Quando não há estratégia e comando comunicacional, com vários protagonistas a falarem, a probabilidade de pronuncia de disparate é grande. É claro que há sempre aquela técnica de deixar cair uma declaração para que uma ideia faça o seu caminho de sensibilização pública ou de colocar uma fonte a soprar uma caixa para os media, mas a reincidência de impreparação política e de disparate teima em distrair as atenções do que dizem serem os temas e os debates desejados e até da pretendida valorização política de alguns resultados obtidos. É caso para questionar que, se não sabem o que dizer e como dizê-lo com eficácia, porque não se calam e governam? Porque insistem na incoerência política ou na marcação da agenda mediática com declarações que pouco dizem aos portugueses, mas muito significam para as tentações do exercício do poder, o modelo de funcionamento das instituições e a sociedade que se pretende? Porquê tanto alarido com os aproveitamentos político-partidários com os deslises que, no passado bem recente, foram também protagonizados por quem agora está no recato da proximidade ao poder.
Com o poder a gerir as circunstâncias e uma oposição a procurar superar a herança, é urgente estancar os erros discursivos, que são desculpáveis num contexto de desnorte da oposição, mas poderão ser letais se esta afinar o azimute, o Presidente da República acentuar os sinais divergentes ou a conjuntura mudar. É certo que, qualquer que seja o protagonista laranja emergente da soporífera contenda partidária, o grau de ameaça está condicionado pelos seus passados pessoais e coletivos, pelas proximidades e afastamentos em relação ao primeiro ministro em funções e pela sua capacidade de regeneração. No caso de Rui Rio com um valor facial muito acima do valor real, em relação a Santana Lopes com um valor real acima do valor facial emanado da passagem pela liderança do governo. Um e outro têm de resolver esse problema dos passivos acumulados no passado. É que mesmo Rui Rio, do alto da sua alegada superioridade moral, nunca se deve esquecer que, marcas negativas denunciadas por Paulo Morais, acompanharam a sua gestão autárquica até ao desfecho da limitação de mandatos. Portanto, moralidade zero. Para quem saiu e para quem permitiu que a situação perdurasse no tempo.
Não é menos certo que o PSD tem um problema de relação com o passivo acumulado nos anos da governação além do memorando da Troika, como o PS tinha e tem, porque não o deixaram que fosse resolvido, um problema com opções políticas anteriores a 2011 e com as soluções plasmadas no memorando de ajustamento económico. Ambos contam com a falta de memória, a falta de rigor e o tempo para a superação dos traumas e da perceção da população em relação a esses períodos de responsabilidades governativas. O PS com a vantagem de exercer o poder no quadro da solução governativa apoiada pelo PCP e pelo Bloco de Esquerda. O PSD com a desvantagem da conjuntura e da memória ainda viva da acutilância das medidas nas áreas sociais e económicas em que agora critica as situações e os resultados da atual governação. Pedro Passos Coelho não conseguiu acertar no registo, o atual não cola com o passado da governação até 2015, o futuro como será?
Este é o tempo dos militantes do PSD fazerem as suas opções de liderança, num quadro de normalidade partidária. O que não é normal é a sucessão de disparates políticos.
Como é possível haver alguém que ache que um titular de cargo político, no exercício dessas funções, tem “opiniões pessoais” sobre temas de governação e de funcionamento do Estado de Direito que não vinculam politicamente o governo? Como é possível que num momento em que se exercita a argumentação de separação de poderes entre poder político e poder judicial para responder às pretensões de Angola em relação a um processo judicial, um membro do governo verbalizar uma proposta em relação à Procuradora Geral da República que transporta toda uma dimensão de sobreposição de motivações políticas ao funcionamento do sistema judicial. Logo agora, no atual contexto nacional e internacional, com os processos judiciais em curso.
Como é possível tanta proatividade numas coisas e um mar de inação noutras, relevantes para as pessoas, para o país e para o funcionamento de um Estado de Direito com quase quarenta e quatro anos de vida.
Há demasiada geometria variável. É mau para a justiça. É mau para o País.
Continuam a haver demasiadas linhas vermelhas de bom senso a serem ultrapassadas, deixando espaço para a saturação, o alheamento ou a eclosão de novas realidades de rutura com os poderes e os modelos instalados.
Continua-se a abusar da sorte, sabendo que esta dá trabalho.
NOTAS FINAIS
MOBILIZE-SE. Agora que os partidos que apoiam a solução governativa deram em agitar quando não convencem o PS para determinadas soluções, entrou-se num suposta espiral cívica em proliferam as iniciativas para tentar atingir os fins “inconseguidos” desses partidos, sem nunca mencionarem os custos dessas opções para os contribuintes. É a chamada “Água mole”, se não furar.
SUBLINHE-SE. Os resultados do desemprego são positivos, apesar das fragilidades das oportunidades laborais criadas, nos vínculos e nas remunerações. É continuar, sem desestabilizar.
ATINE-SE. Acalentar a súbita paixão da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa pela entrada no Montepio para influir na contenda pela liderança do PSD é esquecer que depois de eleito o líder há uma decisão para ser tomada. E a conversa do “dinheiro para os pobres” devia ter sido invocada ao longo de boa parte do mandato do anterior Provedor.
Militante do Partido Socialista, Escreve às quintas feiras