Manos e manas


Desde 2010 que não vinha a Timor-Leste, o país onde todos somos manos e manas. É a expressão que o povo usa no trato diário. Reconfortante, amistosa e, de certa forma, carinhosa. 


Uma marca distinta de um povo massacrado por anos de ocupação indonésia, por perseguições, pela luta de independência e pelo suor da recuperação de uma identidade perdida, fruto da colonização portuguesa, holandesa e, repetindo, anexação indonésia.

Sete anos passados, infelizmente, não encontrei um país melhor e confesso que tinha essa esperança. Em 2010, o país estava ainda ocupado. Não por forças beligerantes, mas pelas Nações Unidas, por hordas de consultores australianos e portugueses que, de certa forma, colonizavam o país.

Nessa altura transparecia dinamismo e o país parecia avançar a bom ritmo. A verdade é que, se, por um lado, os milhares de expatriados que se instalaram em Timor desde a independência contribuíram de forma determinante para fazer avançar um Estado novo que não tinha parâmetros para estabelecer os alicerces fundamentais para o funcionamento de um Estado de direito, por outro, não asseguraram a transferência de conhecimento, necessária e essencial, que, depois da saída, permitisse aos timorenses manter o rumo de desenvolvimento do país.

A sensação com que fiquei, volvidos sete anos de ausência, foi que Timor-Leste parece estar órfão novamente. Sem referências e sem uma base sólida que lhe permita caminhar sozinho.

Politicamente estagnado, com uma situação semelhante à que sucedeu em Portugal nas últimas eleições, está à beira da rutura política. Um governo minoritário sem apoio parlamentar e uma oposição unida que se propõe governar num esquema semelhante ao da nossa geringonça. Sem orçamento e envolto numa atmosfera de receio e incerteza, Timor terá nas próximas semanas verdadeiros testes de nervos que temo não consiga superar com facilidade.

Os aspetos que mais me marcaram, pela negativa, por estes dias foram a ausência de cultura cívica de um povo sem referências e a quase inexistência da língua portuguesa.

Em relação ao primeiro, é chocante constatar como o lixo avançou por todo o lado. Não existe uma cultura cívica básica. Garrafas de plástico, latas de bebidas e todo o tipo de detritos à base de plástico estão espalhados por todo o lado, nas ruas, ao longo das estradas ou nas praias, dando uma imagem de desconforto e abandono – um fenómeno que em 2010 não era tão evidente e hoje é totalmente assolador.

No que toca à língua portuguesa, não obstante os esforços do Estado português, a sua presença é escassa, muito escassa, diria até quase inexistente. Quando conseguimos ouvir um português sólido, invariavelmente trata-se de uma pessoa mais velha ou de jovens que tiveram acesso a uma educação privilegiada. O povo nas ruas, os funcionários nos restaurantes, nos hotéis ou em instituições não falam português. Esforçam-se! Sem dúvida que sim, não fosse essa uma das características mais marcantes dos timorenses. Mas o português é escasso e em breve não passará de uma miragem neste país.

A par de todo este relato realizou-se a reunião técnica de pontos focais dos ministros das Comunicações da CPLP, para prepararem a x Reunião de Ministros das Comunicações, que se realizará em 2018. Mais um passo na construção da Agenda Digital para a CPLP, que por aqui tenho desvendado e avança a bom ritmo. Voltarei em março do ano que vem para a assembleia-geral da ARCTEL, a qual assinalará o inicio da presidência de Timor- -Leste da associação.

Por essa altura, espero que as coisas estejam diferentes ou, pelo menos, politicamente mais estáveis, porque no que toca aos restantes problemas, esses não se resolvem em meses, mas sim em anos. Tal como no final da década de 90 e até à independência, em 2002, os países da CPLP se uniram no apoio a Timor, hoje é preciso perceber os sinais e voltar a dar a mão aos manos e manas de Timor-Leste, sem repetir os erros do passado.

Escreve à quinta-feira