no caso da ADSE, apenas para alguns membros. Antes, aqueles membros eram privilegiados, todos os outros não tinham nada. Antes do SNS havia milhões de portugueses que não tinham direito à saúde. Em Portugal fez-se o SNS e manteve-se o sistema de caixas e a ADSE, e cresceram os seguros privados de saúde. E aqui temos a confusão e isto é uma verdade sobre a qual ninguém quer falar, que dói. 

E como se resolvia a confusão, como lhe chama?

Aqui há três hipóteses. Ou se acabava com a ADSE – eu uma vez disse que isso era uma hipótese – e se apostava tudo no SNS à inglesa; ou então manter tudo o que temos para não entrar por aqui com um caterpillar, mas separar águas. Porque, senão, o que vai acontecer daqui a poucos anos é que vamos ter um Serviço Nacional de Saúde para pobres, que atende os desempregados, os que não têm ADSE nem seguros privados, os que estão em baixo; e vamos ter todo um serviço privado para quem tem seguros privados ou públicos. Quem é que alimenta o serviço privado de saúde em Portugal? A ADSE – isto é, o Estado, indiretamente, são os funcionários públicos do Estado que alimentam o privado – e os seguros privados de saúde. Como se resolve isto? Criando regras e definindo setores para a atividade privada e outras para a atividade pública. 

Mas o atual governo, que tem o apoio da esquerda no parlamento, tinha condições para isso…

O lugar de ministro da Saúde é o mais difícil de todos. É muito ingrato. E o atual governo melhorou bastante o sistema de saúde, contratou médicos, enfermeiros… Os tempos da troika secaram o SNS, houve cortes brutais. Este governo conseguiu voltar a dar oxigénio ao sistema.

Mas o PCP e o Bloco de Esquerda e os sindicatos dos médicos, sejam de esquerda ou de direita, não dizem isso.

Nós temos resultados em saúde muito bons a nível mundial. Agora, temos de melhorar e salvar o SNS. O que Arnaut queria salvar, e eu quero salvar, é esta ideia generosa de todos terem direito a saúde de igual qualidade. Não é existir uma saúde de grande qualidade para os que podem e uma saúde razoável para os que não podem. Hoje, todos têm direito nos hospitais públicos a saúde de grande qualidade. Só que isto está a apertar e é por isso que há listas de espera, dificuldades de acesso. E as listas de espera têm a ver com isto: é evidente que não há lucro privado na saúde se não houver listas de espera. Imagine que não havia listas de espera! Tínhamos um sistema quase perfeito em que toda a gente era atendida a tempo e horas em qualquer patologia. Não precisava de ir ao hospital privado. 

Sem listas de espera, acabavam os privados…

Eu não quero acabar com os privados… Os privados têm de ter um papel. Ouça, eu já estou afastado da vida política…

É da comissão política do PS…

Mas não tenho nem quero ter mais responsabilidades políticas. Só há uma coisa que eu prometi ao António Arnaut: a minha voz não se vai calar enquanto eu puder e tiver saúde para defender estes princípios gerais e que o Partido Socialista não saia destas balizas. 

Eu acho que o PS já saiu dessas balizas…

Não. O PS tem feito o possível, o governo tem feito o possível e poderá ser feito mais. Falta separar águas. E para não ser uma coisa radical, devíamos começar com a exclusividade dos mais novos. Se o SNS contratar pessoas em dedicação exclusiva e oferecer condições, a maioria opta pela dedicação exclusiva. Esta é a chave do problema. Qual é a dúvida? No meu tempo não havia dúvidas. Eu fiz o internato em dedicação exclusiva e muitos dos médicos da minha geração trabalharam em dedicação exclusiva. O problema é que agora não há essa opção. Se se lhes der essa opção, isso vai garantir que daqui a dez anos vamos ter menos listas de espera e mais investimento no setor público. Isto é uma questão ética, para além de política e ideológica. O dinheiro dos impostos, que é de todos, não deve ser canalizado para financiar lucros privados. O Estado tem de definir muito bem as áreas em que tem de estar. Tem de estar na segurança interna, justiça, instituições de governação que funcionem, segurança social, educação e saúde. 

