Era uma vez uma princesa


As estatísticas sobre a igualdade de género são enfadonhas e por si só não mudam consciências. É preciso não ficar apenas pelo debate.


Era um a vez uma Princesa… assim começava, uma das inúmeras histórias que ouvi na minha infância. Saí com 18 anos, desta terra de Princesas e Heróis. Porque para ser herói, tinha o género errado, e ser princesa, não era uma opção. Levei comigo a Constituição Portuguesa, cuja leitura me imprimiu na mente, frases como "(…) para trabalho igual, salário igual, (…)". No país, onde então cheguei, a Suíça, frases destas eram e são desaprovadas.

Ao fim de 35 anos regresso à minha terra, para comemorar o dia 8 de Março. Regresso com a experiencia que a vida me deu, e a ciência formou. Não sei o que em mim, é produto da emigração, dos estudos científicos, das analises estatísticas. Nem o que resulta da discrepância entre os ideais éticos, políticos e a realidade de ser mulher, mãe, empregada. Mas regresso num desafio feminista.

Sinto algum tédio, em consultar estatísticas sobre a igualdade de género. Os progressos nos índices em prole da mulher, movimentam-se tão lentamente, que parecem tabelas sobre o percurso anual das placas tectónicas.

Portugal e o governo têm tomado medidas, feito leis, campanhas. Verdade, a situação melhora. Mas quando se inicia de tão longe, o muito que se faz, ainda não chega. A disparidade salarial entre homens e mulheres no ganho médio mensal é ainda 19,9%. Ou seja, as mulheres auferem cerca de 80% do ordenado dos homens. Se em empregos de menor qualificação, a diferença salarial é inferior, no topo da hierarquia das qualificações profissionais, as mulheres ganham apenas 72% face à media ganha pelos homens. A diferença salarial entre os gêneros acentua-se com o nível de escolaridade. De acordo com a Eurostat Portugal é um dos países, onde o gap salarial, tem vindo mesmo a aumentar.

A discriminação abrange todas as formas de participação feminina na sociedade e família. A Assembleia da República tem 230 deputados, 76 são mulheres (1/3). Desde 1975 dos eleitos 15 Presidentes desta Assembleia, meramente uma foi mulher. Dos 15 primeiros-ministros do Governo Constitucional após 1976, houve unicamente uma mulher, a desempenhar este cargo.

Portugal atingiu alta paridade entre os gêneros na educação dos jovens e na taxa de emprego. A maioria das mulheres com um ou mais filhos trabalha, e ao contrario de muitas mulheres na Europa, trabalha a tempo inteiro. Apesar disso, Portugal, é dos países da OCDE com a divisão mais tradicional de papéis entre homem e mulher: Cozinhar, limpar, cuidar dos filhos e familiares é coisa de mulheres.

A conciliação da vida profissional e pessoal, é por isso um problema que afeta assimetricamente homens e mulheres. As mulheres carregam cargas dobradas. Têm restrições a participar no mundo do trabalho remunerado e a fazer uma carreira profissional, adequada às suas potencialidades. Só 5.9% dos altos cargos de direção executiva em Portugal, são desempenhados por mulheres.

As evidencias são muitas. Mas como referi, as estatísticas são enfadonhas. E por si só, não mudam a consciência. Debatemos estes assuntos, depois vamos para casa, vestimos as nossa filhas de princesas, compramos-lhes livros da Princesinha Lillifee e levamos os campeões ao treino.

Socióloga, Deputada Cantonal de Zurique, Suíça. Texto de contributo para o debate sobre igualdade de género, promovido pela Câmara Municipal da Lagoa

Era uma vez uma princesa


As estatísticas sobre a igualdade de género são enfadonhas e por si só não mudam consciências. É preciso não ficar apenas pelo debate.


Era um a vez uma Princesa… assim começava, uma das inúmeras histórias que ouvi na minha infância. Saí com 18 anos, desta terra de Princesas e Heróis. Porque para ser herói, tinha o género errado, e ser princesa, não era uma opção. Levei comigo a Constituição Portuguesa, cuja leitura me imprimiu na mente, frases como "(…) para trabalho igual, salário igual, (…)". No país, onde então cheguei, a Suíça, frases destas eram e são desaprovadas.

Ao fim de 35 anos regresso à minha terra, para comemorar o dia 8 de Março. Regresso com a experiencia que a vida me deu, e a ciência formou. Não sei o que em mim, é produto da emigração, dos estudos científicos, das analises estatísticas. Nem o que resulta da discrepância entre os ideais éticos, políticos e a realidade de ser mulher, mãe, empregada. Mas regresso num desafio feminista.

Sinto algum tédio, em consultar estatísticas sobre a igualdade de género. Os progressos nos índices em prole da mulher, movimentam-se tão lentamente, que parecem tabelas sobre o percurso anual das placas tectónicas.

Portugal e o governo têm tomado medidas, feito leis, campanhas. Verdade, a situação melhora. Mas quando se inicia de tão longe, o muito que se faz, ainda não chega. A disparidade salarial entre homens e mulheres no ganho médio mensal é ainda 19,9%. Ou seja, as mulheres auferem cerca de 80% do ordenado dos homens. Se em empregos de menor qualificação, a diferença salarial é inferior, no topo da hierarquia das qualificações profissionais, as mulheres ganham apenas 72% face à media ganha pelos homens. A diferença salarial entre os gêneros acentua-se com o nível de escolaridade. De acordo com a Eurostat Portugal é um dos países, onde o gap salarial, tem vindo mesmo a aumentar.

A discriminação abrange todas as formas de participação feminina na sociedade e família. A Assembleia da República tem 230 deputados, 76 são mulheres (1/3). Desde 1975 dos eleitos 15 Presidentes desta Assembleia, meramente uma foi mulher. Dos 15 primeiros-ministros do Governo Constitucional após 1976, houve unicamente uma mulher, a desempenhar este cargo.

Portugal atingiu alta paridade entre os gêneros na educação dos jovens e na taxa de emprego. A maioria das mulheres com um ou mais filhos trabalha, e ao contrario de muitas mulheres na Europa, trabalha a tempo inteiro. Apesar disso, Portugal, é dos países da OCDE com a divisão mais tradicional de papéis entre homem e mulher: Cozinhar, limpar, cuidar dos filhos e familiares é coisa de mulheres.

A conciliação da vida profissional e pessoal, é por isso um problema que afeta assimetricamente homens e mulheres. As mulheres carregam cargas dobradas. Têm restrições a participar no mundo do trabalho remunerado e a fazer uma carreira profissional, adequada às suas potencialidades. Só 5.9% dos altos cargos de direção executiva em Portugal, são desempenhados por mulheres.

As evidencias são muitas. Mas como referi, as estatísticas são enfadonhas. E por si só, não mudam a consciência. Debatemos estes assuntos, depois vamos para casa, vestimos as nossa filhas de princesas, compramos-lhes livros da Princesinha Lillifee e levamos os campeões ao treino.

Socióloga, Deputada Cantonal de Zurique, Suíça. Texto de contributo para o debate sobre igualdade de género, promovido pela Câmara Municipal da Lagoa