A habitação é mundialmente vista como um direito humano fundamental. Na última década, este foi o direito humano mais vilipendiado em Portugal, também, a partir da alteração da lei das rendas (NRAU) de Assunção Cristas.
O NRAU de Cristas concretizou dois objectivos políticos: 1) liberalizar as rescisões de contrato por iniciativa do proprietário; 2) permitir a alteração dos antigos contratos por iniciativa do proprietário.
Ao contrário do que sucede nos contratos de trabalho, em que o contratante tem um conjunto de motivos definidos na lei pelos quais pode rescindir (despedir), os contratos de arrendamento deixaram de ter. O contrato de arrendamento pode ser rescindido a qualquer altura por iniciativa do proprietário bastando que cumpra os prazos estabelecidos. Aplicando esta lógica aos contratos de trabalho é como se o patrão passasse a poder despedir o trabalhador sempre que tivesse uma alternativa por um salário mais baixo.
Por outro lado, Cristas legislou de forma a que os contratos antigos fossem rasgados afectando de forma dramática o inquilinato mais velho. Até a simples ausência de resposta dentro do prazo (tantas vezes resultado de um analfabetismo funcional ou medo) passou a institucionalizar o aumento de renda e milhares de despejos. Mas não se julgue que a resposta do inquilino juridicamente esclarecido possa servir de muito mais do que o adiamento. Ainda que com mais de 65 anos e sem rendimentos, o inquilino está em suspenso desde 2012 a aguardar uma portaria em que o Estado deveria ter definido os critérios de apoio à renda a partir de 2017 (entretanto alargado até 2022). Seis anos passados, os inquilinos com novos contratos de arrendamento vivem em permanente sobressalto e os que conseguem resistir com contrato antigo vão envelhecendo com o cutelo sobre a cabeça perante a possibilidade de um dia, quando tiverem menos condições físicas para mudar de casa, poder chegar o aumento incomportável ou a rescisão definitiva.
No dia 4 de Maio será votada no parlamento a iniciativa do PCP de revogação da lei das rendas. Com a revogação importa regularizar as relações contratuais de arrendamento que foram objecto da experimentação radical dos neoliberais mais extremistas e encontrar um modelo de transição eficaz que garanta a recuperação da confiança entre inquilino e senhorio.
Escreve à segunda-feira