Diogo Feio: ‘O CDS pode conquistar votos à esquerda, à direita e ao centro’

Diogo Feio: ‘O CDS pode conquistar votos à esquerda, à direita e ao centro’


Diogo Feio rejeita a tentativa de acantonar o CDS e garante que o partido está em crescimento. Diz que Cristas fez bem em reunir primeiro com o PSD, ao contrário do que fez Rio


Há um ano e meio deu uma entrevista em que dizia não perceber o projeto político do PSD e em que olhava para o Ciudadanos como exemplo de crescimento. O Diogo Feio é vidente e não disse a ninguém?

Não sou, não (risos). Em política, o caminho faz-se caminhando. O CDS tem cumprido. Cumpriu os objetivos a que se propôs do ponto de vista eleitoral. Nos Açores, mais votos, mais percentagem, mais deputados. Nas autárquicas, é preciso relembrar o último congresso, em que a líder do partido [Assunção Cristas] apresentou, por um lado, a vontade de o CDS ir sozinho à Câmara de Lisboa, o apoio a um independente, que é Rui Moreira no Porto, e o apoio à solução de coligação em Cascais. Curiosamente, as três apresentadas no congresso foram as três vencedoras. Indo a Lisboa, lembra-se que ninguém acreditaria que o CDS teria 21% e quatro vereadores e passar a ser a segunda força política na capital? Isso foi possível. Lisboa não é o país, evidentemente, mas o trabalho que foi feito em Lisboa com Assunção Cristas é um trabalho repetível para o resto do país. Com isto, o CDS assume-se como uma força política relevante para que seja possível numa maioria de 116 deputados diferente daquela maioria que atualmente temos com o Partido Socialista, Bloco de Esquerda e PCP. Em Lisboa, dos três vereadores que o CDS ganhou, dois foram retirados ao PS, que antes tinha maioria absoluta. Deixou de a ter. 

Foi o CDS que tirou a maioria a Fernando Medina?

Absolutamente. Não tenho qualquer dúvida disso. 

Falando em maioria parlamentar de direita. Rui Rio, novo líder do PSD, insiste que deve governar quem ficar em primeiro lugar nas legislativas e não quem tem uma maioria parlamentar. Assunção Cristas diz o oposto. A direita está em contradição? E voltará a governar enquanto em contradição? 

A resposta é muito simples: a realidade. Foi a realidade que acabou por se impor após as últimas eleições. Uma realidade, todavia, que não tinha sido explicada. Isto é: ninguém dissera aos eleitores portugueses, que contavam com essa tradição de governar quem ganhasse, que o partido que ficasse em segundo lugar poderia governar. Nesse plano, o CDS é hoje transparente perante o eleitorado. A realidade alterou-se, portanto, passámos a ter uma circunstância em que a relevância política está em quem tenha uma maioria. Ninguém poderá ficar espantado que o CDS participe numa maioria que seja alternativa à do PS. O critério do partido é totalmente transparente.

Mas o ‘parceiro natural’ também é transparente e diz, transparentemente, o oposto disso. 

É. Mas, repare, eu só posso falar pelo CDS. Não posso falar por outros…

A minha pergunta é: como é que um partido pequeno e que está em crescimento – acho que podemos concordar que não é (ou ainda não é) um partido de poder…

É um partido que está em crescimento e que passou por várias fases. Com Paulo Portas deu um passo muito importante que foi o de voltar ao arco de poder. Depois de muito tempo em que o CDS não participava em soluções governativas, com Portas, passou a ser natural para o eleitorado olhar para o CDS como um partido de governo. As coisas fazem-se por passos. Agora está a dar-se outro passo importante. 

Que é…

Que é a máxima ambição eleitoral. Ser, por um lado, um CDS não acantonado. E, por outro, um CDS que apresenta propostas para todo o eleitorado de uma forma descomprometida. 

Está a falar num módulo de partido ‘catch-all’, como o PS ou o PSD. 

Independentemente das qualificações, aquilo que eu quero e que tem acontecido é que o CDS apresente propostas que sejam facilmente compreensíveis por todos. Há sempre uma tentativa de acantonar o CDS…

Acantonar o CDS em quê, ideologia?

