Anda, conta-me tudo.
Não conto a ninguém. Sou aqui estou eu, tu e esta conversa. Conta-me como estás mas como estás mesmo. Não me dês respostas para me calar. Estou com tempo.
Sei que gostas do ano novo. Mais do que alguma vez gostaste. Tens vontade que “o ano vire” para que este ciclo acabe e porque foi durante este ano que soubeste a notícia que virou o teu mundo ao contrário. Tens, não só, pressa que o ano termine (na esperança que o seu fim leve com ele os maus anúncios) mas sobretudo, que outro comece. Como se obrigatoriamente a 1 de Janeiro, nascesses de novo. E nascesses mais fresco. Porque Janeiro sabe a novos inícios e tu só queres que liguem a luz e que o dia nasça outra vez.
Quanto ao Natal, não é que gostes menos – talvez nunca o tenhas valorizado tanto – mas é uma época de certa forma nostálgica – as luzes, as músicas, a família que se reúne e tu com uma maior vontade de os ter contigo. Para sempre. O Natal é mais bonito este ano mas mais custoso também, porque o amor ganhou outra dimensão. E amar assim é exigente.
Anda, conta-me tudo. Deixa-me, aliás, adivinhar. Estás bem. Não estás nem tão forte como parece, nem tão em baixo como é suposto. Estás. Cheio de coisas, cheio das tuas coisas, com uma esperança que surge de repente sem esperares e uma saudade do que ainda estás a viver e que te abala também, de surpresa. Estás mais cansado. Não me refiro às dores no corpo e à sonolência causada pela medicação mas estás mais cansado emocionalmente – porque viver com tudo, cansa. Estás dividido entre os sorrisos dos que amas e as lágrimas que não vês cair mas que adivinhas. Só queres estar bem e saudável mas também tens momentos em que se te deixassem em paz, era um favor que te faziam.
És uma montanha russa de tudo e apesar de confuso, nunca estiveste tão lúcido. Nunca soubeste com tanta convicção que és amado, desejado, que te querem por perto. Nunca soubeste com tanta razão que a alegria dos teus filhos são o teu maior motivo para que fiques por cá.
Conta-me tudo. Diz-me como te sentes. O medo já foi maior. Agora nem é o medo que te atrapalha – é o tempo. É o tempo que está desregulado e passa demasiado devagar, quando se espera uma notícia e demasiado depressa, quando olhas para trás e o vês andar.
Estás mais sensível também, não porque te sintas infeliz – não é esse o estado que te cabe – mas porque parece que tudo ganhou uma intensidade astronómica. Até as refeições passaram a ser intensas, mais saboreadas, mais gostadas, mais presentes. Tudo ficou maior e cada palavra que te dizem tem um impacto brutal em ti. Não te sentes triste. Não é isso. Sentes-te até empurrado por alguma força desconhecida, por um estímulo extra, por um riso superior, mas nunca tiveste tanta vontade de chorar. Choras e nem sabes ao certo porquê. Choras porque és grato, choras porque amas, choras porque queres ficar.
É isso, não é?
Sabes, acho que não te deves julgar. Não importa que chores mais, que grites mais, que rias mais, que queiras mais, que seja tudo mais. Não te castres. Não te cales. Não repares se é tudo mais exagerado. É tudo mais verdadeiro também. Sente com uma explosão verdadeira. Sente cada pormenor e deixa que te saia pelos poros, toda essa intensidade. Não está tudo bem mas também não está tudo mal. Está tudo. Tudo está a acontecer.
Não te escondas, não disfarces, não omitas. Não deixes nada por viver.
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