Uma semana é uma eternidade na vida política. Na vida política italiana, uma semana permite várias mortes políticas e respectivo ressuscitar, com e sem reencarnações. Retomemos a narrativa onde tínhamos deixado esta crónica na semana passada. Giuseppe Conte, especialista na redacção de um curriculum com uma vida académica imaginária, foi indigitado pelo presidente Mattarella para formar governo, contando com o apoio do Movimento Cinque Stelle (M5S) e da Lega Nord, liderados, respectivamente, por Luigi Di Maio e Matteo Salvini. Conte apresentou como candidato à pasta das finanças Paolo Savona, que já fora ministro da Indústria, como independente, no governo de Ciampi (o governo a seguir à eclosão do escândalo Tangentopoli). Savona tem obra publicada sobre as insuficiências do euro e defendeu publicamente o abandono, pela Itália, da moeda única. A insistência na sua nomeação e a recusa da mesma por Mattarella conduziu à renúncia de Conte ao encargo de formar governo.
Di Maio e Salvini gritaram contra a desvalorização da vontade dos eleitores italianos (em conjunto, representam 49% dos votos) e a submissão ao Diktat de Merkel. Di Maio anunciou um procedimento de destituição de Mattarella (o que implicaria uma decisão por maioria simples dos parlamentares, seguida de um julgamento pelo Tribunal Constitucional com uma composição alargada a uma componente de júri, com 16 cidadãos). Já Salvini, dando reiteradas provas de profissionalismo, não acompanhou Di Maio nesta cruzada, preferindo acumular capital de queixa e ganhar dez pontos percentuais nas sondagens de opinião.
Di Maio foi uma escolha de Beppe Grillo, o cómico fundador do M5S, para cabeça-de-lista nas eleições, evitando os perigos de uma passagem pelo governo para um crítico de todos os governos. Di Maio tem sido o saco de pancada do pessoal político e dos eleitores do M5S, que o acusam de falta de capacidade de liderança – a razão, voltemos a lembrá-lo, pela qual foi escolhido por Beppe Grillo…
Mattarella falou ao país, explicando a recusa de Savona dados os perigos associados de crise financeira causada pela possibilidade de abandono do euro. Em seguida indigitou para formar governo um economista pró-euro, Carlo Cottarelli, candidato a liderar um executivo técnico e de gestão até às eleições. Durante a semana, as taxas de juro da dívida pública de Itália, Espanha, Grécia e Portugal subiram significativamente.
No dia de hoje há uma grande apetência pelo regresso às urnas. Desde logo por parte dos partidos “tradicionais” (pós-Tangentopoli…), o Partito Democratico de Renzi e a Forza Italia de Berlusconi, esperançados na recuperação de votos. Mas também os partidos anti-sistema querem novas eleições. Certamente, a Lega, que cresceu muito nas sondagens e sonha em ir para o governo com a Forza Italia de um Berlusconi erodido, dando-lhe um abraço de urso que a asfixie ao mesmo tempo que adquire uma dimensão nacional (Salvini já conseguiu alargar a Lega muito para além do ecossistema político natural, a Lombardia). Já o M5S arrisca–se a ficar para a História como um mero instrumento de votos do centro-esquerda e do Mezzogiorno em direcção a uma Lega que consiga reinventar-se como partido nacional de direita.
Não obstante, continuam as negociações com Mattarella para que uma segunda tentativa de governo M5S-Lega mereça a bênção presidencial. Seria o regresso à tentativa, arriscada, de vacina dos italianos contra os perigos de um governo anti-sistema, incapaz de governar cumprindo as promessas eleitorais.
Escreve à sexta-feira, sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990