Passeando por Las Merindades


Os espanhóis não estão contentes, são vivos nas críticas e nos dichotes. Nas aldeias, nas vilas e nas cidades


Na transição da Cantábria para Castela e Leão, comunidades autónomas espanholas, mais concretamente a norte da província de Burgos, encontra-se a exuberante região de Las Merindades, “el territorio burgalés más verde y com mayor vocación norteña”, segundo prospeto turístico local. Pois a verdade é que se trata de um território deslumbrante, de natureza selvagem e surpreendente.

Começando a esquadrinhar os muitos caminhos (estradas municipais) que serpenteiam a serra e ligam os povoados, o espanto começa a comandar o percurso. Os montes cor de musgo, vestidos de alto a baixo com um coberto florestal muito denso e encarapinhado, desenrolam-se em imponentes cordilheiras rasgadas por vales não menos grandiosos. De repente, o arredondado das montanhas é interrompido pela retidão de uma muralha natural de rocha calcária – a rocha de tons amarelados, porosa, que há de servir para construir as casas dos aldeãos ou os palacetes da nobreza local – com carrapitos verdes no cocuruto. Nas bermas, uma garridice de flores silvestres, vermelhas, azuis, amarelas, brancas, em maciços rasteiros ou em espaventosos tufos, delicadas na forma e berrantes na cor; até o vermelho das papoilas parece incandescente! O arvoredo, frondoso, extensos carvalhais e tantas outras folhosas, exibe-se em bosques cerrados – também os há de coníferas, em retalhos, mas eucaliptos, nem vê-los! – onde a passarada chilreia sem parar, enquanto as aves de grande porte, impressionantes nos voos planados, dominam os céus. Além disso temos os “pueblos”, casas avarandadas pequenas, mais modestas, ou construções senhoriais a lembrar grandezas heráldicas, todas da mesma pedra amarelada a que o sol dá tons dourados, na maioria morada de velhos, que os novos “se marcharan”. Lá como cá, o interior tem perdido gente, mas ainda tem centro de saúde ou equivalente, escola, “juzgado”, e até residência-sénior. E não falta o café, bar, restaurante, onde os mais velhos se juntam pela fresca, e palram, e comentam. Nisto, menos mau do que o que cá temos, sem dúvida. E por todo o lado andam turistas, muitos espanhóis, e sempre se vai fazendo negócio. Apesar do desemprego, apesar dos casos e das tricas políticas, apesar da crise que também por lá bateu forte e feio. Todavia, os espanhóis não estão contentes, são vivos nas críticas e nos dichotes. Nas aldeias, nas vilas e nas cidades.

Voltando às Merindades e aos seus povoados, fica apenas o lamiré: Orbaneja del Castillo, Puentedey, Espinosa de los Monteros, Frias, para amostra, são lugares que se visitam e não se esquecem. Não pela grandiosidade, que a não têm, mas pela autenticidade. Para rematar o relambório, convém referir que o turismo em espaço rural tem oferta considerável e, pela parte que nos toca, de qualidade. Num lugarejo de nem meia centena de habitantes, Bisjueces, há um hotel rural, La Torre de Bisjueces, nada menos que instalado numa casa do séc. xvii, convenientemente conservada e inteligentemente adaptada, e decorada, para bem receber. Os proprietários vivem lá e franqueiam simpatia e disponibilidade a rodos.

Las Merindades é um refúgio no tranquilo reino da natureza, no fremente reino de Espanha.

 

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