Para quem gosta de viajar, o verbo ir tem um sabor muito especial, mas… na hora do regresso, o preciso momento de meter a chave na fechadura também é muito bom: ah!… estamos em casa. Basta uma volta por um outro país europeu, em particular do sul, para observar o quanto esta União Europeia é artificial e distante das pessoas. Acantonada em regras e políticas restritivas na ânsia de fazer valer um modelo socioeconómico que, de tão financeirizado, tem muito pouco de social e não colhe a simpatia da generalidade dos cidadãos. Cá e noutros países. No caso vertente, a semelhança mora em França e, mais concretamente, no sul de França, o que, ironicamente, reforça a velha oposição norte-sul. Conversando com os locais depressa se constata que os problemas que mais lhes condicionam a vida são muito parecidos com os que nos afligem: desemprego, emprego precário e baixos salários, emigração de jovens qualificados, etc. Tudo, ou quase, o que não era esperado ouvir dos franceses! A Europa unida que os poderes europeus parecem desconhecer, ou ignorar. Comecemos, então, por Marselha, a cidade mais importante da Provença, a mais antiga de França e a segunda mais populosa do país.
Das cidades francesas, Marselha não será por certo das mais bonitas, nem das mais limpas, nem das mais tranquilas. A aparente miscigenação da sociedade marselhesa não encobre as disfunções sociais que afloram ao olhar do visitante. Todavia, visitar Marselha não se afigura uma desilusão. Literalmente debruçada sobre o Mediterrâneo, finca-se em manter os pés no mar, cheia de genica: o Porto Velho – le Vieux Port – é a animação em figura de gente. Uma floresta de mastros de veleiros emoldura o porto propriamente dito e coalhado de embarcações. Ao redor, tudo são restaurantes, ou similares, nos baixos dos imponentes edifícios que fecham a enorme praça com mar dentro: o porto entra-lhe pelo meio. Pela manhã montam-se as bancas de pescado e é ver os barcos de pesca a atracar na grande plataforma central e os pescadores a descarregar o peixe mesmo ali. Uma pequena multidão junta-se à espera do peixe e a venda vai correndo sem formalidades de lota, pelo menos que se veja: cada um compra o peixe que mais lhe agrada ou que se lhe ajeita no preço. E pelo aspeto dos fregueses dá ideia que há peixe para todos os gostos e bolsas. É um espetáculo que tem tanto de inesperado como de característico!
Se, na Baixa, o coração marselhês pulsa no Vieux Port, na parte alta, dominando, impante, toda a cidade, fica a Basílica de Notre- -Dame-de-la-Garde, construída na segunda metade do séc. xix e, dados os elementos ornamentais usados, vulgarmente considerada de estilo romano-bizantino. De onde quer que se olhe em Marselha, a basílica impõe-se, já pela localização no alto de uma colina, já pelo facto de ser encimada por uma estátua gigante, dourada, da Virgem que dá nome ao templo. De referir ainda que dos terraços da basílica se desfruta um panorama impressionante: o olhar espraia-se pelo Mediterrâneo e pequenas ilhas que por ali emergem, a linha de costa, arrebicada, estica-se até ao horizonte, e o casario a perder de vista estende-se aos pés da basílica. É Marselha rendida em adoração!?
Gestora, Escreve quinzenalmente