Quando eu entrei para o Instituto Superior Técnico, em 1986, o computador que os alunos usavam nos seus trabalhos chamava-se VAX. O VAX era um equipamento gigantesco que ocupava três salas inteiras. A capacidade deste enorme computador, onde eu (ainda não há tanto tempo assim) aprendi a programar, era mais de mil vezes menor do que a do pequeno portátil que usei para escrever este texto (megabytes no primeiro caso, gigabytes no segundo caso) – isto apesar de o meu pequeno portátil, mais de mil vezes mais potente que o VAX, ocupar um volume, seguramente, mais de mil vezes menor do que aquele que era ocupado pelo VAX.
Na história da humanidade, uma evolução tecnológica tão grande, num tão curto espaço de tempo, nunca tinha ocorrido antes. Para percebermos melhor o que aconteceu, nas últimas décadas, naquilo que respeita à evolução da capacidade dos nossos computadores e sistemas informáticos, uma comparação possível seria a seguinte: se nas últimas décadas tivesse existido uma evolução semelhante na tecnologia dos motores, a potência dos reatores do foguetão Apollo 11, que em 1969 colocou o primeiro homem na Lua, estaria disponível em 2017 para ser montada em qualquer bicicleta ou mesmo, provavelmente, em skates e patins em linha.
Curiosamente, esta evolução dos computadores, totalmente disruptiva relativamente a tudo o que aconteceu antes, foi prevista em 1965 por um químico chamado Gordon E. Moore. Moore disse, quase profeticamente, que o número de componentes por circuito integrado (as memórias dos computadores) duplicaria a cada dois anos que passassem. Essa conjetura, que acabou por ficar conhecida como Lei de Moore, tem-se verificado nos últimos 50 anos, sendo de prever que se mantenha por mais alguns anos (talvez até à primeira metade da próxima década).
Naturalmente que a conjetura que Moore fez não foi uma profecia. Foi apenas uma previsão baseada na sua análise à capacidade de miniaturização dos componentes eletrónicos, que já então se verificava. Enquanto um transístor, em 1950, tinha uma dimensão em torno de 1 centímetro, atualmente podem ser produzidos industrialmente transístores com dimensões bastante inferiores a 0,00001 centímetros (100 nanómetros). É esse o segredo da espantosa evolução dos computadores a que todos assistimos durante as nossas vidas: a capacidade de manipular e processar materiais, produzindo componentes eletrónicos ou eletromecânicos com dimensões da ordem de algumas dezenas de nanómetros. A chamada nanotecnologia chegou, pois, aos nossos dias e ao nosso léxico.
Em breve, esta capacidade de miniaturização irá diminuir e a Lei de Moore deixará de poder continuar a ser seguida. Efeitos físicos (nomeadamente, efeitos de superfície e efeitos quânticos) impedirão, muito provavelmente, que componentes com dimensões muito menores do que alguns nanómetros continuem a ter o mesmo desempenho. Contudo, os atuais conhecimentos de química, de física e de ciência de materiais, bem como os instrumentos e ferramentas de que atualmente dispomos, permitiram ao homem, pela primeira vez, dominar as tecnologias que lhe abrem as portas para poder criar e manipular sistemas com dimensões semelhantes às dimensões das unidades fundamentais da vida: a largura da cadeia de ADN é, precisamente, de alguns nanómetros.
E agora? Para onde isto nos vai levar? Estas e muitas outras questões fundamentais, que seguramente se irão colocar à espécie humana não só no futuro próximo mas já no presente, são abordadas de forma apaixonante no livro recentemente lançado “Mentes Digitais”, de Arlindo Oliveira, investigador e presidente do Instituto Superior Técnico. Vale a pena começarmos todos a visitar estes assuntos.
Professor de Engenharia de Materiais do IST