Com a eleição de novo líder no PSD, concluiu-se o interminável processo de sucessão de Passos Coelho. Em rigor, o conhecimento dos resultados das directas extinguiu o longo calvário que o partido atravessava desde que o desenho político de António Costa virou a mesa depois das eleições de 2015. Na perspectiva dos militantes (por muito reconhecidos que estivessem aos esforços feitos depois da perda do poder conferido nas urnas) e dos eleitores (mais os potenciais do que os fiéis) era urgente que assim acontecesse – tanto por razões ideológicas (pois só a clarificação poderá trazer a identidade de um programa alternativo, num partido tradicionalmente aberto à flexibilidade de ideários), como por definição personalista (as escolhas do eleitorado moderado têm um grande sustento na fidúcia estabelecida com a pessoa do líder, sendo talvez maioritárias as opções dos indecisos feitas tendo esse referente). Fosse Rio ou Santana a vencer, o preliminar auto-afastamento de Passos foi um pressuposto entregue ao partido e ao sistema. Chegou agora a hora de o traduzir.
Por um lado, este novo tempo vai permitir aclarar o relacionamento do PSD com o PS. São os partidos de captura do poder e temos que saber com que linhas se costura a sua reciprocidade. Por isso, não é de somenos a posição de Rio – ganhar e, se não for possível, permitir que o PS se liberte do jugo parlamentar de PCE e BE. Se quiserem, este é trunfo comparativo – obrigar Costa a explicar aos eleitores o que não explicou (e já sabia que podia explicar) em 2015. Assim já só falta saber o que Costa dirá em 2019 no contexto de vitória sem maioria – fica na mesma ou avança para o “plano Guterres”. Se nada disser, numa questão (que passou a ser central) de regime, o PSD capitaliza. Não será irrelevante no apuramento final das contas.
Por outro lado, proporciona a transparência com o CDS. Rio fez a sua ascensão política regional e, depois, a sua consolidação nacional por força do entendimento à direita. Não há notícia de grandes clivagens e diferenças abissais durante os 12 anos de gestão municipal no Porto. Transportar essa lógica para o país poderá ser decisivo para a determinação de uma “entente” nuclear para a plataforma eleitoral que se terá perdido com a saída de Paulo Portas. E será uma alavanca importante para estabilizar as práticas de “social conservadorismo” em que muitos eleitores se revêm – nisso Rio é o mais próximo que o PSD tem do legado de Cavaco Silva – e discutir o aparelho estadual e social montado à volta da convergência das esquerdas.
Ademais, há que reajustar o relacionamento com Marcelo, enquanto depositário da competência de arbitrar e julgar os acordos feitos para a governação de um partido sem maioria. A erosão da solução parlamentar vigente pode vir a culminar na irreversibilidade da sua repetição em 2019, mesmo que parcial (sem o BE ou o PC). Se assim for, Marcelo tenderá a fazer uma observação centrada na cooperação que o PSD – e o CDS – possam realizar com o PS no entretanto, nomeadamente a propósito do último Orçamento de António Costa. Esse juízo – que Marcelo já anunciou com a apologia de uma “oposição forte” – será o azimute para tomar a opção pós-eleitoral. E nessa opção estarão naturalmente subjacentes as dinâmicas trilhadas até lá por Rio e Cristas.
Neste tempo de conjunturas, superficialidades e generalidades, o mais importante que os militantes do PSD decidiram foi abrir caminho para algo de estrutural e estratégico. Para além de sanar os traumas, Rio tem essa responsabilidade em mãos e nela vingará (ou não) o seu futuro e o futuro dos seus.
Professor de Direito da Universidade de Coimbra. Jurisconsulto
Escreve à quinta-feira







