Justificar os votos


À verdadeira oposição – por ora, PSD e CDS – cabe fazer o trabalho de casa e ir para a “rua”. Ao PS de Costa cabe gerir o tempo e a oportunidade.


Agora que PSD e CDS arrumaram a casa e as estratégias, inicia-se a agenda política que nos levará até às legislativas de 2019, com europeias para teste pelo meio. Como vários analistas têm acentuado, António Costa está há muito tempo em campanha eleitoral – tem estabilidade e crescimento para a instalar com convicção e programas, nomeadamente depois da tragédia dos fogos, e com ela neutraliza desde já as dificuldades esperadas para a negociação do próximo Orçamento do Estado com os partidos à esquerda. Não faz muito diferente de outros seus antecessores, em análogas circunstâncias, com a diferença de não ter a oposição que esses outros tiveram. O governo-Estado, considerado o seu poder tentacular e de decisão ainda muito centralizada, presta-se a cruzadas do género e todos o aproveitam sem censura aparente. E a comunicação bem oleada nas diversas frentes não tem deixado de aproveitar para que o desempenho role de feição. À verdadeira oposição – por ora, PSD e CDS – cabe fazer o trabalho de casa e ir para a “rua”. Ao PS de Costa cabe gerir o tempo e a oportunidade.

Rio deu esta semana o primeiro exemplo, no cenário inspirador do Piso Nobre da Biblioteca Joanina da Universidade de Coimbra. Assertivo, desafiador, direto e frontal, foi pela primeira vez a jogo e à séria, finalizando a intervenção com um bom momento explicativo sobre as súbitas polémicas que passaram, todas ao mesmo tempo, a rodeá-lo sem fim… Faltou o contraditório político e o anúncio dos recursos humanos que protagonizarão as propostas (muito claras na questão da descentralização por via autárquica), mas percebeu–se qual o caminho escolhido para marcar proativamente o percurso até 2019. De todo o modo, perdeu-se a ocasião de arrumar o ruído de fundo posto a correr. De facto, não é razoável que se deixe propagar a mensagem de que o PSD de Rio (ao contrário do PSD anti-Rio) está verdadeiramente a lutar por… 2023. A disseminação pode ser fatal para o caminho de Rio e não deixará de ser rentabilizada por Costa e Cristas na hora das deliberações dos indecisos. Aliás, essa mensagem esteve, está e estará implicitamente no discurso do CDS pós-Lamego: é irrealista ser mais votado que o PSD em 2019, mas é realista pedir o voto para o CDS se o PSD não o quer para ganhar em 2019. 

Ora, nesse pedido de votos, PSD ou CDS serão julgados pelas propostas que mais se relacionem com as aspirações da classe média (social, empresarial e estatal). E, quanto a elas, devem concentrar-se no que claramente os distingue, não tanto do PS mas, fundamentalmente, do que BE e PCP exigem ao PS. Vejamos o que hoje mais preocupa as pessoas: as suas carreiras, as suas remunerações, o seu património, as suas poupanças e as suas reformas. O que podem PSD e CDS fazer é dizer ao que vão sobre os “mínimos” – atendendo à condição financeira do país e aos apoios à economia – no que respeita à (1) reorganização e retribuição das categorias dos (diferenciados) cargos e trabalhadores em funções públicas, à (2) revisão da disciplina privada dos contratos a prazo, ao (3) reordenamento e fiscalização do regime de estágios profissionais, aos (4) incentivos fiscais no planeamento e no aforro das famílias, à (5) tutela da rentabilização do património imobiliário, ao (6) estímulo para a contratação dos mais qualificados, à (7) disponibilização de um plano a médio prazo sobre o destino das contribuições para a Segurança Social e Caixa de Aposentações. Isto é, justificar os votos pedidos no dia-a-dia e no futuro das pessoas. Se assim for, teremos mais luta do que à partida se poderia imaginar.