Já lá vamos… Primeiro, pretendem acantoná-lo a um espaço de natureza política de um determinado eleitorado, mais conservador, mais tradicionalista. Num qualificativo geométrico, mais de direita. 

Isso prejudica o CDS? 

Com certeza que quanto menos acantonado estiver um partido, mais capacidade tem de evoluir… Isso parece-me um raciocínio evidente. 

Está a dizer que quanto menos à direita melhor para o partido.

Não tem a ver com isso. Tem a ver com algo mais simples: quanto mais direto o CDS for nas suas propostas, quanto mais relevantes estas forem, quanto maior a capacidade do CDS perceber os novos tempos, quanto mais moderno for na forma de transmitir a sua mensagem – como aconteceu para a Câmara Municipal de Lisboa… Essas são grandes vantagens. Assunção Cristas foi muito inovadora, foi diferente do que as pessoas estavam habituadas. Não era normal ver-se um líder de partido no meio do trânsito. Não era normal ver-se um líder de partido colar cartazes. 

Marcelo Rebelo de Sousa tem banalizado esse tempo de contacto mais intenso com a rua, mesmo que não se trate de um líder partidário…

Estamos a falar no plano partidário. Mas eu não nego que a campanha de Marcelo Rebelo de Sousa para as eleições presidenciais foi um ponto importante na viragem da comunicação política. Não nego isso.

O CDS também não rejeita essa nova realidade, é isso que está a dizer-me. 

Essa realidade e outras realidades… Mas deixe-me explicar com clareza: eu gosto e quero um CDS com grande ambição. E o CDS, para ter essa ambição e não nos ficarmos apenas por uma palavra, tem de ter atos consequentes com essa ambição. 

Por exemplo?

A apresentação de propostas claras em matéria de Saúde, Educação, Segurança Social, Justiça, Demografia, envelhecimento ativo. Nestes dois casos, estamos a falar de problemas que têm surgido com grande força nos últimos dois anos. Temos de acompanhar isso como estamos a acompanhar a revolução económica que se sente vinda do mercado digital. Tem de haver soluções políticas novas para problemas novos. O CDS está na primeira linha para compreender os problemas tradicionais e não deixa de procurar compreender estes novos problemas. 

Quando fala em máxima ambição, a demarcação do PSD é natural nesse processo?

O CDS tem um adversário: chama-se Partido Socialista. Tem um segundo adversário, que é a maioria parlamentar que sustenta o governo do Partido Socialista. E tem, depois, concorrentes eleitorais. A partir do momento em que os partidos vão cada um por si é natural que concorram, mas isso não tem nada de dramático. 

Como comenta o facto de Assunção Cristas, quando foi eleita presidente do CDS, ter reunido primeiro com Passos Coelho e só depois com o primeiro-ministro, enquanto Rui Rio foi primeiro a António Costa e só depois ao CDS?

Posso dizer-lhe uma coisa: acho que Assunção fez bem em fazer como fez. 

As discussões identitárias nos partidos não têm exatamente finais felizes. Basta olhar para o PSD. Receia que isso aconteça no CDS?

De todo. Há coisas que as pessoas percebem bem: não vale a pena estarmos a entrar em discussões de natureza ideológica dentro dos próprios partidos. Isso não tem qualquer sentido. O CDS é um partido de princípios e princípios que estão muito marcados desde a sua origem. Aquilo que eu defendo não é um partido ideológico, é um partido que com base em princípios faz propostas aos eleitores. Sobre estas, deixamos o juízo aos próprios eleitores… Não vamos entrar em discussões que não temos de fazer. Não sinto, sinceramente, que haja um grande movimento para as fazer… O CDS é um partido aberto ao eleitorado nacional. 

É mais difícil levar as propostas que refere aos ouvidos do eleitor quando a maioria de esquerda as chumba consecutivamente.

Não… As pessoas conhecem-nas. Transmiti-las também é a nossa obrigação. São propostas moderadas, simples, que vão de encontro às necessidades das pessoas, que constituam uma novidade. Nestes dois anos, é isso que se tem feito na Assembleia República. Veremos o que proporcionará. Eu nunca patrocinei lógicas de ultimato aos eleitores – normalmente não são bem aceites -, mas posso dizer-lhe que a matéria das finanças públicas não deve ser central nas propostas alternativas ao Partido Socialista.

