O antigo procurador Orlando Figueira, suspeito de ser corrompido pelo ex-vice-presidente de Angola, disse no mês passado em tribunal ter sido ameaçado de morte por uma pessoa que dizia estar a mando de alguém amplamente referido no processo. Nos últimos dias, deu entrada no tribunal um documento assinado pelo alegado autor das ameaças, que nega todas as acusações da defesa do antigo magistrado do Departamento Central de Investigação E Ação Penal (DCIAP).
Orlando Figueira pediu no último mês ao tribunal que fossem recolhidas as imagens do tribunal e do Hotel Ibis da Expo, onde os encontros teriam acontecido – o que foi aceite pelo coletivo. Ficou ainda decidido que seria reavaliado pela PSP o seu risco para efeitos de reforço de segurança.
No documento que deu entrada esta semana em tribunal, Artur João Matos confirma ter assistido a uma sessão de julgamento e ter tido um encontro com a irmã do procurador no Hotel Ibis da Expo, mas nega que tenha feito qualquer ameaça. E diz estar disponível para vir a Portugal depor, uma vez que «quem não deve não teme».
O homem, de nacionalidade angolana, diz que se apercebeu de que era o visado através das notícias e que por isso decidiu reagir ao tribunal. «Permitam adiantar que enquanto cidadão angolano que se encontrava em Portugal em gozo de férias, o interesse do Exponente era de inteirar-se da real situação que deu lugar ao processo em causa [Fizz], seu andamento e tendência do desfecho, porque é licenciado em Comunicação e por isso tem ponderado criar um blogue para tratar de assuntos de interesse político e económico, tendo em atenção que este processo em concreto envolve um ex-vice-presidente do seu país, situação que reforça mais o interesse de qualquer angolano consciente», explica.
Foi, aliás, com esta motivação, diz, que se deslocou ao tribunal para assistir à sessão de julgamento e cumprimentou várias figuras, inclusivamente Orlando Figueira.
O que se passou após a sessão de julgamento
Artur João Matos conta que, após o fim da sessão, se cruzou com o arguido Orlando Figueira e a sua advogada na porta de entrada do tribunal, tendo-lhe dito que queria ter uma conversa. O encontro ficou marcado para a manhã do dia seguinte junto ao tribunal, mas acabou por não acontecer, uma vez que Figueira não compareceu.
Nessa manhã, «já de regresso ao Hotel Ibis Expo, onde estava hospedado, deu-se de frente com o senhor dr. Orlando, que ia caminhando a pé em direção ao tribunal. Havia chuvisco ligeiro e por isso ele trazia consigo um chapéu», continua Artur João Matos.
Nesse momento, refere o documento, Orlando Figueira terá dito que o encontro não poderia ter acontecido no tribunal porque andava a ser seguido pela Polícia Judiciária e, sem sequer ser questionado, disse que «a procuradora embirrou com o eng.º Manuel Vicente, pois ele não tem nada a ver com a situação». «Nem o conheço», terá insistido ainda Orlando Figueira, segundo o relato agora feito ao tribunal.
Ainda assim e apesar do pouco à-vontade do antigo procurador, terá sido combinado que a sua irmã iria ao encontro de Artur Matos ao final da tarde, no Hotel Ibis da Expo. Maria Figueira compareceu como acordado e depois de se identificar o interlocutor acabou por subir ao seu quarto onde falaram perto de 30 minutos, diz o requerimento.
«A nossa vida está desgraçada. Sou médica do meu irmão. Trabalho longas horas para ganhar um pouco mais e assim poder pagar todas as contas, as minhas e as dele. Pago até a casa dele que, ainda por cima, se encontra arrestada. Ele ficou sem carro. Estamos sem dinheiro. Está muito difícil para nós, ninguém nos ajuda em nada, só problemas», terá dito a irmã de Orlando Figueira durante o tempo em que esteve no quarto do autor do documento, reiterando que «a procuradora embirrou-se com o eng.º Manuel Vicente sem razão».
O alegado autor das ameaças defende que se o objetivo fosse realmente ameaçar o arguido não faria sentido ter escolhido o hotel onde estava hospedado. E garante nem ter qualquer interesse em ameaçar ou pôr em causa a integridade física ou a vida do arguido nem a sua vida familiar. E conclui, dizendo que também não fazia sentido que Orlando Figueira mandasse ao seu encontro no hotel a irmã, caso já tivesse sido alvo de ameaças junto ao tribunal.