O Partido Socialista aprovou ontem sozinho a proposta do governo que introduz as alterações necessárias à legislação laboral para aplicar o acordo de concertação social. Sem surpresas, o PCP e o Bloco de Esquerda votaram contra, mas os socialistas contaram com a abstenção do PSD, CDS e PAN para garantir que o texto passa ao debate na especialidade. Os socialistas viabilizaram ainda quatro diplomas apresentados pela esquerda, dois do Bloco, um do PCP e outro de Os Verdes, para debater em sede de especialidade.
No PS já se adivinhava o desfecho: os socialistas ficariam isolados na votação. E os comunistas aproveitaram para colar o PS aos sociais-democratas. Jerónimo de Sousa deixou o aviso mais duro: “Ao longo da história, o direito dos trabalhadores foram sempre zona de fronteira entre a esquerda e a direita. O PS hoje não assumiu esse papel de esquerda”.
Já o deputado do Bloco de Esquerda, José Soeiro, preferiu lançar um desafio aos socialistas de irem mais além no debate na especialidade. No rescaldo da maratona de votações, o líder parlamentar socialista, Carlos César, preferiu enfatizar que “a estabilidade tem sido uma nota dominante” no parlamento. Mais, espera que se renove a confiança nos trabalhos preparatórios do orçamento de Estado para 2019.
No PSD, a ideia de dar mão ao PS não é pacífica, mas a maioria dos deputados anuiu aos argumentos de Rui Rio e votou em nome do interesse nacional. O líder social-democrata espera para ver se na discussão da especialidade “o documento é desvirtuado”, se tal acontecer o partido poderá mudar o seu sentido de voto.
Os socialistas aprovaram ainda a proposta dos Verdes para revogar as normas laborais que “permitem a celebração do contrato a termo certo só porque os trabalhadores se encontram em situação de procura do primeiro emprego e desempregados de longa duração”.
Do PCP, o PS viabilizou o projeto que aperta a malha ao trabalho temporário. Na versão aprovada, os comunistas propõem que “o contrato de utilização de trabalho temporário só pode ser celebrado em situações cuja satisfação é de necessidades temporárias, devidamente justificadas”. Jerónimo de Sousa considerou que ainda se trata de um “combate inacabado” e que o texto aprovado ontem permite que trabalho de mais de 150 horas semanais sem qualquer compensação salarial.
Os socialistas garantem que não pretendem negociar à direita na Assembleia da República e Carlos César voltou a insistir que o seu grupo parlamentar trabalhará numa solução que respeite o espírito da concertação social. Contudo, ontem o PS aprovou uma proposta dos bloquistas que permite facilitar a impugnação em tribunal do despedimento mesmo com indemnização.
Cartão vermelho nas galerias
No momento do cartão vermelho da esquerda às alterações laborais introduzidas pelo governo, vários sindicalistas da CGTP, entre eles o seu líder, Arménio Carlos, levantaram-se nas galerias da Assembleia da República, associando-se simbolicamente ao voto contrário da esquerda.
O texto do governo, aprovado na generalidade prevê o alargamento do período experimental de 90 dias para 180 dias nos contratos sem termo de jovens à procura do primeiro emprego ou de desempregados de longa duração, além do fim ao banco de horas individual, criando a possibilidade de um novo regime de banco de horas por acordos de grupo, Basta que 65 por cento dos trabalhadores o aprove.
A Confederação Empresarial Portuguesa já avisou contra a violação do acordo assinado e o PS prepara-se para ainda ir mais além e criar uma norma travão para impedir que o período experimental possa ser encarado como trabalho precário.
Certo é que a discussão na especialidade da concertação social se irá misturar com o dossiê do Orçamento do Estado para 2019. Sobre esta possibilidade, Jerónimo de Sousa reconheceu que as alterações laborais são “um elemento marcante”, no entanto, este tema “não tem que ser misturado com a discussão em concreto dos conteúdos”.