Público e privado na conquista dos votos


Entre o descongelamento das carreiras públicas e a descida do IRC no interior, avançam as frentes para conquistar os indecisos em 2019


À porta do ano decisivo para se entrar num novo ciclo político, o ministro das Finanças veio garantir os aumentos indiretos dos salários na administração pública através do chamado “descongelamento” das carreiras (um custo de 400 milhões de euros) e anunciar a regularização do trabalho precário e o procedimento para o recrutamento de trabalhadores qualificados (e, por razões óbvias, mais bem pagos). As medidas para 2019 começam, por isso, a tomar o seu caminho e a transmitir a mensagem de “normalização” dos trabalhadores do Estado e de todas as suas administrações ramificadas. O tema tem sido gerido com pinças por Costa e Centeno, com uma estratégia simples e aparentemente gradual, concentrada na libertação de informação que vá consolidando a confiança dessa grande massa de trabalhadores. Uma bolsa eleitoral decisiva e que nunca escapa à atenção fulcral nos governos do PS, numa espécie de modus operandi que se converteu em modus vivendi.

Mesmo assim, há todo um grande percurso a fazer, nomeadamente no que respeita à comparação entre carreiras e as suas remunerações – há injustiças gritantes e humilhações notórias no edifício que devem, sob pena de implosão setorial, ser corrigidas urgentemente – e às chefias intermédias, que se afiguram como fulcrais para a prestação dos serviços públicos. Se há dinheiro disponível para essa normalização, é bom de ver que ele deve ser usado para obter patamares objetivos de justiça comparativa e valorização do mérito. Muita da desmotivação e do desincentivo que grassam nos trabalhadores que exercem funções públicas passa por esses dois vetores. E já sabemos como essas malignidades afetam o interesse público. Até se resolverem, teremos sempre intervenções cirúrgicas sem cuidar da reforma global e estrutural. Por ora, chegarão para mobilizar os indecisos…

Enquanto isso, o setor privado viu o desemprego cair, mas as situações de precariedade laboral crescem e os salários não melhoram, antes estabilizam, como se estivéssemos num quadro recessivo. Nos custos das empresas parece ser claro que, em regra, o fator trabalho não é atendido como critério primordial, assumindo-se que a sua estagnação é essencial para que o custo de outros fatores produtivos ajude aos ganhos de competitividade.

Num país com as características do nosso, vejo duas formas de alterar este estado de coisas e partir para uma meta de aumento do rendimento médio disponível: a participação dos trabalhadores na distribuição dos lucros de acordo com níveis de contributo para a produtividade – com um regime jurídico equilibrado para fornecimento de opções às empresas e sem os devaneios da “cogestão” – e a redução substancial da sua carga fiscal, que permitisse libertar recursos agora afetados à máquina do Estado (ou, em alternativa, afetação antecipada de uma parte dos impostos à remuneração global do trabalho). Pelos vistos, também esta semana se viu que o governo quer começar a fazer algo relevante nesta matéria: descer o IRC no interior, em conjugação com o número de postos de trabalho, em repristinação de providências antigas de outros governos. É pouco, mas também pode ser decisivo para a conquista de votos em 2019, como mensagem de atração da parte esquecida do país.

Se não é combinado, parece. Entre público e privado, as duas frentes avançam para a persuasão final. Depois faremos as contas.

 

Professor de Direito da Universidade de Coimbra. Jurisconsulto

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