Está a dizer que um discurso economicista não chega. 

Estou a dizer isso e outra coisa. É curioso que, hoje, os grandes representantes da lógica monetarista e da lógica da austeridade em Portugal sejam o PS apoiado pelo PCP e pelo Bloco de Esquerda. Hoje, quem representa em Portugal a linha política de Schäuble é António Costa e Mário Centeno. 

O CDS não foi exatamente contra essa política quando esteve em governo.

Mas tinha um programa e um memorando de ajustamento… Esta lógica que António Costa hoje assume é a total despreocupação com tudo o resto. É por isso que Portugal precisa de um partido que defenda os serviços públicos e é por isso que eu acho que o CDS deve ser esse partido. António Costa fez duas opções: a defesa até ao limite dos objetivos orçamentais, com o prémio de Mário Centeno no Eurogrupo; e, depois, a defesa do Estado-patrão. O Estado que paga aos funcionários públicos – e eu também sou funcionário público e falo à vontade disso -, mas isso faz com que seja importante alguém que defenda o Estado que presta serviços públicos e essenciais. 

Está a dizer que é possível defender o Estado social sem ser socialista. 

Estou precisamente a dizer isso. Estou a dizer que é preciso alguém que coloque em prática aquilo que foi, neste últimos anos, retórica e apenas retórica da esquerda. Há um problema de funcionamento do Estado e esta governação não faz nada por resolvê-lo. Aliás, só o agravou. Eu não embarco na lógica de colocar António Costa no centro da vida política. Isso é falso. Quem tem estado no centro da vida política é o Presidente da República e não o primeiro-ministro, que tem boicotado e travado todo e qualquer acordo de médio prazo sobre matérias verdadeiramente centrais para o nosso país. 

“Acordos” parecer ser a palavra do ano 2018. 

(risos) Sobre os acordos, para nós, são feitos no parlamento. Não chegam ao parlamento no fim. É no parlamento que devem ser iniciados, não é no parlamento que devem ser terminados em sessão festiva. Fala-se muito da necessidade de defender o interior – e o CDS fará o seu congresso em Lamego como um sinal de reconhecimento mesmo -, mas o governo adota uma postura de fingidor e passa-culpas. Ora a culpa é dos contribuintes e dos proprietários que têm obrigação de limpar as matas sob pena de terem este ano o dobro da multa, ora é das freguesias ou das Câmaras. Parece que o governo não tem nada a ver com isto. É inaceitável. Costa não quer acordos nenhuns sobre matéria que seja porque o único objetivo é fugir a responsabilidades. E é também por isso que o PS merece toda a nossa oposição. 

Disse que é errado colocar António Costa “no centro da vida política”. O PSD de Rui Rio não está a fazer isso mesmo? 

O objetivo do CDS é, sendo uma alternativa política, destruir a ‘geringonça’. O CDS quer afirmar-se como oposição e vai fazer tudo para que seja uma solução política diferente desta. Por isso, criticara sempre os que fizerem parte dela. Não criticará aqueles que não fazem parte dessa solução política. 

A descentralização de responsabilidades não é novidade no governo. Nem isso nem a já referida degradação dos serviços públicos suscitaram qualquer consequência na popularidade… 

Está a falar de sondagens?  Quando se estava a um ano das eleições autárquicas de 2017, quais eram as intenções de voto do CDS em Lisboa? Eram baixas. E os resultados foram os melhores de sempre. O CDS está a fazer o seu trabalho e está a fazê-lo há dois anos. Não está a fazê-lo em cima dos atos eleitorais. 

Se o CDS é oposição ao PS e a esta lógica de governo também será oposição a quem contribuir para a manutenção desta lógica? 

O CDS é oposição a esta solução e a quem tem votado constantemente a favor dos orçamentos, dos programas nacionais de reforma, dos programas de estabilidade. Quem tem sido? O PS, o PCP e o Bloco de Esquerda. Não deixa de ser fantástico que o Bloco de Esquerda que diz o que diz sobre o euro e sobre a Europa tenha votado todos os documentos que o PS necessita para apresentar em Bruxelas. O CDS fará o seu caminho por si, despreocupadamente, porque esse caminho está traçado há muito: somos oposição moderada e firme a este governo, somos oposição com propostas claras, que alcançam um eleitorado de esquerda, de centro e de direita. Porquê? Porque são propostas boas para o país. Não são feitas com base em dogmas fechados. 

