O recém-formado governo italiano – a tomada de posse foi a 1 de junho p.p. – é um exemplo acabado do desnorte que grassa na União Europeia (UE), a união desunida que insiste em desfilar meio esfarrapada e a fazer de conta que não dá pelos rasgões. Santa imprudência! Oxalá não venha a pagar caro a leviandade…
\Voltando a Itália, e depois dos anteriores resvalos eleitorais europeus – na Alemanha, a extrema-direita ultranacionalista ocupa a maior bancada da oposição; na República Checa e na Hungria, a direita nacionalista renovou os mandatos dos eurocéticos –, temos um primeiro-ministro indigitado teoricamente a chefiar um governo do Movimento 5 Estrelas e da Liga. Ou seja, um governo eurocético, populista, anti-imigração e antissistema, uma girândola anti-UE! Melhor era difícil…
Aparentemente em contramão, o recentíssimo governo espanhol desalojou o partido de Mariano Rajoy (PP), direita conservadora, para dar o poder ao socialista (PSOE) Pedro Sánchez. É ainda notícia pelo facto de ter 11 mulheres num total de 17 ministros, coisa nunca antes vista. Na aparência haverá alguma semelhança nos dois governos ibéricos, como que a destoar, para melhor, da atual tendência na UE. Há que esperar para ver. O PSOE contou com apoio parlamentar para fazer aprovar a moção de censura que o legitimou. Mas para governar… a ver vamos. Este governo não resulta de mérito eleitoral, mas de demérito do anterior, que se viu desapossado na sequência da sentença do caso Gürtel: rede de corrupção no interior do PP, ao mais alto nível, que terminou na condenação de 37 arguidos a penas que somam 351 anos de prisão! Dá que pensar…
Em Portugal, aliás, o PS parece estar a pôr-se a jeito para detonar a geringonça, tantos e tais têm sido os últimos desentendimentos com os partidos que o apoiam. Não que isto seja novidade – sabemos que a atual solução governativa requer negociação permanente, para bem do país e da democracia. Seria avisado, porém, não deixar extremar posições.
Tal só iria reforçar as teses de quem sempre vaticinou a rutura da base parlamentar de apoio, considerada espúria, e quereria ver de volta o defunto arco da governação. O país respirou de alívio quando se viu livre do “governo da troika”, acreditou na promessa de um futuro melhor, e do que menos precisa é de se ver mergulhado numa crise política. Há muito mais com que nos preocuparmos, desde logo com desvios de fundos para a banca – para isso nunca falta dinheiro – e insuficiência de meios para a saúde, a educação, etc. E como se não bastasse, o Banco de Portugal alerta para a possível iminência de uma nova bolha imobiliária, abrenúncio! Vêm de longe os avisos quanto à especulação imobiliária, subida galopante de preços e de rendas de habitação, mais agora que se começam a sentir os reais efeitos da herança da famosa Lei das Rendas. Já é iniludível o processo gentrificador que se faz sentir nos centros e nos bairros históricos das nossas cidades: expulsar os residentes antigos e mais carenciados para dar lugar a outros com maiores recursos e ligação nenhuma ao ambiente tradicional. Assim se matam dois coelhos duma só cajadada: nem afetos, nem usos e costumes. Apenas o vil metal. E morte anunciada.
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