Por terras do Barroso e um pouco mais


A mítica EN103 atravessa montes e vales do Minho até às portas de Trás-os-Montes, onde se dá a bifurcação em estradas nacionais alternativas para Montalegre ou para Boticas


No passado dia 13 de abril, Portugal recebeu mais um galardão internacional, desta feita no âmbito do programa da FAO “Sistemas Importantes do Património Agrícola Mundial” (sigla em inglês, GIAHS): foi atribuída às terras do Barroso, nos concelhos de Montalegre e de Boticas, a classificação de património agrícola mundial. O Barroso é o primeiro a ser aprovado em Portugal e um dos primeiros a serem aprovados na Europa, segundo nota da FAO onde também pode ler-se que “os habitantes do Barroso desenvolveram e mantiveram formas de organização social, práticas e rituais que os diferenciam da maioria das populações do país em termos de hábitos, linguagem e valores”. É verdade, malgrado a míngua, os barrosões lá se vão desenvencilhando, mas isso não basta para lhes conferir a qualidade de vida a que têm direito. São por demais conhecidas as merecidamente badaladas feiras do fumeiro transmontano, que atraem milhares de visitantes. Finda a feira, porém, acaba-se a festa e regressam, apressados, o marasmo costumeiro e o quotidiano agreste. Os mesmos que por estes dias encontrámos em aldeias serranas da região barrosã – todos os serviços de proximidade foram sendo paulatinamente retirados.

A mítica EN103 atravessa montes e vales do Minho até às portas de Trás-os-Montes, onde se dá a bifurcação em estradas nacionais alternativas para Montalegre ou para Boticas. Seguindo a de Boticas, sob a presença tutelar da serra do Barroso, filha do sistema montanhoso da Peneda-Gerês, que dominou o trajeto que ficou para trás, a dado momento corta-se em direção a Alturas do Barroso que, como o nome indica, fica no alto da serra. Do amarelo dos tojos e do lilás das urzes, à desgarrada, ao branco das giestas, ganham forma o ar rarefeito e os ruídos do silêncio da montanha, e surge a aldeia, ruelas empedradas, casas umas de pedra, outras não – “maisons”, marcas da emigração –, quintais floridos, gente recolhida na lida, fora de vista. A estrada serrana continua, avistam-se pequenos rebanhos de cabras, há gado barrosão nos lameiros e, volvidos uns quilómetros, aparece Vilarinho Seco, aldeia tradicional transmontana: granito aparado nas casas e nos muros, quelhos de gravilha, uma capelita a compor o cenário onde só o avermelhado dos telhados se destaca dos tons cinzentos do granito. Nem vivalma se adivinha, só o chilreio da passarada se confunde no farfalhar da tarde que se avizinha. Campos lavrados, prados, algum gado e muita serra, tojos, giestas e urzes, sempre a descer até à albufeira dos Pisões, já no concelho de Montalegre. Então, a remirar-se toda na albufeira, empoleirada numa estreita península que escapou ao alagamento da área, está Vilarinho de Negrões, considerada uma das cinco aldeias mais bonitas de Portugal. Se a distinção avantajou a aldeia e a vida de quem lá mora, não temos notícia. Fica nota da beleza do local. E mais ainda se verá pois, na borda transmontana, paredes-meias com terras minhotas, arrima-se Vila da Ponte, uma aldeia com pergaminhos, com história para contar. Pela via romana alcança-se a velha ponte de pedra que deu nome à terra. Aí, a demora pode ser presenteada com um inesperado concerto de rãs na ribeira de Cabril. Assim aconteceu.

 

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