O paralelismo que fez há com o Ciudadanos há um ano e meio era um paralelismo de crescimento e não de ideologia. Mas a verdade é que os novos movimentos ao centro, como esse ou o de Macron, têm uma tendência federalista que o CDS não tem na Europa. É possível ser fresco sem isso e com uma base de natureza mais conservadora? 

Sobre a matéria europeia, ela não é uma questão problemática ou divisora no CDS. Nem todas as pessoas no partido têm de ver a Europa da mesma forma. Aquilo que se alcançou como aspeto positivo é um acordo sobre matérias europeias. Para mim é claro que deve haver mais Europa e menos Bruxelas, assumindo-me eu, claramente, como um defensor de soluções que sei que não são apoiadas pela maioria do meu partido.

Está a falar do federalismo.

Disso e de outras matérias. Mas o que estou a dizer é que, ao contrário do que aconteceu noutros tempos, em que eu me sentiria mal por ter essas posições, isso, hoje, não se sucede de todo. O CDS é um partido amigável para acordos sobre matéria europeia, e o mesmo não se pode dizer sobre quem sustenta o atual governo. Quem se senta à quarta-feira a segredar a Merkel é a mesma pessoa que abraça à quinta-feira Catarina Martins e Jerónimo de Sousa. Isto é que não é sustentável. Por outro lado, posições diversas sobre a Europa – entre as soluções federalistas e as soluções intergovernamentais, partindo de um mesmo ponto comum – são. Isso acontece no CDS e não é um problema, como acontece em alguns outros partidos e também não é um problema. Eu falei com Nuno Melo sobre a sua moção ao congresso e temos diversos pontos de vista em comum – faço uma avaliação muito positiva do modo como exerce o seu mandato. 

Olhando para a sua geração política, com que líder europeu se identificou mais: Emmanuel Macron ou David Cameron?

(risos) Para mim, essa resposta é relativamente simples e não deverá ser surpresa para si. Emmanuel Macron foi capaz de ir a eleições com um discurso que todos pensavam impossível. E ganhou. Num momento em que a reação ao fracasso dos partidos tradicionais se fez por forças radicais – do Syriza à extrema-direita -, em França, a reação fez-se com um projeto moderado. Em Espanha, veremos se isso será uma realidade eleitoral. Eu acredito que o CDS poderá representar isso em Portugal. 

E um bom resultado nas europeias, qual seria? Nuno Melo já não ser o único em Bruxelas?

Eu acredito profundamente que assim será. 

E o Diogo poderá ser um dos nomes a juntar-se a ele em 2019?

Não, de todo. Estou muito satisfeito com o que faço aqui em Lisboa, seja profissionalmente, seja academicamente, seja no partido, devo dizê-lo. 

Está indisponível?

Totalmente indisponível para essa hipótese. É um capítulo que se fechou, mesmo que se trate de um capítulo que me deu gozo. Independentemente disso, estarei totalmente empenhado na eleição. Se assim for a vontade, quer da Assunção Cristas, quer de quem liderar a lista, participarei ativamente nessa campanha, demonstrando que o CDS é uma casa europeia onde cabem tranquilamente visões diversas. 

Se não o Diogo, quem seria um bom candidato ao lado de Nuno Melo?

Na altura certa, a presidência do partido irá dizê-lo. É ela que tem essa comunicação e estou certo que será uma boa escolha, não lhe dizendo mais do que isso, deixo claro que vejo muita gente no partido e na órbita do partido que o pode ajudar a ter uma participação ainda melhor – que é o nosso objetivo.

Muita gente? Por exemplo?

Eu sempre fui contra antecipações de competências que não as minhas e de notícias que não tenho de dar. 

É no Adolfo Mesquita Nunes que está a pensar?

Vejo muitos bons candidatos ao Parlamento Europeu e acho que o Adolfo Mesquita Nunes é, entre os políticos do CDS, um dos mais completos que temos nos nossos quadros. Neste partido, dificuldade de escolha é coisa que não há.