 

Professor de Direito da Universidade de Coimbra. Jurisconsulto

Escreve à quinta-feira


Justificar os votos


À verdadeira oposição - por ora, PSD e CDS - cabe fazer o trabalho de casa e ir para a “rua”. Ao PS de Costa cabe gerir o tempo e a oportunidade.


Agora que PSD e CDS arrumaram a casa e as estratégias, inicia-se a agenda política que nos levará até às legislativas de 2019, com europeias para teste pelo meio. Como vários analistas têm acentuado, António Costa está há muito tempo em campanha eleitoral – tem estabilidade e crescimento para a instalar com convicção e programas, nomeadamente depois da tragédia dos fogos, e com ela neutraliza desde já as dificuldades esperadas para a negociação do próximo Orçamento do Estado com os partidos à esquerda. Não faz muito diferente de outros seus antecessores, em análogas circunstâncias, com a diferença de não ter a oposição que esses outros tiveram. O governo-Estado, considerado o seu poder tentacular e de decisão ainda muito centralizada, presta-se a cruzadas do género e todos o aproveitam sem censura aparente. E a comunicação bem oleada nas diversas frentes não tem deixado de aproveitar para que o desempenho role de feição. À verdadeira oposição – por ora, PSD e CDS – cabe fazer o trabalho de casa e ir para a “rua”. Ao PS de Costa cabe gerir o tempo e a oportunidade.

Rio deu esta semana o primeiro exemplo, no cenário inspirador do Piso Nobre da Biblioteca Joanina da Universidade de Coimbra. Assertivo, desafiador, direto e frontal, foi pela primeira vez a jogo e à séria, finalizando a intervenção com um bom momento explicativo sobre as súbitas polémicas que passaram, todas ao mesmo tempo, a rodeá-lo sem fim… Faltou o contraditório político e o anúncio dos recursos humanos que protagonizarão as propostas (muito claras na questão da descentralização por via autárquica), mas percebeu–se qual o caminho escolhido para marcar proativamente o percurso até 2019. De todo o modo, perdeu-se a ocasião de arrumar o ruído de fundo posto a correr. De facto, não é razoável que se deixe propagar a mensagem de que o PSD de Rio (ao contrário do PSD anti-Rio) está verdadeiramente a lutar por… 2023. A disseminação pode ser fatal para o caminho de Rio e não deixará de ser rentabilizada por Costa e Cristas na hora das deliberações dos indecisos. Aliás, essa mensagem esteve, está e estará implicitamente no discurso do CDS pós-Lamego: é irrealista ser mais votado que o PSD em 2019, mas é realista pedir o voto para o CDS se o PSD não o quer para ganhar em 2019. 

Ora, nesse pedido de votos, PSD ou CDS serão julgados pelas propostas que mais se relacionem com as aspirações da classe média (social, empresarial e estatal). E, quanto a elas, devem concentrar-se no que claramente os distingue, não tanto do PS mas, fundamentalmente, do que BE e PCP exigem ao PS. Vejamos o que hoje mais preocupa as pessoas: as suas carreiras, as suas remunerações, o seu património, as suas poupanças e as suas reformas. O que podem PSD e CDS fazer é dizer ao que vão sobre os “mínimos” – atendendo à condição financeira do país e aos apoios à economia – no que respeita à (1) reorganização e retribuição das categorias dos (diferenciados) cargos e trabalhadores em funções públicas, à (2) revisão da disciplina privada dos contratos a prazo, ao (3) reordenamento e fiscalização do regime de estágios profissionais, aos (4) incentivos fiscais no planeamento e no aforro das famílias, à (5) tutela da rentabilização do património imobiliário, ao (6) estímulo para a contratação dos mais qualificados, à (7) disponibilização de um plano a médio prazo sobre o destino das contribuições para a Segurança Social e Caixa de Aposentações. Isto é, justificar os votos pedidos no dia-a-dia e no futuro das pessoas. Se assim for, teremos mais luta do que à partida se poderia imaginar.

 

Professor de Direito da Universidade de Coimbra. Jurisconsulto

Escreve à quinta-feira