Rio no caminho das pedras


A liderança do PSD delineou uma estratégia com vários planos para combater Costa mas tem o risco de perder ao mesmo tempo para o PS e para o CDS


No combate à maioria de António Costa – resultado possível nas legislativas de 2019 – e para instalação de um novo rumo, Rui Rio e a sua equipa delinearam uma estratégia muito arriscada para um curto período de tempo. Arriscada porque multilateral e prolixa, mas também porque há muitas pontas soltas e incertezas letais. Poderemos desenhá-la num edifício de quatro níveis, com diferentes temas, protagonistas e urgências.

Em primeiro lugar, o entendimento em questões de “regime” com o PS, a fim de retirar Costa das alianças programáticas à esquerda e aniquilar um segundo ciclo de domínio fora do arco PSD-CDS. Será o primeiro a ser abandonado, uma vez que dá palco excessivo a Costa, permite-lhe ir facilmente para o “centro” que ganha eleições e subalterniza Rio num cenário de semelhanças e analogias. Porém, no conceito dos estrategas, será nuclear para conferir “estadismo” a um líder que ainda será visto com uma conotação regional. Não poderá ter muito mais tempo de vida para além do Verão, sob pena de se virar contra Rio.

Em segundo lugar, o ataque cirúrgico às fragilidades do esquema orçamental-financeiro traçado por Centeno: colocar na agenda – com a ajuda inestimável da mobilização da máquina do PCP – os hospitais e as carreiras da administração pública será apenas o começo. Será o segmento que nunca será deixado de lado, pois dele depende o desgaste que, tal como uma tenaz persistente, vai debilitar o poder eleitoral do Ministro das Finanças. E sabe-se como o PS vai capitalizar a aura de Centeno no momento da verdade.

Em terceiro lugar, teremos a rentabilização dos processos judiciais que envolvem o poder socialista, nomeadamente os que envolvem a falência de um sistema bancário fortemente politizado na concessão de crédito e no alimento de uma alegada rede de beneficiários com conexões políticas. Estão aqui os anos de 2005 até ao fim de Sócrates (onde Costa também está) e à austeridade, com temas que queimam muito e, com Passos Coelho (com o discurso “para além da troika”) fora da contenda, não vão deixar de estar na agenda no enquadramento inevitável do fantasma da bancarrota. Não se olvide que este é um plano irresistível de luta política, com detalhes e pormenores que, hoje por hoje, ainda são insondáveis e imprevisíveis. Nenhum líder de oposição os desperdiçaria. Rio começou a aproveitá-los – tímido, mas agarrou-os.

Em quarto lugar, aparece a arrumação de ideias e propostas alternativas na preparação do programa de governo. É, por agora, o desígnio mais nubloso, em consideração do divulgado Conselho Estratégico Nacional – com rejuvenescimento surpreendentemente residual e uma inopinada falta de acréscimo de valor dos nomes mais consolidados para os postos visíveis. O trabalho terá que ser feito até à guerra do Orçamento de Estado para 2019 e será obviamente necessária uma articulação férrea com os deputados. Aparentemente, a renovação não passará necessariamente por aquela equipa. E a contestação interna, desde logo com os interesses de Santana Lopes, não ajuda em nada. Poderia ser um fator crítico de sucesso mas este CEN não teve impacto e terá que fazer inevitável prova de vida.

A conjugação de tempo e resultados destes quatro níveis terá que desembocar em mensagens simples para o eleitorado e na afirmação da liderança de Rio. É muito difícil: basta ver o ambiente favorável das principais cidades do país à caminhada de Costa, desde logo assente numa compreensão benigna para os escolhos. E tem um desafio terrível: perder ao mesmo tempo votos para o PS e para o CDS. Mas Rio escolheu este como o seu “caminho das pedras”. E, de pedra em pedra, se fará nele o seu futuro e o do PSD.

 

Professor de Direito da Universidade de Coimbra. Jurisconsulto.

Escreve à quinta-feira