O Estado na segurança social, educação e saúde é um legado da social-democracia europeia. Eu até acho que uma parte da saúde pode ser garantida por privados, como os cuidados continuados. Agora, não pode andar tudo a fornecer tudo! E neste momento anda tudo a fornecer tudo, tudo baralhado, e às vezes os atores são os mesmos em três sítios. Não pode ser! Até para eles é pior, é pior para todos. E é pantanoso. É preciso investir em profissionais que trabalhem só para o Serviço Nacional de Saúde. É tudo mais claro, os próprios profissionais não entram em burnout… Nós temos hoje muitos problemas porque as pessoas estão esgotadas! Estão a trabalhar no sistema público para além da sua capacidade, muito mal pagos porque não estão em exclusividade, trabalham na sua atividade privada… Em última análise, é mau para os doentes. E o Serviço Nacional de Saúde é para servir os doentes, assim como a escola pública é para servir os estudantes. 

Mas Mário Centeno dirá que não há dinheiro para acabar com as listas de espera ou criar essas condições e Adalberto diz “somos todos Centeno”. 

Eu sou amigo do Adalberto há 30 anos. É a pessoa da minha geração mais bem preparada para ser ministro da Saúde. E faz o que pode e como pode. E não é fácil. E é preciso ter uma paciência de Job. Cada um faz o seu papel e Mário Centeno também faz o seu papel, e bem feito. A questão é que Portugal tem uma dívida pública muito maior do que é desejável… E temos de ter boas contas. O país não perdoaria ao PS se, no governo, levasse o país à bancarrota outra vez. O PS tem demonstrado que é possível ter boas contas, crescimento económico e melhorar os serviços públicos. 

Mas não pode acabar com as listas de espera…

Na minha ótica, só acabarão as listas de espera investindo em profissionais de saúde em dedicação exclusiva ao Serviço Nacional de Saúde.

Foi uma espécie de ministro da Saúde-sombra da liderança de António José Seguro. Gostava de ter sido ministro da Saúde?

Não, não gostava. Acho que é o pior lugar político que há. 

Como conheceu o João Semedo?

Conheci o João Semedo há muitos anos, no Porto, com o Cipriano Justo e o Paulo Fidalgo. Eles eram médicos que tinham saído do PCP. O João Semedo era administrador do Hospital Joaquim Urbano, candidatámo-nos juntos à Ordem dos Médicos. Muitos anos mais tarde, António José Segurou convidou-me para a direção do PS quando ele era líder do Bloco de Esquerda. Chegámos a ter uma reunião na sede do Bloco de Esquerda, eu fui com o António José Seguro. 

Como foi essa reunião? 

Eu sempre disse que o PS é o partido- -charneira na vida política portuguesa e que na área da saúde, educação e segurança social se entende bem à nossa esquerda. Economia, finanças públicas, política externa e Europa, o PS entende-se bem à direita. Eu sempre defendi que o PS podia ter entendimentos com BE e PCP na área da saúde e educação. António José Seguro teve duas reuniões, uma no PCP, onde eu não fui, e outra, a que eu fui, na sede do Bloco de Esquerda, que foi muito engraçada. E até posso contar um episódio que foi muito giro: o António José vira-se para o João Semedo e diz-lhe: “Se, por hipótese académica, eu disputasse eleições e ganhasse sem maioria absoluta, e se convidasse o Bloco para governar connosco e a si para ser ministro da Saúde, o que diria?” E o João ficou atrapalhado. 

O que respondeu?

Qualquer coisa diplomática, combinámos ter mais reuniões. 

O António Arnaut telefonou-lhe pouco tempo antes de morrer…

Estava eu aqui neste gabinete [no Hospital de Santa Maria]. Ele ligava-me às vezes. Há duas chamadas que eu nunca deixei de atender, as do meu filho e do Arnaut. Ligou-me e disse: “Ó Álvaro, vai haver congresso do PS, é preciso ir lá defender o nosso projeto, o João Semedo está muito mal e não quer morrer sem ver aprovada a proposta de lei de bases da saúde”. A vida tem destas coisas, o Arnaut morreu no dia seguinte. Eu disse-lhe que faria o que pudesse, mas podia pouco. E disse-lhe: “Tem de falar com o António Costa, ele é o líder, o primeiro-ministro.” Eu farei a minha parte, que é pouca. Temos de ter a noção da nossa capacidade.