O titular da pasta da Justiça no governo de Mariano Rajoy negou, numa entrevista à Antena 3, que haja qualquer negociação entre o executivo de Madrid e a maioria independentista no parlamento catalão sobre uma troca entre uma eventual desistência da investidura de Carles Puigdemont pela libertação dos líderes catalães, que continuam presos, entre os quais, o vice-presidente, Oriol Junqueras.
Rafael Catalá mostrou-se convicto, nessa entrevista, que todos os líderes catalães presos e os exilados em Bruxelas vão ser inabilitados e privados dos seus direitos políticos pela justiça espanhola. O ministro deixou claro que se o parlamento catalão não se despacha a encontrar um líder aceitável para Madrid, serão convocadas novas eleições na Catalunha, e que o governo tem a esperança que nessas possa sair um resultado mais do seu agrado.
O homem que tutela o Ministério Público espanhol, cujo Procurador-Geral, responsável pela acusação do Estado depende hierarquicamente dele, está bem informado: o El País adiantou, citando fontes judiciais, que o juiz do Supremo Tribunal espanhol, Pablo Llamares, vai inabilitar o presidente Carles Puigdemont e os quatro ministros que estão em Bruxelas; e também os independentistas presos, como o vice-presidente, Oriol Junqueras, e o líder da ANC, e segundo nas listas da coligação liderada por Puigdemont, Jordi Sànchez. Essa decisão será tomada até ao final do mês de março.
As fontes do Supremo Tribunal asseguram, segundo o diário de Madrid, que é «previsível» que em março todos estes políticos sejam processados pelos crimes de utilização ilícita de fundos para o referendo de 1 de outubro, sedição e rebelião. O que garantiria que os principais líderes independentistas não pudessem ser escolhidos para o novo governo catalão, e que em caso de novas eleições, não poderiam concorrer nas listas.
O argumento jurídico, que permite que pessoas possam perder os direitos políticos antes de serem condenados em tribunal, é o artigo 384 da Lei de Processo Criminal, permitindo que alguém acusado do crime de rebelião possa ser privado de direitos políticos sem ter sido julgado nem condenado. Rebelião é um crime que na tipologia da lei espanhola implica a utilização de violência armada. O alargamento da sua utilização na acusação permite à justiça espanhola tirar da disputa eleitoral e do terreno político os principais líderes independentistas, devido à gravidade do delito no Código Penal espanhol, crime sancionado com penas até 30 anos de prisão.
Dado o papel da acusação do Estado, tutelada pelo governo, parece que o executivo espanhol pretende resolver a questão catalã nos tribunais e para o fazer de uma forma eficiente vai acusar ainda mais deputados e dirigentes independentistas catalães.
Na quinta-feira, o Supremo Tribunal confirmou que iam ser acusados mais líderes independentistas que teriam participado na direção e na planificação da «criação de um Estado soberano». Os novos nomes que vão ser ouvidos em tribunal são acusados de ser independentistas e pretenderem concretizar essa independência de «uma forma ilegal». Sendo que não há forma na Constituição espanhola de a concretizar de uma forma legal. O que não deixa de ser um contrassenso: do ponto de vista político, é possível um independentista se candidatar para tudo menos para cumprir o seu programa, mesmo que, como na Catalunha, tenha a maioria absoluta dos deputados.
A acusação do Estado pretende abranger todos os elementos do denominado, pelas autoridades policiais, «comité estratégico» do processo soberanista, que reuniria os líderes dos três partidos independentistas com as direções das principais associações independentistas. Nesse sentido, o juiz do Supremo Tribunal Pablo Llarena, convocou para prestar declarações as dirigentes da CUP Anna Gabriel e Mireya Boya; a secretária-geral da ERC, Marta Rovira, e a número dois do partido de Puigdemont (PDeCAT), Marta Pascal; o ex-presidente da Generalitat e do PDeCAT, Artur Mas; e a ex-presidente da Associação dos Municípios pela Independência, Neus Lloveras (PDeCAT).
Quando uma semana antes das eleições de 21 de dezembro, que voltaram a dar a maioria absoluta aos independentistas, a vice-presidente do governo espanhol, Soraya Sáenz de Santamaría, se ufanava de ter «decapitado» a liderança dos independentistas, a sua afirmação podia não ser verdadeira. Mas agora, o governo de Madrid pretende garantir que, quando convocar umas próximas eleições, as condições sejam mais favoráveis para que os catalães declarem nas urnas o que Rajoy pretende que digam. Nas próximas eleições, grande parte dos atuais deputados independentistas, e seus principais quadros, estarão proibidos de concorrer.
Enquanto isso não acontece, o governo do PP continua a governar a Catalunha, apesar de ter tido apenas 4,25 % dos votos, tendo a seu lado a força dos tribunais e, em última instância, a forças de segurança, para impor a ordem.