Primeiro, foi o presidente do partido, Carlos César. Depois, foi o seu vice-presidente da bancada, João Galamba, à noitinha na SIC Notícias. O silêncio sepulcral que varreu o PS (e também os outros partidos) sobre a acusação a Sócrates foi ontem quebrado ao mais alto nível.
É evidente que a eurodeputada Ana Gomes várias vezes falou do assunto, até em congressos do partido. Mas Ana Gomes, a única socialista corajosa para enfrentar o que não é o pensamento dominante a determinado momento, ficou sempre isolada. O PS olhava-a como uma carta fora do baralho, alguém “que dizia tudo como os malucos”, como se diz em português corrente. Os outros, os “não malucos”, ou se calavam num silêncio de pedra, sabendo perfeitamente a gravidade do que estava em causa, ou fugiam ao tema dedicando toda a sua energia a discorrer sobre o segredo de justiça.
Diga-se que todos os outros partidos comungaram com o PS do alheamento sobre a acusação a um ex-primeiro-ministro. Nunca a quiseram discutir politicamente, olharam para o lado – uns discutiam a corrupção em Angola, outros na Rússia, era como calhava. Enfim, o muro da vergonha que era a não-posição socialista foi ontem derrubado. João Galamba admitiu que o “sentimento” de vergonha com as práticas do antigo primeiro-ministro se estendia “a qualquer socialista”. “É evidente que o PS está muito incomodado”, disse ainda Galamba. Um dia histórico, portanto.
É verdade que António Costa – eleito líder no dia em que Sócrates foi preso – sempre procurou afastar o PS do processo, evitando que o partido fosse uma arma de defesa de Sócrates. Mas nunca a gravidade das acusações que pesam sobre um ex-primeiro-ministro socialista tinha sido encarada de frente pelos seus compagnons de route, muitos empenhados até ao limite das suas forças em defender o indefensável.