Negociando com a Coreia do Norte: are you talKim to me?


Jesus martirizado na batalha de Alcochete, Trump candidato a Prémio Nobel da Paz, Kim Jong-un a negociar a desnuclearização da península coreana. Não há coincidências, o fim do mundo aproxima-se


O futuro da humanidade não passa por Alcochete, ao contrário do que possam tentar fazer crer os órgãos de comunicação social e os titulares dos órgãos de soberania da lusitana república. Já a contagem decrescente para a cimeira do século (deste século, o xxi, não exageremos…), agendada para 12 de Junho, em Singapura, está a ser um espectáculo magistral de negociação. E como no tempo das redes sociais e dos canais de informação 24/7 nada do que não seja publicitado existe, a negociação está a ser, em grande parte, pública.

Uma negociação pública de posições iniciais tem os seus riscos porque estimula o maximalismo das posições de abertura, tende a congelá-las e torna o recuo de posições, mesmo que recíproco, difícil de explicar perante os diversos públicos.

No que respeita à capacidade de captar a atenção do Ocidente, do vizinho com responsabilidades tutelares (a China), da outra superpotência nuclear (a Rússia) e dos vizinhos assustados (Coreia do Sul, Japão e arrabaldes), a dinastia Kim tem três gerações de líderes tão queridos como bem-sucedidos. A Coreia do Norte como a conhecemos subsiste por duas razões. Uma, de natureza geoestratégica e que faz com que a China não queira ter na sua fronteira terrestre o exército americano, coisa que aconteceria em caso de reunificação a partir do sul. A segunda razão para a tolerância internacional dos Kim assenta na chantagem mais ou menos clara em torno de uma segunda guerra da Coreia com um upgrade nuclear. Esta chantagem tem sido muito bem-sucedida durante a maior parte do tempo e traduziu-se no fornecimento gratuito ou com descontos significativos de alimentos e combustíveis em quantidade suficiente para não agudizar para além do tolerável a situação de fome e de pobreza energética em que vegeta a esmagadora maioria da população.

Ao contrário do que possa parecer aos menos avisados, a dinastia Kim é extraordinariamente sofisticada na gestão da ameaça externa para manter o domínio sobre a população, bem como na gestão da chantagem internacional perante o Ocidente e na gestão do estatuto de Estado-tampão junto da China.

O exacerbar das ameaças aos EUA e do discurso escatológico contra Trump atingiu um paroxismo que fazia temer o pior. Mas essa gestão do suspense gerou a margem suficiente para o anticlímax da visita à zona desmilitarizada e da reconciliação com os irmãos do Sul.

Aquilo a que estamos a assistir por estes dias é uma manobra clássica de ancoragem da negociação, de fixação de posições maximalistas para permitir negociar a partir de posições mais favoráveis. E a ancoragem partiu de Washington, o que significa que os profissionais estão de volta à condução da política externa americana, o que deve ser fonte de alívio para todos. Mike Pompeo anunciou esta semana que a desnuclearização prometida por Kim teria de ser permanente, verificável (pela Agência Internacional da Energia Atómica, imagino) e irreversível. Esta ancoragem maximalista não foi contestada de imediato por Pyongyang. Foi preciso que o inefável John Bolton viesse explicar que a desnuclearização da Coreia do Norte deveria seguir o modelo líbio para que surgisse a contra-reivindicação: cessação das manobras militares conjuntas entre Washington e Seul como condição prévia para a prossecução do diálogo entre Pyongyang e Seul.

Escreve à sexta-feira, sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990
 


Negociando com a Coreia do Norte: are you talKim to me?


Jesus martirizado na batalha de Alcochete, Trump candidato a Prémio Nobel da Paz, Kim Jong-un a negociar a desnuclearização da península coreana. Não há coincidências, o fim do mundo aproxima-se


O futuro da humanidade não passa por Alcochete, ao contrário do que possam tentar fazer crer os órgãos de comunicação social e os titulares dos órgãos de soberania da lusitana república. Já a contagem decrescente para a cimeira do século (deste século, o xxi, não exageremos…), agendada para 12 de Junho, em Singapura, está a ser um espectáculo magistral de negociação. E como no tempo das redes sociais e dos canais de informação 24/7 nada do que não seja publicitado existe, a negociação está a ser, em grande parte, pública.

Uma negociação pública de posições iniciais tem os seus riscos porque estimula o maximalismo das posições de abertura, tende a congelá-las e torna o recuo de posições, mesmo que recíproco, difícil de explicar perante os diversos públicos.

No que respeita à capacidade de captar a atenção do Ocidente, do vizinho com responsabilidades tutelares (a China), da outra superpotência nuclear (a Rússia) e dos vizinhos assustados (Coreia do Sul, Japão e arrabaldes), a dinastia Kim tem três gerações de líderes tão queridos como bem-sucedidos. A Coreia do Norte como a conhecemos subsiste por duas razões. Uma, de natureza geoestratégica e que faz com que a China não queira ter na sua fronteira terrestre o exército americano, coisa que aconteceria em caso de reunificação a partir do sul. A segunda razão para a tolerância internacional dos Kim assenta na chantagem mais ou menos clara em torno de uma segunda guerra da Coreia com um upgrade nuclear. Esta chantagem tem sido muito bem-sucedida durante a maior parte do tempo e traduziu-se no fornecimento gratuito ou com descontos significativos de alimentos e combustíveis em quantidade suficiente para não agudizar para além do tolerável a situação de fome e de pobreza energética em que vegeta a esmagadora maioria da população.

Ao contrário do que possa parecer aos menos avisados, a dinastia Kim é extraordinariamente sofisticada na gestão da ameaça externa para manter o domínio sobre a população, bem como na gestão da chantagem internacional perante o Ocidente e na gestão do estatuto de Estado-tampão junto da China.

O exacerbar das ameaças aos EUA e do discurso escatológico contra Trump atingiu um paroxismo que fazia temer o pior. Mas essa gestão do suspense gerou a margem suficiente para o anticlímax da visita à zona desmilitarizada e da reconciliação com os irmãos do Sul.

Aquilo a que estamos a assistir por estes dias é uma manobra clássica de ancoragem da negociação, de fixação de posições maximalistas para permitir negociar a partir de posições mais favoráveis. E a ancoragem partiu de Washington, o que significa que os profissionais estão de volta à condução da política externa americana, o que deve ser fonte de alívio para todos. Mike Pompeo anunciou esta semana que a desnuclearização prometida por Kim teria de ser permanente, verificável (pela Agência Internacional da Energia Atómica, imagino) e irreversível. Esta ancoragem maximalista não foi contestada de imediato por Pyongyang. Foi preciso que o inefável John Bolton viesse explicar que a desnuclearização da Coreia do Norte deveria seguir o modelo líbio para que surgisse a contra-reivindicação: cessação das manobras militares conjuntas entre Washington e Seul como condição prévia para a prossecução do diálogo entre Pyongyang e Seul.

Escreve à sexta-feira, sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990